APRESENTAÇÃO:
O processo da gestação é complexo, dinâmico e transformador, onde ocorrem diversas mudanças fisiológicas e emocionais na vida da mulher, envolvendo expectativas em relação bebê, as mudanças na rede relacional e na própria identidade da mulher. Sendo assim, vivenciar o período gestacional significa também compreender a gravidez como um fenômeno que ultrapassa a esfera física, evidenciada pelas mudanças no corpo, e abarca as dimensões sociais e culturais da vida da gestante, implicando em sua reorganização, bem como na descoberta de novas possibilidades.
O início desta etapa, marcada pela confirmação da gravidez, desencadeia um processo que abrange os simbolismos sociais com os quais identifica-se a condição de ser uma mulher grávida na sociedade. Com isso, a mulher passa a conviver com a ideia de estar gestante, sendo que a maneira como reage às transformações que implicam desse processo, impacta diretamente em seu processo de adaptar-se e identificar-se como mãe, e também de interagir com o mundo que a cerca de uma nova forma.
Atualmente, sabe-se que o cuidado humanizado no pré-natal é um dos passos para um nascimento saudável, sendo fundamental para a diminuição da morbimortalidade materna e fetal, a preparação para maternidade e paternidade, a aquisição de autonomia, bem como a segurança no processo de nascimento. Para isso, deve-se auxiliar a gestante na capacidade de adquirir, desenvolver e manter a resiliência, apoiando-as no cuidado de sua saúde mental, física e bem-estar ao longo da maternidade.
Para incluir técnicas que propõem uma visão mais natural da gestação e promovem o autoconhecimento à gestante, a arteterapia se configura como uma das Práticas Alternativas e Complementares (PICs), de grande importância na qualificação do acompanhamento de Pré-natal no âmbito do SUS. Essa política, surgiu em 2017 e visa atender o grande desafio da Política de Atenção Básica no SUS que é ofertar cuidados às pessoas na sua integralidade.
Sendo assim, a arte de pintura de ventre está relacionada com o ato de exteriorizar o bebê imaginário e outros elementos da gestação como o cordão umbilical, a placenta, o útero e o líquido amniótico. Essa prática integra o contexto psicoterapêutico, com mediadores artísticos, visando a promoção da saúde e melhora da qualidade de vida das gestantes, além de fortalecer o vínculo da mãe com o futuro bebê.
O presente trabalho trata-se de um estudo descritivo, do tipo relato de experiência, em que apresenta-se a vivência de residentes atuantes em um centro de saúde do município de Florianópolis, Santa Catarina, que integram dois Programas de Residência Multiprofissional em Saúde da Família, sendo estes o programa da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), e o programa da Escola de Saúde Pública de Florianópolis (ESP). Essa vivência diz respeito à promoção de uma oficina de pintura no ventre para gestantes do terceiro trimestre de gestação, que realizam acompanhamento regular de pré-natal com as Equipes de Saúde da Família (ESFs).
A oficina buscou viabilizar um momento artístico e terapêutico de conexão entre mãe e feto como parte do processo de gestar e de desenvolvimento da maternidade, além de promover a integração com outros familiares quando estes presentes na oficina, bem como o fortalecimento do vínculo com o serviço de saúde. Esse trabalho apresenta e reflete acerca da vivência da oficina como um espaço de cuidado humanizado durante o período de gestação, visando a promoção do bem estar através da arte.
DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO:
Em decorrência do movimento de conscientização sobre o câncer de mama, em outubro de 2023, foi organizada pelos residentes uma semana de atividades voltadas para mulheres, com uma programação de segunda a sábado promovendo espaços para troca de experiências, saberes e esclarecimento de dúvidas entre as participantes e profissionais de saúde. Como parte desta programação, a oficina de pintura de ventre para gestantes foi realizada no dia 19 de outubro de 2023 no auditório do Centro de Saúde.
Para a compra dos materiais para realização de pintura no ventre, pediu-se colaboração financeira dos próprios profissionais do serviço, incentivando também as mulheres participantes da oficina a trazerem maquiagem que tivessem em casa. Além disso, foram confeccionados pelos residentes moldes do desenho do bebê, em papel couche, para padronizar o desenho e otimizar o tempo.
A oficina foi divulgada em todas as 7 equipes de saúde do serviço para as gestantes pertencentes ao público-alvo no momento do atendimento de pré-natal, através do envio de mensagem eletrônica e também através da rede social vinculada ao Centro de Saúde. Para fins de promover a integração e o vínculo, também foi permitida e incentivada a presença de familiares nesta oficina.
Previamente ao encontro, os profissionais mediadores da oficina montaram um cenário para sessão de fotos a ser realizada após a pintura, promovendo um espaço para reconhecimento desta mulher, auxiliando na sua autopercepção e autocuidado. Ademais, como parte da oficina, foi construída uma playlist com as músicas indicadas pelas gestantes, tornando o momento mais acolhedor e pertencente.
RESULTADOS:
Ao total participaram da oficina 8 mulheres com idade gestacional entre 20 e 36 semanas. A prática da pintura de ventre propiciou maior vinculação tanto entre os profissionais e gestantes quanto potencializou a vinculação mãe-bebê, além do fortalecimento com a rede, colocando a atenção primária como desenvolvedora de ações de promoção à saúde.
Para as gestantes, a realização da arte da pintura do ventre foi um momento de relaxamento, emoção e alegria por poder visualizar o desenho do bebê e suas características, imaginadas pelas mesmas, proporcionando participação dos familiares no processo, criando um ambiente acolhedor que entende por saúde o conceito de bem estar. Como devolutiva as mulheres que participaram da oficina, foram enviadas as fotos tiradas durante e ao final da ação, através do meio de comunicação de sua preferência.
Sendo assim, os objetivos da ação foram alcançados, com a promoção da identificação, e de espaço de trocas de experiências e saberes entre mulheres em um mesmo momento da vida. Com isso, espera-se que encontros futuros sejam desenvolvidos pelos residentes, tornando essa prática uma rotina da unidade, para que todas as gestantes possam se beneficiar desse momento.
CONSIDERAÇÕES FINAIS:
A oficina mostrou-se exitosa ao proporcionar um momento de arteterapia como espaço de cuidado e autoconhecimento para as gestantes, estimulando o fortalecimento da relação mãe-feto e contribuindo para o bem estar durante o processo da gestação. Além disso, possibilitou que acompanhantes participassem ativamente da atividade, reforçando assim a importância da rede de apoio e o vínculo da população com os profissionais de saúde.
Por fim, destaca-se como potencialidades, a importância da iniciativa dos residentes no emprego de técnicas humanizadas de assistência às gestantes no âmbito da Atenção Primária à Saúde do SUS, e a necessidade de dar seguimento às oficinas de pintura de ventre materno junto aos demais profissionais do centro de saúde no próximo período.
Quanto aos desafios e sugestões para futuros encontros, destaca-se a importância da aquisição de materiais de pintura que contemplem todos os tons de pele das participantes, além de divulgar a oficina em mais meios de comunicação para aumentar o número de gestantes atendidas.