Apresentação
O albinismo é caracterizado com uma condição genética, congênita e hereditária na qual há a interrupção ou diminuição da produção da tirosina, que é uma molécula essencial para o metabolismo da melanina, pigmento responsável por colorir a pele, os pelos e os olhos dos seres humanos. Há múltiplas classificações para a o albinismo, as principais são a ocular (na qual o albinismo atinge apenas os olhos), o parcial ou piebaldismo (onde o albinismo afeta regiões delimitadas de pele e cabelo) e o albinismo oculocutâneo (tipo de albinismo em que todo o corpo é afetado de maneira integral).
Nessa perspectiva, compreende-se que essa condição genética possui consequências físicas e psicológicas para os sujeitos atingidos. No que concerne à primeira, nota-se que a ausência de melanina nos olhos predispõe os sujeitos a desenvolverem alterações oculares, como a miopia (CID-10 H52.1), astigmatismo (CID-10 H52.2), hipermetropia (CID-10 H52.0), estrabismo (CID-10 H50), nistagmo (CID-10 H55) e fotofobia (CID-10 H53.1). Concomitantemente, a ausência dessa molécula na pele aumenta a suscetibilidade ao surgimento de lesões ocasionadas pela radiação solar, como o fotoenvelhecimento precoce, o eritema solar e lesões cutâneas com potencial cancerígeno. Para além das repercussões físicas, os sujeitos afetados por essa condição genética tendem a conviver com o sofrimento psíquico ocasionado pelo isolamento social, ao se abrigarem do sol durante todo o dia e ao cerceamento da participação em decorrência da falta de assistência frente às particularidades em saúde supracitadas, estigmatização, discriminação, e a sensação de não pertencimento.
No Brasil, o albinismo só foi reconhecimento institucionalmente como uma condição que demanda cuidados específicos no final de 2023, quando o conselho nacional de saúde publicou a resolução n° 725, de 09 de novembro de 2023, aprovando a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas com Albinismo, marco, apesar de tardio, indubitavelmente importante na construção de uma rede de cuidados que atenda as singularidades presentes dentro da condição em enfoque e para promoção de um itinerário de saúde que contemple tamanhas particularidades e rompa com as grades que delimitam as potencialidades nas expressões de ser desses sujeitos. Todavia, por ser tão recente, ainda não há nos cursos de saúde disciplinas que abordem o cuidado integral à saúde dessa população, circunstância que repercute na necessidade de uma formação complementar dos acadêmicos no intuito de suprir as lacunas de conhecimento acerca do tema, rompendo assim com as iniquidades de saúde relacionados ao despreparo de profissionais para o cuidado com a pessoa com albinismo.
Em consonância ao exposto, o presente trabalho objetiva relatar a realização de uma oficina sobre a saúde da população com albinismo ministrada para acadêmicos de Enfermagem, Medicina, Serviço Social e Psicologia de uma universidade do agreste alagoano.
Desenvolvimento do trabalho
A produção em evidência busca versar, por meio de um estudo descritivo, alicerçando-se por meio do tipo relato de experiência, sobre uma oficina que ocorreu como parte das ações do Projeto de Extensão “DIREITO À SAÚDE e o SUS: Políticas de saúde às populações em vulnerabilidade e a participação popular na Saúde”, iniciativa extensionista desenvolvida por acadêmicos e docentes dos cursos de Enfermagem, Medicina, Serviço Social e Psicologia da Universidade Federal de Alagoas, Campus Arapiraca.
Dessa maneira, a experiência relatada ocorreu como parte de um evento promovido pelo projeto de extensão acerca do direito à saúde que ocorreu na cidade de Arapiraca, no agreste alagoano, tendo como público-alvo acadêmicos dos cursos de Enfermagem, Medicina, Serviço Social e Psicologia, sendo também aberto para componentes outros que desejassem somar as proposições do referido momento, como profissionais da saúde do município.
Tendo em consideração o supracitado, a oficina foi pensada de modo a horizontalizar a construção do processo de ensino-aprendizagem, em consonância às tendências progressistas de ensino. A princípio, houve uma rodada de apresentações e, em seguida, deu-se início a uma dinâmica em que os participantes tinham que responder um questionário de autoavaliação com dez perguntas sobre o albinismo e os seus conhecimentos acerca dele, tais perguntas foram extraídas de um estudo que visava a quebra de estigmas relacionados a essa população
Após a resposta inicial, foram transmitidos dois vídeos de pessoas com albinismo, colaboradoras do projeto, falando sobre a suas respectivas vivências e, de maneira indireta, respondendo às perguntas suscitadas. Por conseguinte, foi solicitado que todos os presentes respondessem uma segunda vez o questionário e compartilhassem as questões em que haviam alterado as suas respostas, explicando o porquê da alteração.
Como uma forma de encaminhamento para fins de síntese e fechamento das discussões, houve o preparo de um slide contando com um panorama geral sobre a fisiopatologia, epidemiologia, diagnóstico e cuidados com a saúde da pessoa com albinismo, bem como a legislação que regulamenta a saúde enquanto um direito e garante o acesso a ela de maneira equânime.
Resultados
Consonante as explanações anteriores, no que tange ao viés quantitativo, ao todo, a oficina contou com a participação de 45 sujeitos, entre eles discentes de Psicologia, Serviço Social, Enfermagem e Medicina. Paralelamente, seguindo a metodologia ativa escolhida, a oficina possibilitou uma interação dinâmica entre os facilitadores e o público-alvo, fazendo com que assuntos que se relacionavam a saúde da população com albinismo, entendendo a multiplicidade e integralidade envolvida nos aspectos constituintes da mesma, fossem explorados primeiro a partir de experiências individuais e, posteriormente, sendo relacionados com a literatura.
De maneira análoga aos elementos direcionadores explicitados, a oficina contou com a presença de sujeitos com albinismo tanto na sua organização, quanto em sua condução, situação esta que possibilitou que inquietações e reflexões, uma vez que, experiências individuais foram compartilhadas e discutidas coletivamente, possibilitando que os participantes do momento conseguissem tangibilizar os atravessamentos das pessoas com albinismo e se identificassem com elas, mesmo não sendo também pessoas com albinismo. Outrossim, as dificuldades que as pessoas com albinismo enfrentam não são ocasionadas pelo albinismo de maneira isolada, para além dele, estão o racismo, o capacitismo e a ignorância dos sujeitos, baixa acuidade teórico-prática não somente em âmbito institucional, como também nos movimentos basilares da sociedade, questão que repercute na (re)produção de preconceitos e estigmas proporcionando dificuldades de acesso a serviços de saúde, e mecanismos outros nas mais diversas esferas das vidas dos sujeitos.
Considerações finais
Em decorrência da execução da prática relatada, conclui-se que apesar do reconhecimento institucional do albinismo como uma condição genética que demanda cuidados específicos ser recente no país, o cuidado integral e equânime os usuários do SUS está presente na legislação desde o seu surgimento, devendo ser executado por todos os profissionais que o constituem. Sendo assim, a promoção de atividades que proporcionem a formação complementar de acadêmicos para lidar com populações vítimas de iniquidades é essencial para o rompimento destas iniquidades e para promoção de saúde para estes coletivos. Portanto, evidencia-se, assim, a experiência relatada como exitosa na contribuição com a formação dos sujeitos participantes e como ação potencializadora na ampliação do debruçar acadêmico e social acerca das alteridades das pessoas com albinismo.