Introdução: O puerpério, comumente conhecido como resguardo, é definido como o período pós-parto que se inicia com a dequitação placentária e se estende por cerca de seis a oito semanas, dependendo das particularidades de cada indivíduo. Nessa fase o corpo busca restabelecer as condições prévias à gravidez, compreendendo três etapas distintas, sendo elas o puerpério imediato (1º ao 10º dia pós-parto), puerpério tardio (do 11º ao 45º dia) e remoto (após o 45º dia). Nesse cenário ocorre intensas alterações fisiológicas, anatômicas, endócrinas, emocionais e relacionais, sendo fundamental que a pessoa puérpera possua uma rede de apoio, acesso a informações acerca dos cuidados necessários no puerpério e assistência em suas tarefas do dia a dia, tanto por meio de familiares e amigos quanto dos profissionais de saúde. Dessa modo, é comum que no pós-parto haja o suporte de uma rede de apoio, fundamentada em saberes populares compartilhados oralmente e fortalecida por uma relação intergeracional permeada por influências, valores e crenças, advindas de familiares e da comunidade que a pessoa puérpera faz parte. Assim sendo, é essencial uma assistência profissional que considere as práticas culturais e que aborde as necessidades individuais da pessoa no pós-parto, do recém-nascido e da família, com ética e respeito ao seu contexto sociocultural. Dessa forma, será possível garantir o direito das pessoas às práticas de cuidado, à promoção da saúde e à qualidade de vida de forma equitativa e inclusiva. Objetivo: Identificar as evidências científicas sobre vivências de cuidados à saúde no período pós-parto para pessoa puérpera e sua rede de cuidado intergeracional. Metodologia: Pesquisa bibliográfica sistemática do tipo revisão integrativa, com abordagem qualitativa, que compreende cinco passos de execução: formulação do problema; realização da pesquisa nas bases de dados; avaliação de dados; análise dos dados; e apresentação dos resultados. A pergunta desta revisão foi construída utilizando a estratégia PICo (Participante, fenômeno de Interesse e Contexto de estudo), sendo ela: Quais os cuidados à saúde no período pós parto são vivenciados pela pessoa no puerpério e sua rede de cuidado intergeracional? A elegibilidade dos estudos obedeceu aos seguintes critérios de inclusão: artigos originais, dissertações, teses e artigos de relato de experiência, cujos participantes sejam pessoas no puerpério (mulheres cis e homens trans) e sua rede de cuidado intergeracional, que abordem cuidado à saúde no período pós parto, nos idiomas: inglês, português e espanhol, sem delimitação de tempo. E as bases investigadas foram: Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), Literatura Latino-americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), Scientific Electronic Library Online (SCIELO), PUBMED, Web of Science, Cinahl (Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature), PsycInfo e Scopus. Além disso, também foi utilizado o buscador acadêmico do Google (Google Scholar). Resultados: Os estudos que atenderam aos critérios de seleção apontaram como o período de resguardo é percebido pela rede intergeracional como uma fase crucial de cuidado, em que as orientações culturais recebidas devem ser estritamente seguidas para preservar a saúde tanto da mãe quanto do bebê. Dentro desse contexto, as principais crenças transmitidas de geração em geração para as pessoas no puerpério envolvem aspectos relacionados à alimentação, higiene corporal, sexualidade e atividades física. No que diz respeito à alimentação, as orientações transmitidas de geração para geração enfatizam a importância de consumir alimentos que favoreçam a produção de leite materno e que ajudem na cicatrização do corpo após o parto, ao mesmo tempo, em que se deve evitar alimentos que possam causar cólicas ao recém-nascido. Quanto à higiene corporal, há uma crença popular de que as pessoas no puerpério não devem lavar o cabelo, pois isso supostamente poderia levar a problemas mentais. Além disso, é recomendado evitar atividade sexual durante o período de resguardo. Sendo ensinado que é importante manter repouso absoluto, o que implica evitar tarefas domésticas e levantar pesos, sob a crença de que o descanso ajudará o corpo a se recuperar para seu estado pré-gravidez, minimizando possíveis complicações de saúde. Ademais, após uma análise da pesquisa bibliográfica, ficou evidente que há uma carência de estudos que abordem o cuidado intergeracional e o papel dos(as) enfermeiros(as) em relação aos homens transgênero, pessoas com deficiência e comunidades quilombolas durante o período pós-parto. Esta lacuna na literatura pode ser atribuída à tendência dos profissionais de saúde em concentrar-se nas necessidades das mulheres durante o puerpério, resultando na exclusão dos homens trans grávidos dos serviços de saúde e, muitas vezes, na falta de apoio familiar. Além disso, observa-se que os profissionais de saúde carecem frequentemente de conhecimento teórico e prático para fornecer cuidados perinatais adequados a essa população. Por outro lado, as pessoas com deficiência são frequentemente percebidas como incapazes de conceber, o que leva à perspectiva de que são assexuadas, sendo seus corpos vistos apenas a partir de uma ótica de funções biológicas. No que diz respeito ao cuidado das pessoas puérperas quilombolas, as orientações dos profissionais de saúde podem entrar em conflito com as tradições transmitidas ao longo das gerações. Visto que a compreensão da pessoa sobre seu processo de saúde e doença é fortemente influenciada por sua comunidade, que desempenha o papel principal de suporte e apoio durante o período pós-parto. Considerações finais: É fundamental que os profissionais de saúde reconheçam e respeitem as diversas diferenças culturais, sociais e individuais ao fornecer cuidados perinatais. Isso implica adquirir conhecimento teórico e prático adequado para atender às necessidades específicas das pessoas com deficiência e dos homens trans, além de compreender e respeitar as crenças e práticas das comunidades, como as quilombolas, durante o período puerperal. Dessa forma, os profissionais podem garantir que os direitos dessas pessoas sejam respeitados, oferecendo cuidados de saúde que considerem suas perspectivas e experiências únicas. Em vista disso, uma abordagem inclusiva e sensível é essencial para promover a equidade no cuidado perinatal e garantir que todas(os) tenham acesso a serviços de saúde de qualidade e humanizado, independentemente de sua origem, identidade ou condição. Assim sendo, compreender e respeitar as práticas populares torna-se fundamental para assegurar o direito à saúde, promovendo práticas saudáveis, repensando as inadequadas e negociando condutas de cuidado de forma colaborativa, respeitando as necessidades individuais.