VIOLÊNCIAS E TENDÊNCIAS SADOMASOQUISTAS: UMA PERSPECTIVA DA PSICANÁLISE FROMMIANA

  • Author
  • Verginia Medianeira Dallago Rossato
  • Co-authors
  • Denis Cotta
  • Abstract
  • INTRODUÇÃO Esse trabalho objetiva compreender a relação entre o sofrimento psíquico e emocional decorrente da violência no espectro familiar e os impactos dessas experiências abusivas na estruturação de comportamentos sadomasoquistas. A fundamentação teórica desta pesquisa se orienta pela abordagem psicanalítica humanista de Erich Fromm, além de recorrermos a outros autores e comentadores que corroboram com a teoria do referido psicanalista. Uma das metas terapêuticas da psicanálise humanista envolve a busca do desenvolvimento das potencialidades existentes no interior de cada ser humano (FROMM, 2013). Ou seja, é necessário ao analista humanista, manter o foco na essência de cada ser, fortalecendo a energia vital, aquela que promove a vida e a que previne caminhos que levam à necrofilia[1].  Na relação sadomasoquista, objeto do nosso estudo, estão presentes sentimentos destrutivos, às vezes inconscientes. Para Fromm (1978), o sadomasoquismo pode ser confundido com o amor, deste contexto deturpado surgem os pseudoamores. Atitudes como a renúncia em nome de outra pessoa, abrir mão de direitos, ou seja, o sacrifício em nome do outro. O trabalho foi organizado utilizando fragmentos de atendimentos clínicos. Assim, seguimos o seguinte itinerário: o primeiro tópico, intitulado A estruturação dos comportamentos sadomasoquistas na visão psicanalítica humanista, relatará resumidamente, o impacto de episódios de violência experienciados por Lara[2] e, que, possivelmente, culminaram na estruturação de traços sadomasoquistas e necrófilos na referida analisanda. O segundo tópico, nomeado A tentativa de fuga de si mesmo, sublinhará breves considerações sobre a origem da violência na perspectiva frommiana e, por fim, o terceiro tópico, A contribuição da psicanálise humanista no atendimento às pessoas com histórico de abusos, buscará assinalar a contribuição da Psicanálise Humanista para o atendimento à pessoa com histórico de abusos.MATERIAIS E MÉTODOS A metodologia é composta por duas ferramentas analíticas distintas: a análise teórico-bibliográfica e o estudo de caso, do ponto de vista qualitativo. Para este fim, nos valemos de relatórios de atendimentos clínicos, elaborados a partir do setting terapêutico de uma analisanda. A escolha da referida analisanda se amparou pela história clínica desta, cujos conteúdos apresentaram fortes indícios de comportamentos masoquistas. A coleta de material para análise foi realizada durante o estágio supervisionado no período de 13 meses, entre setembro de 2021 e dezembro de 2022.  Este estudo foi estruturado através da análise de conteúdo, sendo dividido em três capítulos e, ao final de cada um deles, foram descritos trechos dos atendimentos clínicos da analisanda. RESULTADOS No primeiro capítulo analisamos a estruturação do caráter sadomasoquista sob a visão psicanalítica humanista. Sob o prisma frommiano, sublinhamos que, o caráter sadomasoquista se estrutura a partir de influência pessoais, adquiridas principalmente no meio familiar. Em termos sintéticos, as relações interpessoais quando influenciadas por uma sociedade exploratória – que não prima pela autonomia e pela liberdade individual – favorecem a instauração de comportamentos sadomasoquistas. Essa dependência simbiótica do par sádico e masoquista é mantida, porque um necessita do outro. Todavia, enquanto há vida, há possibilidade de aprender outros jeitos de direcionar a nossa carência de relacionamento. Segundo Fromm (2015), o amor autêntico é a expressão produtiva dessa necessidade de relacionamento, cujo desabrochar desemboca na biofilia e, ela, pode ser cultivada. No segundo capítulo, as reflexões são dirigidas ao entendimento de que, mesmo possuindo uma mescla de traços produtivos e improdutivos, o nosso caráter pode ser aprimorado.    Noutros termos, o esforço do indivíduo deve ser concentrado na correção da direção do leme, na construção de um caminho de lucidez, pautado por escolhas biofílicas, que nos dê a sensação de que a vida vale a pena ser vivida. Deve-se elucidar que as influências familiares e sociais são partes fundamentais para o processo de subjetivação, no qual nos constituímos como sujeitos livres e pensantes, conscientes que, no esforço diário vamos nos posicionando com maior vigor, vitalidade e felicidade. No terceiro capítulo, destacamos trechos que assinalam a melhora da paciente em relação a sua capacidade de fazer escolhas. Vale ressaltar que, o fortalecimento da autonomia da paciente não era visualizado claramente nas sessões primárias. Este progresso terapêutico só pode ser observado com o decorrer das sessões, fruto do processo analítico empreendido entre a paciente e a analista.  Observou-se também uma melhora significativa na evasão de situações conflituosas e necrófilas (tendência ao isolamento) em favor de caminhos mais biofílicos, (convivência com amigos e colegas). Diante do exposto, sublinhamos a noção frommiana de amor produtivo, a qual pode ser compreendida como: um ato de se implicar na vida do ser amado; de se responsabilizar pela vida do outro tanto em nível físico quanto no âmbito do desenvolvimento de suas potencialidades humanas. Para Fromm (2015), o amor é a única resposta satisfatória para o problema da natureza humana e, nesta resposta reside a saúde. Por fim, enfatizamos que a relação estabelecida no setting analítico é propicia para o desenvolvimento e fortalecimento do espectro intersubjetivo do paciente, desde que seja baseada no diálogo acolhedor, esclarecedor e amoroso. CONSIDERAÇÕES FINAIS Em última análise, seguimos defendendo que a Psicanálise Humanista tem uma contribuição fundamental para que o amor à vida ocupe o centro da existência do sujeito e a dignidade humana seja respeitada. Muito temos a aprofundar nesse tema para que, possamos reunir condições de estar nesse mundo, vivendo o presente e, tendo como foco o desenvolvimento em direção à biofilia, podendo assim usufruir de saúde e plenitude, inspirando e beneficiando as pessoas que nos circundam. É de extrema importância que o ser humano possa viver em um ambiente que incentive a liberdade, a criatividade e o desenvolvimento, que tenha segurança e condições de atingir sua plenitude e descobrir suas potencialidades. Erich Fromm nos conduz à compreensão de que, estamos imersos em uma sociedade que normaliza a competição, a falta de ética, a exploração, as desigualdades e a falta ou dificuldade aos acessos, tais como: a educação e a saúde. Estas problemáticas impactarão na formação de sujeitos com desequilíbrios em maior ou menor grau; aspectos que pudemos evidenciar no estudo de caso da paciente Lara (histórico de violências familiares, questões de inviabilização de estudos, dentre outros). Em última análise, seguimos defendendo que a Psicanálise Humanista tem uma contribuição fundamental para que o amor à vida ocupe o centro da existência do sujeito e a dignidade humana seja respeitada. Com base nos resultados obtidos em nossa pesquisa, podemos afirmar que o tratamento psicanalítico humanista visa desenvolver no indivíduo a habilidade de revisitar sua própria história, o que possibilita o aprimoramento da autoconsciência. Em outras palavras, é um processo de união das forças internas que promove a libertação das amarras mentais e uma existência pautada pela liberdade com saúde e felicidade. [1] Necrofilia- trata-se de práticas que destroem a vida, amor ao que é morto (FROMM,1975). [2] Pseudônimo atribuído à paciente, cujos fragmentos de práxis analítica, se encontram presentes neste estudo. Pesquisa apresentada na conclusão do curso de pós graduação em Psicanálise Humanista pelo Instituto de Psicanálise Humanista-Santa Maria/RS- ITPH em 25/05/2023 e que teve publicação em formato de livro em 23/11/23

     

  • Keywords
  • Violência. Masoquismo, Sadismo, Psicanálise Frommiana.
  • Subject Area
  • EIXO 5 – Saúde, Cultura e Arte
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