O processo de colonização pelo pensamento colonial racista dominou e domina epistemologias, economias, estéticas, políticas, tempo, espaço, subjetividades, afetos, sexualidades, sendo alimentado pela inferiorização, escravização, etnocídio de vidas, assim como exploração desenfreada da natureza e controle das práticas de saúde, o que implica no empobrecimento das mentes e dos cuidados em saúde. Para a autora Vandana Shiva, a colonização intelectual gera a monocultura da mente, excluindo os saberes tradicionais dos povos colonizados para que haja apenas uma forma de pensar, fazer ciência, plantar, viver, que seria caracterizada pelo sistema de saber hegemônico. Esse processo inicia pela consideração dos sistemas de saber locais como primitivos e ultrapassados, fazendo-os desaparecerem e negando-lhes sua existência. Esse processo implica no adoecimento das populações originárias a partir das mudanças nos modos de viver. Como alternativa de resistência e enfretamento, os povos indígenas vêm construindo de forma coletiva lutas contra esse sistema de referência, colocando em questão esses parâmetros de racionalidade, compondo novos saberes e disposições corporais para construir novos mundos, buscando a construção do bem viver. Esse relato de experiência tem o intuito de discutir os processos de monocultura da mente e do cuidado em saúde, bem como as possibilidades de reflorestamento desses territórios através do bem viver por meio da escrevivências de mulheres indígenas, uma do povo Tuxá e outra do povo Tupinambáque. As escrevivências apresentadas começam com memórias compartilhadas através dos perceptos de quem olha para um território alagado pela construção de uma barragem que mudou o curso das águas do rio, fonte de vida e sabedoria do povo Tuxá de Rodelas, e das memórias construídas pelas histórias compartilhadas em volta da fogueira sobre as terras Tupinambá. São escritas nascidas das vivências, histórias transmitidas na potência da oralidade e escuta dos mais velhos que reflorestam o imaginário, amplificam os sonhos e potencializam os processos de luta e retomada. As memórias são construídas na dimensão dos corpos que vivem e escutam essas histórias a partir da terra onde vivem ou buscam retornar. Percebe-se, em muitos discursos no campo da saúde, que há um efeito de produção de uma padronização no modo de pensar o bem viver, entretanto, nas escrevivências, contrapondo-se a essa padronização, o conceito do bem viver vai se complementando com as experiências próprias de cada etnia (Oni Bá para o povo Tuxá e Guajupiá Tupinambá). Acreditar que caminhos possíveis possam ser iniciados com a produção de novas sociabilidades, com afetos éticos e políticos que escapem ao regime do universal e considerem as diferenças. Essa é uma escrita que procurou discutir, através de duas vivências, os processos de monocultura da mente e do cuidado em saúde, bem como as possibilidades de reflorestamento desses territórios através do bem viver.