Apresentação: A saúde como um direito no Brasil, tem seu marco legal a partir da sua previsão nos artigos 196 a 200 Constituição Federal de 1988. Ao dispor sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços, a lei orgânica 8080/90 alicerça o direito à saúde previsto na constituição brasileira. Passa a evocar vários debates em torno de seu campo de atuação, seus princípios e diretrizes e especialmente sobre a organização do cuidado, o que no cenário amazônico, tem particularidades. No entanto, pouco se tem refletido e debatido sobre a promoção da equidade a partir dos novos arranjos em saúde para populações específicas. Objetivo: Discutir sobre a promoção do cuidado e da equidade em saúde no território líquido da Amazônia, a partir de um modelo tecnoassistencial na APS. Desenvolvimento: Trata-se de uma revisão integrativa realizada a partir das seguintes etapas: hipótese e objetivos da revisão; seleção da amostra; definição das informações a serem extraídas dos artigos selecionados; análise dos resultados; discussão e apresentação dos resultados e a apresentação da revisão. Para a seleção dos artigos foi realizada uma busca na base de dados do Scielo.org, usando os descritores: saúde ribeirinha AND Amazônia. Os critérios de inclusão definidos para a revisão foram: artigos completos e disponíveis nos idiomas português e inglês, artigos que discutissem sobre a saúde da população ribeirinha e/ou rural, estudos voltados para a Amazônia brasileira e os critérios de exclusão foram estudos voltados para doenças e que não fizessem relação com o princípio da equidade em saúde. Resultados: Foram encontrados 24 artigos abordando a temática, removidos 10 estudos duplicados, e excluídos 10 após aplicação dos critérios de exclusão e inclusão, restando 4 artigos. Após a leitura de títulos e resumos, foi realizada a leitura completa, incluindo os quatro artigos. A pesquisa nos mostrou que o território amazônico é um espaço micropolítico de cuidado, plural, diverso composto por populações do campo, da floresta, das águas e povos tradicionais. A região amazônica produz um tipo de cuidado que considera a diversidade dos modos de vida e o ciclo das águas, fenômenos que condicionam o uso do território no acesso aos serviços de saúde. Nos últimos 10 anos, a região tem vivenciado uma inovação tecnológica de cuidados ofertados nas unidades fluviais de saúde também conhecidas como Unidades Básicas de Saúde Fluvial (UBSF). Atendendo aos princípios de acesso universal, equidade, vínculo, continuidade do cuidado e todos os ciclos de vida garantindo integralidade da atenção, responsabilização e humanização, da Atenção Primária à Saúde (APS). Este modelo de cuidado tem sido foco de pesquisas, produções científicas, porém com uma lacuna em relação às análises para este objeto, enquanto uma política para a promoção da equidade em saúde O cuidado ofertado por esse modelo tem suas particularidades. Trata-se de um modelo tecnoassistencial de saúde, desenvolvido pela Equipe de Saúde da Família Fluvial (eSFF), que atua na atenção primária, em territórios de baixa densidade demográfica e se desloca até as populações dispersas no território amazônico e pantaneiro. Suas atividades são desenvolvidas dentro das UBSF, que percorrem o território líquido Amazônico atendendo à população adscrita. Este arranjo foi pensando dentro da atenção básica a fim de responder e atender adequadamente e com equidade as questões de saúde dos indivíduos, garantindo-lhes universalidade e integralidade na assistência à saúde e convergindo assim, com políticas equitativas como a Política de Atenção Integral a Saúde do Campo, das Florestas e das Águas (PNSIPCF). A promoção do acesso à saúde tem dialogado com as políticas de promoção da equidade, convergindo para o combate das iniquidades em saúde e redução de vulnerabilidades de grupos populacionais mais expostos. Para deslocar-se até as comunidades é necessário planejar-se para os períodos de seca e cheia dos rios, pois isso afeta a depender do percurso, chegar em regiões onde os obstáculos e barreiras aumentam com a seca. Uma outra particularidade deste arranjo é o período de permanência da equipe nas comunidades, que pode chegar até 7 viagens de 20 dias ao ano, o que implica em adaptação de convivência em um ambiente isolado, com profissionais de outras formações além da saúde. No planejamento do itinerário realizado pela equipe, é contabilizado nos dias de trabalho o tempo de deslocamento, um turno para a realização de visitas domiciliares e um turno de folga no final de semana. Para o sucesso do trabalho é importante a atuação do conselheiro local de saúde, pessoa que constrói a ponte entre os usuários e os serviços, favorecendo a produção do cuidado. Outro ator importante é o agente de saúde rural e ribeirinho, que na comunidade realiza a busca ativa de casos, e se desloca até a cidade para pegar medicamentos de pacientes crônicos, além de entregar suas produções e receber seu salário. Essas particularidades foram forjadas a partir da primeira experiencia de atendimento itinerante ofertado em comunidades ribeirinhas de áreas remotas de Santarém no Pará, pelo navio-hospital Abaré I. Esse modelo de cuidado foi entendido pelo Ministério da Saúde como um importante avanço para o desenvolvimento de uma política mais equânime, que reconhece que a existência das diferenças de contextos regionais e de perfis sociodemográficos devem ser pensadas dentro de seu território de produção do cuidado e desenvolvimento da equidade, enquanto princípio da APS. Nesse sentido, Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) e PNSIPCF, dialogam na tentativa de garantir e ofertar ações de cuidado em saúde diversos e de qualidade para uma população também diversificada. Entendemos que as características singulares da região amazônica como, a própria diversidade e dinâmica espacial, os indivíduos e seu modos de vida e produção social, os recursos naturais usados em seu cotidiano, entre aspectos ambientais e culturais da população, impactam na saúde e qualidade de vida. Entre essas especificidades do contexto amazônico, ressaltamos que os rios se constituem como meio, muitas No território amazônico, as vias fluviais podem ser compreendidas como um território líquido, fluido que vive em constante movimento, assim como as populações que por esse território cruzam e entrecruzam seus modos de vida. O território líquido vem sendo estudado por pesquisadores da região, em especial do Laboratório de História e Políticas Públicas e Saúde na Amazônia -LAHPSA/ Fiocruz-Amazônia, como uma categoria de análise para políticas públicas e ações de saúde em contextos de populações mais expostas a situações de vulnerabilidade. Considerações Finais: Os estudos apontam a existência de desafios, como recursos insuficientes, fixação de profissionais, dificuldade de articulação entre os níveis de complexidade em saúde, dificuldades de gestão e as próprias condições de vulnerabilidade presentes na Amazônia. É necessário realizar estudos avaliativos acerca da qualidade serviços ofertados a partir da UBSF, para compreender quais e como fazer os ajustes necessários na organização deste serviço. Também ter em consideração que este modelo de cuidado ainda está em processo na Amazônia e precisa ser incentivado a partir de maior financiamento, em virtude das particularidades da região Amazônica.
Nota de rodapé: A primeira autora é aluna do doutorado acadêmico de Saúde Pública na Amazônia (DASPAM/ILMD/Fiocruz Amazônia) e bolsista CAPES. O DASPAM recebe auxílio financeiro da FAPEAM.