O presente trabalho aborda a análise do Violentômetro, uma espécie de escala de violência, utilizada para que as mulheres saibam como identificar os sinais de violência doméstica que podem estar sofrendo. Reconhecida como uma violação dos Direitos Humanos, a violência doméstica contra a mulher (VDCM) traz implicações políticas, econômicas, sociais, psicológicas e culturais, o que demanda a construção de estratégias que tenham como horizonte o fortalecimento da cidadania feminina. Nessa direção, é fundamental destacar a centralidade do papel do Estado, com a participação da sociedade civil, no processo de construção de políticas públicas voltadas para sua prevenção e superação. O conceito de violência doméstica contra as mulheres é bastante amplo e compreende diversos tipos de violência, que pode ser psicológica, sexual, física, moral e patrimonial. Portanto, considerando que a violência doméstica pode e deve ser prevenida, destaca-se a relevância do Violentômetro como uma ferramenta importante para a identificação dos níveis de intensidade da VDCM. Assim, o presente trabalho objetivou analisar as expressões de violência doméstica mais significativas do Violentômetro. Trata-se de uma pesquisa do tipo aplicada, de base populacional, de corte transversal e natureza quantitativa. O estudo foi realizado no município de João Pessoa, capital do estado da Paraíba, região nordeste do Brasil. Foram selecionadas 52 Unidades Básicas de Saúde (UBS’s) para a aplicação do instrumento, escolhidas a partir da facilidade de acesso da pesquisadora aos serviços e interesse das profissionais em contribuir com o estudo. O instrumento foi aplicado, via Google Forms, junto a mulheres que buscaram qualquer tipo de atendimento na Unidade Básica de Saúde (UBS), no período de janeiro a março de 2023. Ressalta-se que para selecionar a amostra foram utilizados os seguintes critérios de elegibilidade: mulheres a partir de 18 anos de idade que buscaram atendimento nas UBS’s de João Pessoa durante o período da pesquisa e concordaram em participar do estudo, assinando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Como critérios de exclusão, tem-se: mulheres que apresentaram déficit cognitivo e limitação na comunicação (alterações no processo de desenvolvimento da expressão e recepção verbal) com base nos registros do prontuário da usuária. Assim, de forma aleatória, mulheres foram convidadas a participar da pesquisa durante o atendimento nas UBS’s. A aplicação do instrumento foi realizada pela pesquisadora e pelas profissionais (enfermeiras e odontólogas) treinadas para esse fim. A etapa de planejamento amostral destinado para obtenção dos dados desta pesquisa foi a amostragem estratificada por distritos sanitários. A seleção da amostra foi realizada segundo “método de alocação ótima”, através de um indicador correlato ao atendimento de mulheres, que é o percentual médio de atendimentos de demanda espontânea deste município. Uma vez que o tamanho da amostra é calculado para toda a população, também é realizado o tamanho da amostra para cada distrito sanitário segundo a alocação ótima. Portanto, após este cálculo do tamanho de amostra geral, o tamanho de amostra foi alocado proporcionalmente conforme o número de atendimentos de cada distrito. De modo a evitar perdas, foi acrescido 30% a cada tamanho de amostra calculado. Sendo assim, 563 mulheres compuseram a amostra da pesquisa. Para a análise dos dados, as variáveis foram codificadas e categorizadas de forma a permitir uma transferência para o software estatístico R versão 4.3.0. Após codificação das variáveis do banco, foi feita uma análise minuciosa do banco de dados, empregando-se a técnica de validação de dupla entrada a fim de detectar inconsistência na base de dados. Em seguida, os dados foram importados para o software R, sendo este, utilizado para realização dos cálculos estatísticos. Ademais, o estudo segue a Resolução n° 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde (CNS), que regulamenta a fundamentação da ética em pesquisas envolvendo seres humanos no Brasil (Brasil, 2012), tendo sido aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) do Centro de Ciências Médicas/CCM, da Universidade Federal da Paraíba – UFPB sob o Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) nº 61355522.0.0000.8069 e número do parecer: 5.672.371. Destarte, a presente pesquisa faz parte da primeira fase da tese de doutorado da autora principal, onde posteriormente, será construído um modelo de decisão para identificação da violência doméstica. As questões adaptadas do Violentômetro foram divididas em três domínios. O Domínio de Cuidado (itens 1 ao 11 do Violentômetro) é composto pelas seguintes formas de violência: V1) piadas ofensivas, V2) chantagear, V3) mentir/enganar, V4) ignorar/dar um gelo, V5) ciumar, V6) culpar, V7) desqualificar, V8) ridicularizar/ofender, V9) humilhar em público, V10) intimidar/ameaçar e V11) controlar/proibir. O Domínio de Reação (itens 12 ao 18 do Violentômetro) apresenta as seguintes formas de violência: V12) destruir bens pessoais, V13) machucar, V14) tapinhas/pancadinhas, V15) brincar de bater, V16) beliscar/arranhar, V17) empurrar e V18) dar tapas. o Domínio de Perigo Real (itens 19 ao 27 do Violentômetro) exibe as seguintes formas de violência: V19) chutar, V20) confinar/prender, V21) ameaçar com objetos, V22) ameaçar com armas, V23) ameaçar de morte, V24) forçar uma relação sexual, V25) abuso sexual, V26) violentar e V27) mutilar. De acordo com as respostas das participantes do estudo, para o Domínio de Cuidado do Violentômetro, os tipos de violência mais frequentes foram: ridicularizar/ofender (V8), intimidar/ameaçar (V10), desqualificar (V7), humilhar em público (V9), chantagear (V2), piadas ofensivas (V1) e ciúmes (V5). Os resultados do Domínio de Reação do Violentômetro demonstraram que os tipos de violência mais frequentes foram: machucar (V13), empurrar (V17), dar tapas (V18), destruir bens pessoais (V12) e tapinhas/pancadinhas (V14). No Domínio de Perigo Real do Violentômetro os resultados demonstraram que o tipo de violência mais frequente foi ameaçar com objetos (V21). A partir destes resultados, conclui-se que foi possível identificar as expressões de violência doméstica mais significativas do Violentômetro, de acordo com as respostas das participantes da pesquisa. Destaca-se que a VDCM é constituída por um ciclo, que inicia de maneira lenta e quase imperceptível, podendo atingir dimensões perigosas e desafiadoras. Esse ciclo apresenta fases que podem perpassar desde uma tensão no relacionamento, caracterizada por conflitos leves à episódios agudos de violência marcada pelas agressões. Assim, percebe-se que o Violentômetro classifica os tipos de VDCM em blocos de intensidade, tornando-se um instrumento potente para as políticas de prevenção e assistência, além de contribuir para as mulheres se perceberem em situação de violência, tendo em vista que muitas não se enxergam nessa condição. Portanto, este estudo pode colaborar para a criação de indicadores de monitoramento e identificação da violência doméstica contra a mulher na perspectiva do aprimoramento de políticas públicas locais e a capacidade de resposta frente a problemática.