A violência contra a mulher representa um desafio substancial de saúde pública, especialmente nos complexos contextos socioculturais da Região Amazônica, Brasil. Este estudo descreve o perfil das mulheres atendidas pelo Serviço de Atenção Especializada às Pessoas em Situação de Violência Sexual (SAVIS) no Hospital e Maternidade Dona Regina (HMDR), Tocantins, de 2013 a 2020. Utilizou-se uma abordagem epidemiológica descritiva com dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) do HMDR. Analisaram-se as tendências temporais, demográficas e contextuais das agressões reportadas. Durante o período estudado, registrou-se um total de 88 casos de violência contra mulheres, com uma concentração de registro de casos em 2016, representando 48,86% do total. As vítimas eram predominantemente pardas, com idades entre 18 e 39 anos, com mais de 8 anos de escolaridade e residentes em áreas urbanas. A maioria das agressões ocorreu em locais públicos (51,1%). As formas de violência identificadas incluíram violência sexual (77,3%), física (53,4%) e psicológica (47,7%). Os principais perpetradores foram desconhecidos (68,2%), cônjuges (14,8%) e ex-namorados (9,1%). Corroborando com os resultados apresentados, a pesquisa "Mulheres Brasileiras e Gênero nos Espaços Público e Privado", da Fundação Perseu Abramo, reportou que a violência é prevalente em todos os níveis educacionais, e as mulheres com maior escolaridade frequentemente relatam tipos específicos de violência, como controle ou cerceamento, em maior proporção (27% contra 19% das menos escolarizadas). Isso reflete-se no perfil das usuárias do SAVIS, onde mulheres com maior nível educacional predominam entre as que buscam o serviço. Este estudo evidencia a alta prevalência de violência contra mulheres jovens e pardas, destacando uma condição de vulnerabilidade. As estatísticas de gênero do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) corroboram a gravidade da situação, indicando que ao menos 6% das mulheres brasileiras com 18 anos ou mais já sofreram violência por um parceiro íntimo. O padrão de violências majoritariamente ocorrendo em espaços públicos sinaliza uma persistente discriminação de gênero e tentativas de controle masculino sobre as mulheres. Estudos baseados em dados de vigilância, como o National Crime Victimization Survey nos EUA, frequentemente indicam que determinados tipos de violência (por exemplo, assalto ou estupro) são mais comuns em locais públicos. Tais estudos ajudam a entender as circunstâncias em que a violência ocorre e quem são os agressores mais prováveis. Em contextos como o Brasil, estudos como os da Fundação Perseu Abramo e do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) fornecem informações sobre a prevalência de violência em diferentes locais, mostrando como fatores locais específicos, incluindo a segurança pública e a vigilância, podem influenciar onde a violência ocorre. Esta complexidade sugere que a violência contra a mulher é uma questão interseccional que ultrapassa o âmbito da saúde e engloba segurança e direitos humanos. Urgem iniciativas que promovam não apenas ações punitivas, mas também transformações culturais e educacionais profundas, além de uma capacitação adequada dos profissionais de saúde para detectar e prover a atenção necessária às mulheres em situação de violência.