SOBRE O PROGRAMA OFICINANDO EM REDE: a pesquisa intervenção em saúde mental e em educação
O “Programa Oficinando em Rede de Mossoró” articula projetos de pesquisa que surgem de ações continuadas de extensão construídas em parceria com as comunidades, os serviços de saúde mental e educação inclusiva de Mossoró-RN e cidades circunvizinhas.
O denominador comum desses projetos é a experimentação de diferentes linguagens – pintura, teatro, ciranda, brincadeira, cenopoesia e tecnologias da informação e da comunicação nos campos da saúde mental e da educação, em ambientes que atendem crianças, jovens e adultos que vivem em diferentes circunstâncias de sofrimento psíquico e/ou as circunstâncias da não aprendizagem em educação.
O projeto “Tecendo Redes de Cuidado e Aprendizagem: conversações” é realizado na forma de encontros para conversação e aprendizagem sobre temas do interesse da comunidade envolvida no Oficinando em Rede, como: trabalho em rede entre saúde e educação, aprendizagem, saúde mental, entre outros. Os encontros são realizados nos Centros de Atenção Psicossocial de Mossoró, nas escolas ou no Núcleo de Tecnologia Municipal do município. A equipe do projeto organiza materiais, atos cenopoéticos, cirandas e promove práticas de cuidado abertas à comunidade interessada. Pesquisas de pós-graduação surgem com base na experiência em andamento. Portanto, o Oficinando em Rede prioriza ações de pesquisa que interagem diretamente com as urgências percebidas nas comunidades.
Estudantes e profissionais da educação e da saúde mental realizam também o Projeto “Artes e Cenopoesia na saúde mental”, coordenado atualmente pela professora Karla Demoly (oficinas de pintura, teatro e cenopoesia). O grupo busca possibilitar às crianças, jovens e adultos envolvidos nas oficinas semanais a livre expressão da vida e suas circunstâncias, integrando as múltiplas linguagens com as quais construímos modos de nos expressar, viver e conhecer. A experiência se organiza com um conjunto de materialidades que são trazidas em oficinas de pintura, teatro e cirandas. O objetivo central do projeto é dar voz à loucura, aos sofrimentos humanos, à potência da generosidade e do amor, inventando formas de cuidar e acolher, formas de re-criar o próprio viver. O coletivo de estudantes e cientistas segue a trilha aberta pela grande médica psiquiatra Nise da Silveira, para quem o afeto e a amorosidade são centrais no trabalho de promoção da saúde mental.
Com o projeto “Oficinando com jogos informáticos e brincadeiras na saúde mental”, um coletivo do programa Oficinando em Rede de Mossoró/RN oportuniza a inserção de crianças, jovens e adultos em um ambiente equipado com diferentes artefatos técnicos para interação em rede: tablet, computador e câmera fotográfica em Centros de Atenção Psicossocial de Mossoró.
Iniciamos no ano de 2024 um projeto que integra os esforços do Oficinando em Rede em cooperar com a efetivação da aprendizagem - a alfabetização -, compromisso que em nosso país ainda não estendemos a todos. Por iniciativa de Nataly Suyani, envolvemos 128 mulheres alfabetizadoras e, em grupos menores, oferecemos o Curso de Extensão intitulado: “Alfabetizando com Afeto, Sabedoria e Conhecimento. Todas as quartas-feiras à noite, durante 3 meses, mulheres alfabetizadoras de Mossoró RN se reúnem para construir criativamente as suas didáticas da alfabetização. Os intercessores teóricos deste projeto de pesquisa intervenção são Emília Ferreiro e Ana Teberosky, com a obra dedicada à psicogênese da alfabetização e Esther Pillar Grossi, com sua obra dedicada à didática da alfabetização.
PESQUISAR COM AS COMUNIDADES: a inseparabilidade entre a extensão, a pesquisa e o ensino
A metodologia adotada nos diferentes projetos é qualitativa, na forma da pesquisa-intervenção, com emprego de oficinas cenopoéticas que favorecem a livre expressão mediante múltiplas formas de ação na linguagem. Os resultados interagem com cada proposta de estudo: construção de materiais e tecnologias para a promoção do cuidado e/ou da aprendizagem; ampliação da compreensão sobre os movimentos da cognição inventiva na experiência direta com os coletivos envolvidos nas pesquisas. Ao referirmos movimentos da cognição inventiva queremos dizer que observamos e analisamos as coordenações de ações novas e emergentes em cada experiência de intervenção: ideias, emoções, gestos, entendimentos que se transformam nos encontros e processos criativos vividos pelos sujeitos e coletivos.
A pesquisa que desenvolvemos se faz COM os sujeitos, neste sentido, pesquisadoras e coletivos se transformam no percurso de sua realização. Há uma abertura e atenção voltada para a escuta, o desejo de experienciar o estranho em nós mesmos a partir do encontro com o/os outro/os. Não se trata, portanto, de pesquisar - sobre - ou de pesquisar - para -. Fazemos a vida e o conhecimento nas relações diretas e imediatas, pois entendemos que este é um modo necessário de construir conhecimentos no tempo presente, diante do caos civilizatório que nos convoca às ações e pesquisas pertinentes à transformação.
APRENDIZAGENS E PROCESSOS DE CUIDAR NA EDUCAÇÃO E NA SAÚDE MENTAL
Em torno destas diferenciadas intervenções, emergem perguntas que ganham espaço no percurso de estudantes que realizam projetos de pesquisa de graduação, iniciação científica, mestrado e doutorado. Dentre eles, destacamos alguns dos resultados alcançados: Laryssa Dayanna Costa Ferreira estudou as Transformações cognitivas nas trajetórias de envelhecimento e longevidade em Saúde Mental. A pesquisa possibilitou ampliar nossa compreensão sobre mudanças cognitivas e afetivas que usuários em atendimento na saúde mental vivenciam em seus percursos de envelhecimento e longevidade. Cristhiane Freitas apresenta os resultados de sua pesquisa no texto intitulado: “Tecendo redes de sabedoria e conhecimento no encontro entre profissionais da saúde mental e da educação”. Nesta pesquisa intervenção Cristhiane mobilizou os profissionais de um Centro de Atendimento Psicossocial da Infância e da Adolescência de Mossoró e professoras de salas de Atendimento Educacional Especializado para analisar como as - redes - se efetivam nesta tessitura que envolve o atendimento das crianças que percorrem estas instituições. Rafael Almeida Rodrigues desenvolveu jogo dirigido à promoção da saúde mental, tecnologia esta construída após três anos de brincadeiras e jogos, apontamentos em diários de bordo que lhe permitiram construir requisitos pertinentes ao trabalho que visa o cuidado em saúde mental e a promoção da interação e comunicação entre as crianças. Um conjunto dos resultados encontramos em seu texto intitulado: “Aventura Espacial: Um Jogo Sério de Interface Adaptativa para Crianças e Jovens com Transtorno do Espectro Autista”.
Educação para cuidar e saúde mental para aprender, estas são algumas das premissas que sustentam as ações e pesquisas do programa Oficinando em Rede de Mossoró RN, um movimento inventivo necessário para que as dimensões do cuidado e da aprendizagem sejam possibilitadas em nossas comunidades.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Estudos dirigidos à promoção da aprendizagem e do cuidado em saúde mental e em educação permitem a construção de conhecimento e sabedoria que resultam em efetivas melhorias no viver. O Programa Oficinando em Rede de Mossoró segue em andamento e deveremos, em breve, lançar novo livro que sistematiza muitas das construções em curso.
A gravidade do cenário que vivemos hoje no mundo marcado por guerras, fome e fortalecimento de processos autoritários nos desafiam a uma reflexão sobre a pertinência e a potencialidade dos estudos que fazemos. Neste momento, nos debruçamos sobre o método - pesquisar COM para que, como afirmou Mário Osório Marques, nas relações diretas e imediatas possamos fortalecer a alegria e a esperança na transformação, a começar por cada uma/um.