Resultados Preliminares: Tensões e Desafios na Implementação da Política Antimanicomial do Poder Judiciário nos Caps Ad II de Santa Maria (RS)

  • Author
  • Laura Camargo de Moraes
  • Co-authors
  • Félix Miguel Nascimento Guazina
  • Abstract
  • O presente estudo tem como propósito expor os resultados preliminares de uma pesquisa realizada nos Centros de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas II (Caps Ad II) em Santa Maria (RS), no contexto da desinternação gradual dos usuários do Instituto Psiquiátrico Forense Doutor Maurício Cardoso (IPF), em conformidade com a Resolução nº 487 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que institui a Política Antimanicomial do Poder Judiciário. A pesquisa consistiu em entrevistas semiestruturadas conduzidas com seis profissionais de diferentes áreas nos dois Caps Ad do município. Identificaram-se os temas principais abordados pelos participantes e analisaram-se os discursos com base na experiência dos profissionais e sua contribuição para a Rede de Atenção Psicossocial (Raps) local. As entrevistas revelaram desafios enfrentados pelos servidores no cotidiano, incluindo a dificuldade na construção da Raps e a falta de serviços adequados para receber a população proveniente do IPF, em uma cidade com quase 300 mil habitantes, mas sem Caps III, Serviço Residencial Terapêutico (SRT) ou Unidade de Acolhimento (UA). Essa lacuna prejudica a implementação do cuidado conforme previsto na portaria da Raps. Além disso, a constante intervenção do judiciário no cuidado prestado pelos servidores, juntamente com a falta de diálogo com essa instância, levanta preocupações. Os profissionais mencionaram um sentimento de judicialização do cuidado, apontando a imposição de procedimentos psiquiátricos compulsórios, como avaliações e internações, em leitos psiquiátricos ou comunidades terapêuticas. Essas questões ganham destaque diante do aumento da demanda por intervenções desse tipo. No contexto desses desafios, a implementação da Política Antimanicomial e a transferência de usuários do IPF para a comunidade representam um desafio significativo. Alguns profissionais expressaram preocupações quanto à periculosidade e ao manejo de crises relacionadas aos usuários do IPF,  relevando resquícios manicomiais no tratamento de pessoas com transtornos mentais e a fragilidade do serviço em trabalhar com usuários em crise. Os servidores apontaram dificuldades na atuação em rede, destacando a micropolítica como uma estratégia para o cuidado dos usuários em tratamento. No entanto, enfrentam obstáculos para estabelecer diálogo com a coordenação de saúde mental, incluindo reuniões pouco resolutivas e a necessidade de buscar insumos para o trabalho. Faltam medidas para o acolhimento não apenas dos usuários encaminhados do IPF, mas de todos os que integram a rede. Em resumo, os resultados preliminares revelam um cenário desafiador para os servidores municipais diante da desinternação progressiva dos usuários do IPF. As entrevistas destacaram várias questões, desde a falta dos dispositivos previstos na Raps até a intervenção excessiva do judiciário no cuidado aos usuários, evidenciando a dificuldade em oferecer um cuidado efetivo e humanizado. Apesar das preocupações, foram mencionadas estratégias de atuação em nível micropolítico, enfatizando a importância do cuidado individual e das ações cotidianas, apesar das limitações estruturais e da falta de diálogo com as instâncias superiores. Assim, a implementação da Política Antimanicomial do Poder Judiciário e a consolidação da Raps requerem esforços contínuos tanto no âmbito macro quanto no micro, visando superar os desafios enfrentados pelos servidores e garantir um cuidado digno e inclusivo para todos os usuários.

  • Keywords
  • Psicologia, Reforma Psiquiátrica, Judiciário, Política Antimanicomial
  • Subject Area
  • EIXO 2 – Trabalho
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