Introdução: A mortalidade elevada por câncer de colo do útero no Brasil justifica a garantia da cobertura da população com relação ao exame citopatológico como ação contínua para rastreio das alterações causadas pelo Papilomavírus Humano (HPV). O exame citopatológico, além de colaborar com a assistência em saúde, também gera condições de registros para melhor conhecer o perfil da doença e das pessoas, permitindo acompanhar a população e a rotina do cuidado, bem como o intervalo de tempo entre consultas e exames e a periodicidade com que o fazem. O exame compõe uma das etapas do programa de controle do câncer do colo uterino, sendo garantido a toda população brasileira pelo Sistema Único de Saúde (SUS) nas Unidades Básicas de Saúde (UBS). Atualmente, a vacinação contra alguns subtipos de HPV (6, 11, 16 e 18) também compõe as estratégias de controle da neoplasia, válida também para outros tipos de câncer induzidos pelo mesmo vírus, como ânus, pênis, vagina, vulva e oral. A Atenção Básica (AB), nesse caso, é um ponto fundamental no processo de cuidado e controle do câncer de colo uterino, por identificar as condições que as pessoas vivem, observar questões biológicas e sociais às quais a população está sujeita e por estabelecer o vínculo entre as famílias e os serviços de saúde. No território amazônico, a AB tem o desafio de superar as alterações provocadas pela sazonalidade das águas, que produzem efeitos sobre a vida das pessoas e sobre o trabalho em saúde. Essa condição deve fomentar a iniciativa de políticas públicas com base na necessidade das pessoas, bem como na realidade territorial.
Objetivo: Descrever a estratégia adotada em Manicoré (Amazonas) para aprimorar o rastreamento de casos de câncer do colo uterino no município.
Metodologia: Relato de experiência sobre a gestão e a implementação da estratégia de controle do câncer de colo uterino em Manicoré (AM). A experiência foi vivenciada por profissionais de saúde vinculados aos serviços de saúde, com atuação na assistência e na gestão em saúde do município. A experiência e a interação entre os profissionais permitiram ampliar as discussões e as estratégias sobre a cobertura da população com o exame citopatológico.
Desenvolvimento: Manicoré possui doze Unidades Básicas de Saúde (UBS), localizadas em áreas urbanas e ribeirinha, além de uma fluvial. A partir de junho de 2021, a gestão municipal viabilizou a vinculação de uma médica ginecologista à equipe da AB. Dessa forma, os atendimentos especializados, o fluxo de amostras citopatológicas aos laboratórios e os tratamentos específicos tornaram-se mais viáveis. Com a complementação da equipe, os atendimentos passaram a ser realizados durante uma semana por mês. Com essa atualização no quadro de profissionais, os casos de encaminhamentos para consultas com a ginecologista são de mulheres que apresentam laudos de exames citopatológicos suspeitos ou positivos para lesão intraepitelial e malignidade ou outros casos que carecem de investigação e acompanhamento, mesmo que o diagnóstico não tenha sido emitido pelo laboratório. A mudança também permitiu aprimorar a busca ativa de mulheres para coleta do exame citopatológico, oportunizando a detecção precoce do câncer de colo do útero e acesso ao serviço de saúde. Anteriormente à mudança, todas essas mulheres eram referenciadas para Manaus, para a consulta com a ginecologista e realização de coleta de material para biópsia, em alguns casos. Com base no levantamento dos exames citopatológicos registrados no Sistema de Informação do Câncer (SISCAN/MS), em Manicoré, em 2021 foram realizados 1.422 exames e em 2022, 4.011. Dos 5.433 exames realizados nos dois anos, 51 resultados apresentaram alterações citopatológicas, incluindo ASC-US, ASC-H e Lesões da categoria baixo grau e alto grau - NIC I, II e III, sendo que, desse total, em 2021, 13 mulheres realizaram o exame de colposcopia com biópsia de colo uterino após apresentar o resultado na consulta de retorno; 8 foram devidamente encaminhadas para o serviço especializado em Manaus e 5 permaneceram em acompanhamento semestral por meio dos exames preventivos regulares. Em 2022, 38 mulheres realizaram colposcopias com biópsia, sendo que 12 foram devidamente encaminhadas para o serviço de referência estadual e 26 seguiram com acompanhamento em Manicoré. Importante evidenciar que destas pacientes encaminhadas para Manaus nestes dois anos, três foram agendadas diretamente para início de tratamento por apresentarem diagnóstico de carcinoma. As diretrizes apresentam orientações para todos os diagnósticos do exame citopatológico e, dessa forma, os protocolos e seus respectivos encaminhamentos devem ser consultados para que os casos sejam tratados adequadamente conforme conduta estabelecida. Ressalta-se a relevância de encaminhamentos com celeridade e organização para manter as pessoas inseridas na rede de atenção e evitar a evolução das alterações observadas, diminuindo, dessa forma, mais impactos sobre as próprias pessoas, bem como no serviço de saúde. Em 2021 foi registrado menor número de exames citopatológicos alterados, exceto para a faixa etária inferior a 25 anos de idade. Esse cenário pode ser consequência da pandemia de COVID-19, que, por orientação de evitar aglomeração nas unidades de saúde, impactou a rotina de atendimento nos serviços. Em 2022, exceto para a faixa etária inferior a 25 anos de idade, o número de exames citopatológicos alterados foi superior ao ano de 2021. O maior índice de positividade pode ser pelo aumento da procura de mulheres pelo serviço em decorrência da baixa procura no ano anterior devido a COVID-19. Além disso, em 2021 foi iniciada uma nova gestão de saúde, que priorizou a busca ativa das mulheres para rastreio do câncer de colo uterino após o planejamento interno das atividades e retorno à normalidade, considerando a crise respiratória, que orientava a suspensão de atendimentos eletivos. Com relação aos diagnósticos suspeitos e positivos, foram registrados em 2020 e 2021, respectivamente: ASCUS (24%, 53%), LSIL (7%; 0%) e ASC-H e HSIL (62%, 42%). Assim, a mudança na rotina de prevenção e controle do câncer de colo uterino em Manicoré se baseia nas tecnologias leves e duras em saúde, pois o fluxo de atendimento no interior dos sistemas perpassa pelo acolhimento, vínculo e atenção integral como gerenciadores das ações de saúde, além de suscitar a educação em saúde com a capacitação dos profissionais de saúde.
Conclusão: Para controle do câncer do colo uterino são necessárias tecnologias e ações que perpassam pela Atenção Básica e se expandem com a noção de território, exigindo financiamento adequado para responder adequadamente às necessidades pessoais e territoriais. Espera-se que, com a implementação da nova rotina dos fluxos e condutas de controle do câncer de colo uterino, o município alcance melhores resultados, demonstrando um compromisso com a qualidade de vida e com a saúde pública.