Apresentação: O artigo relata a experiência vivenciada a partir da visita supervisionada ao Ambulatório do Prematuro em um hospital do Pará, com a premissa de compreender a atuação psicanalítica clínica no ambiente hospitalar a partir da rotina laboral da psicóloga atuante. A visita justificou-se a contemplar a avaliação final de uma disciplina curricular do curso de Psicologia. A literatura científica e a prática orientam que a intervenção precoce com a criança não deve ser feita separadamente e ressalta a importância das entrevistas preliminares com os pais, na presença da criança, e que as intervenções realizadas nela são parte do construto observado na relação parental, revisitando aos pais à dinâmica narcísica e de transferência a partir da égide da castração. A importância da atuação profissional é a de incluir como novos significantes podem ser necessários à concepção que o bebê terá do corpo integrado e organizado; favorecendo a relação no auxílio do reconhecimento de diversas reações reflexas como sendo algo do próprio bebê para comunicar-se com os pais com a maneira singular da qual se fez o que previamente se constituía dele e foi atribuído pelos pais. Quando essas produções do bebê se atribuem dos sentidos que os pais dão a ele, a via do desejo é facilitada para a construção de novas outras produções. Em dupla jornada, os pais reconhecem um indivíduo que deseja e diferente de ambos a partir dos movimentos que realiza e que podem ser diferentes dos deles. Objetivo: O objetivo do artigo é analisar como a dinâmica psicanalítica apresenta-se em meio aos desafios, aos limites e às possibilidades na intervenção precoce de bebês prematuros e seus respectivos cuidadores, considerando a importância da intervenção para a produção de saúde, a partir do que foi observado na atuação da referida psicóloga e possível de associar ao referencial teórico da disciplina; compreendendo como o cuidado em saúde é produzido em diversos âmbitos da assistência à saúde, sob a ótica psicanalista dentro de um hospital, ou seja, os desafios do fazer profissional fora da clínica individual. Desenvolvimento do trabalho: A visita foi dividida em três dias, sendo uma dupla de alunos por vez, devido à estrutura física da sala de atendimento do ambulatório, nas quais os autores puderam acompanhar as intervenções do psicanalista em diferentes perspectivas ao considerar a singularidade da observação e os dias distintos de atendimento. Tal fato possibilitou observar como a prática clínica da Psicanálise importa ao desenvolvimento infantil quanto à relação de cuidadores-bebê e ao lugar do sujeito-criança, sobretudo aos bebês prematuros devido à particularidade de desenvolvimento desses sujeitos. Resultados: Ao longo dos estudos e da visita técnica, foi possível identificar alguns desses obstáculos e limites que a psicanalista enfrenta no hospital, tal como: sustentar o seu discurso e a sua ética em um contexto dominado pelo discurso e pela ética da medicina numa equipe multiprofissional, que se diferenciam radicalmente dos referenciais psicanalíticos. Essa diferença fundamental de abordagem pode gerar tensões e dificuldades na colaboração entre os profissionais de saúde. Cabe então à psicanalista elaborar sua práxis no hospital a partir do espaço de escuta que autoriza as manifestações da subjetividade dos pacientes. Torna-se importante discutirmos essa atuação para além da experiência analítica propriamente dita, como ocorre no consultório particular, logo que, ao se inserir na instituição, o psicanalista se afasta das normas e padrões adotados pelas técnicas convencionais e lida com situações imprevisíveis que convocam seu trabalho. Ele faz parte da equipe multiprofissional do hospital e não pode se desprender dela. Na conduta profissional, evidencia-se que a profissional possui vasto conhecimento pelos riscos orgânicos e psíquicos advindos da prematuridade, o que propicia intervenções favoráveis ao desenvolvimento da estruturação psíquica, associando à preocupação com o desenvolvimento social, motor e cognitivo. Nesse sentido, observou-se que certas intervenções profissionais se pautaram em alguns eixos do Indicadores Clínicos de Risco para o Desenvolvimento (IRDI), sobretudo os quais ressaltam a importância da participação do Outro para exercer a constituição do sujeito e operar nas estruturas psíquicas da criança. Isso significa que os movimentos da psicóloga buscam demonstrar aos pais como as manifestações infantis se constituem por uma a posição parental refletida. Em um dos atendimentos, a psicóloga ressaltou a importância para o pai acalentar o bebê, dividir as funções de cuidado com a mãe para que o pai possa ser imagem ao filho. Frente a uma fala didática e acessível para o atendimento, considerando o perfil do público atendido no ambulatório, percebe-se a sustentação que a profissional faz para antecipar os movimentos que o bebê deve vir a fazer pela mediação parental – o afeto acalentador –, os quais projetam para o filho a imagem em expectativas futuras deste sobre os pais – sentir-se seguro com o pai. Dessa forma, a função do analista está inserida entre duas dimensões: a dimensão clínica e a dimensão institucional. Na dimensão clínica, encontra-se o arcabouço teórico dos dispositivos da psicanálise utilizados para compreender e intervir nos processos mentais e emocionais dos pacientes. Enquanto na dimensão institucional, o lugar do psicanalista se torna específico do hospital, que precisa lidar com situações relacionadas à estrutura e funcionamento da instituição. Assim, essas duas dimensões estão articuladas e se influenciam mutuamente. O trabalho do psicanalista no hospital não pode estar completamente separado da instituição, mas, ao mesmo tempo, ele precisa se basear nos princípios e dispositivos clínicos da psicanálise para enfrentar as situações específicas do contexto hospitalar. Considerações finais: Na dinâmica ambulatorial vivenciada pela profissional, a questão da prematuridade emerge a atenção ao cuidado em avaliar como essa condição gestacional reverbera na constituição psíquica da subjetividade da criança, bem como os impactos no psiquismo dos pais nessa relação de afeto. Isso significa que as intervenções da psicóloga permeiam-se pelo processo de subjetivação que busca contribuir para a manutenção do vínculo afetivo desses pares, por meio do toque, da fala e das ações, as quais evidenciem a construção subjetiva da criança e o estabelecimento da díade mãe/pai x bebê. Nessa perspectiva, denota-se a percepção que a Psicanálise atribui à formação da integração corporal e como a passagem de organismo a corpo – sendo primariamente instâncias distintas – é resultante da integração entre o registro simbólico e o registro real. Para compreender o encadeamento, considera-se a influência que o bebê possui anterior ao próprio nascimento, marcado por um discurso que o antecede, compartilhando de significantes os quais foram atribuídos a ele no momento que fora reconhecido como habitante da vida uterina da mãe. A partir da experiência, foi possível considerar que a práxis psicanalítica no hospital apresenta notável repercussão na dimensão clínica e institucional. Seja a primeira, nos desafios institucionais a partir do comprometimento ético o qual exige do profissional a flexibilização da linguagem à acessibilidade, considerando o público atendido e a equipe interdisciplinar; como também pela celeridade exigida nos atendimentos motivada pela demanda de assistidos e às outras consultas que a família possui no mesmo dia com o restante da equipe. Seja pela segunda, por meio da primazia das intervenções clínicas ao contribuir para o fortalecimento da relação transferencial e dos marcos do desenvolvimento infantil de bebês prematuros; pela utilização de eixos dos IRDI pelo profissional e pela importância de orientar aos pais em como o cuidado contribui para o desenvolvimento salutar biopsicossocial do sujeito.