O papel da educação em saúde na emancipação dos sujeitos: uma abordagem sob a perspectiva da interseccionalidade

  • Author
  • Alicyregina Simião Silva
  • Co-authors
  • Raquel Moura da Conceição , André Cardoso Tavares , Vitória Silva de Aragão , Tayana Vivian Ribeiro Bastos , Ilvana Lima Verde Gomes
  • Abstract
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    Apresentação

    A educação em saúde compreende um importante processo político pedagógico que possibilita a elaboração de ações transformadoras na condução do indivíduo à sua autonomia. No entanto, para que esse processo ocorra de forma satisfatória, faz-se necessário considerar os diversos contextos de desigualdade, vulnerabilidade e dominação social aos quais os indivíduos são expostos. Especialmente ao conceituar-se a saúde como um produto do meio social.

    Ademais, é essencial que sua utilização incorpore conhecimentos base, à exemplo da abordagem interseccional, com intuito de introduzir nos debates e na construção do conhecimento sobre a temática, o modo como às condições sociais impacta a vida e a saúde de segmentos populacionais específicos, visando ressaltar também a importância da educação em saúde enquanto caminho de emancipação social dos sujeitos, diante da perspectiva da equidade e da justiça social.

    Nesse sentido, considera-se que, quando se aborda sobre as desigualdades e vulnerabilidades sociais existentes, é essencial destacar o conceito de interseccionalidade, sendo este termo utilizado como forma de ressaltar os diversos processos de opressão ou discriminação enfrentados simultaneamente por um mesmo sujeito em decorrência de marcadores sociais como raça, gênero, classe social ou orientação sexual.

    Diante disso, é importante também destacar a relação direta da temática com a práxis da Saúde Coletiva, à medida que aborda o papel da educação em saúde como importante ferramenta promotora de saúde e de melhora do perfil de saúde e qualidade de vida populacional.

    Assim, objetiva-se propor uma reflexão através do presente ensaio teórico acerca da importância da educação em saúde no processo de emancipação dos sujeitos, considerando os aspectos de dominação e desigualdade social abordados no conceito de interseccionalidade.

     

    Desenvolvimento

    Trata-se de um ensaio teórico desenvolvido no período de julho a setembro de 2023 e elaborado com base em leituras prévias sobre o assunto, associado ao desenvolvimento de um posicionamento sobre a temática, com intuito de refletir sobre a importância da inserção de conhecimentos relacionados a interseccionalidade na educação em saúde.

    Para isso, buscou-se destacar a importância desse conceito na compreensão sobre as iniquidades sociais existentes, de modo a proporcionar a posterior elaboração de estratégias eficazes de enfrentamento, e consequentemente, de promoção da saúde e qualidade de vida de grupos populacionais vulnerabilizados, considerando a relevância da temática para o âmbito da Saúde Coletiva.

     

    Resultados

    Nesse contexto, salienta-se que para melhor compreender sobre a relevância da educação em saúde na vida dos diferentes grupos populacionais e sua importância para promoção da autonomia dos sujeitos, faz-se necessária a compreensão da evolução e construção histórica desse termo na realidade brasileira.

    De modo geral, identifica-se que o conceito de educação em saúde tem sido utilizado desde as primeiras décadas do século XX, com significados e aplicabilidades variáveis a depender do contexto histórico e social vivenciado em cada período, de forma que esse relaciona-se diretamente com a história da saúde pública no Brasil, e com a ampliação da medicina preventiva em algumas regiões brasileiras, na década de 1940.

     Dessa forma, as estratégias de educação em saúde apresentavam cunho altamente tecnicista e autoritário, marcadas por ações realizadas pelo Estado, em que as classes populares eram tratadas de forma passiva. Somado a isso, também eram comumente aplicadas outras formas de educação em saúde constituídas por ações verticais, que visavam apenas alterar hábitos de vida, especialmente através da responsabilização do indivíduo pela sua saúde.

    Tal responsabilização não possuía como propósito promover a autonomia do indivíduo ou torná-lo participante ativo do processo de promoção e manutenção da saúde, mas através da culpabilização dos sujeitos, visava isentar o Estado da responsabilidade direta de lidar com questões relacionadas ao controle adequado de doenças, agravos ou demais aspectos que afetavam diretamente a saúde e a vida da população.

    Desse modo, observa-se até então uma aplicabilidade equivocada do termo educação em saúde, utilizado inicialmente no Brasil no contexto específico das campanhas sanitárias, e que apresentavam como principal característica a transmissão de conhecimento. Vale destacar que na atualidade ainda se identificam resquícios dessa concepção de educação em saúde, à medida que há uma predominância de abordagens de práticas educativas de caráter verticalizado e biologicista, que não consideram as especificidades, demandas e o realidade social vivenciada pela população.

    Conforme o exposto, vale destacar que a compreensão sobre a construção e constante atualização da definição do termo no país e nas práticas em saúde revelam a importância de se considerar a educação em saúde não somente sobre o aspecto do repasse de informações, tomadas de decisões ou mudanças comportamentais, mas, essencialmente, como forma de capacitar ou garantir a autonomia dos indivíduos para agirem sobre o meio ao qual estão inseridos. Assim, os sujeitos apresentam-se como autores importantes do processo de mudanças pessoais e sociais, que impactam diretamente sobre a saúde dos mesmos e sobre a saúde comunitária.

    Dessa forma, a atual compreensão de educação em saúde considera a participação ativa da população, visando promover processos que contemplem a corresponsabilização e autonomia dos usuários. Tal conquista, embora tardia, apresenta-se como essencial, especialmente ao considerar que as bases estruturais da criação do Sistema Único de Saúde (SUS) envolveram a participação popular e os diversos grupos sociais até então marginalizados.

    Nesse sentido, a utilização dos conceitos da interceccionalidade demonstram-se como essenciais ao se abordar sobre a introdução do sujeito como participante ativo do processo de educação em saúde, especialmente ao considerar que é necessário compreender as respostas possíveis diante dos aspectos sociais que recaem sobre as diferentes populações. Assim, a compreensão da realidade e das estruturas de dominação enfrentadas por grupos específicos passam a ser um conhecimento cada vez mais necessário por parte dos profissionais e gestores, de modo que esta construção se torna possível através da escuta e participação ativa da comunidade no planejamento em saúde.

    Assim, salienta-se que o uso da abordagem interseccional no campo da saúde possibilita a compreensão e visualização da multidimensionalidade dos marcadores sociais da diferença nos processos de iniquidades em saúde. Tal conhecimento favorece também a compreensão dos grupos populacionais sobre o modo como esses marcadores influenciam no seu perfil de saúde, bem como contribuem para tomada de decisões relacionadas a vida dos mesmos, sendo este um ponto essencial para a autonomia e emancipação dos sujeitos sobre a própria saúde.

     

    Considerações finais

    A utilização de conceitos associados à interseccionalidade possibilita a elaboração de estratégias de educação em saúde que considerem as especificidades ambientais, sociais e políticas dos indivíduos. Essas ações visam proporcionar condições e ambientes que permitam ou favoreçam a participação mais eficaz da população no cuidado, na tomada de decisões e na realização de ações diretamente associadas à saúde, qualidade de vida e bem-estar individual e coletivo.

    Portanto, compreende-se a educação em saúde como importante fator impulsionador de transformação da realidade. Nesse sentido, é evidente a necessidade da criação de modelos que introduzam, diante da perspectiva da educação em saúde, reflexões e arcabouços teóricos relacionados aos aspectos sociais e seus determinantes no processo de vida dos diferentes grupos populacionais. Assim, busca-se dá maior ênfase à compreensão sobre as diversas vulnerabilidades existentes, sendo estas consideradas abordagens e demandas essenciais no campo da Saúde Coletiva. 

  • Keywords
  • Determinantes Sociais da Saúde, Enquadramento Interseccional, Educação em Saúde.
  • Subject Area
  • EIXO 1 – Educação
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