No Brasil, as políticas voltadas para crianças e adolescentes historicamente enfatizaram a proteção, resultando em um modelo de assistência que tendia à institucionalização e segregação, especialmente para aqueles com necessidades de saúde mental. No entanto, com o movimento de redemocratização, houve uma revisão dessas concepções, e hoje as políticas públicas de saúde mental para esse grupo priorizam o cuidado integral e considerando crianças e adolescentes como sujeitos de direitos e desejos.
Foram realizados dois grupos focais, um com familiares da Atenção Básica (AB) e outro com familiares do Centro de Atenção Psicossocial Infantojuvenil (CAPSij), totalizando 15 participantes. Seguiu-se com a análise lexical do tipo classificação hierárquica descendente, com o auxílio do software R Interface, a fim de análises multidimensionais de textos e questionários (IRaMuTeQ).
A análise do corpus revelou cinco classes. A Classe intitulada "Procurando por ajuda", representou 25% do conteúdo, destacando as dificuldades que levaram os familiares a buscar cuidados em SM. Na AB, predominaram problemas de aprendizagem e comportamentais, enquanto no CAPSij as questões estavam relacionadas à interação social e linguagem, caracterizando crianças com TEA. A escola desempenhou papel ao alertar as famílias sobre possíveis dificuldades das crianças, incentivando a busca por ajuda especializada.
A Classe "Aceitando o diagnóstico da criança", correspondeu a 17,09%, evidenciando as diferentes reações dos familiares ao receber o diagnóstico, desde a negação inicial até a aceitação, com destaque para o apoio dos profissionais de saúde e a troca de experiências entre os pais. Na Classe "Onde procurei ajuda", representando 22,15%, os familiares mencionaram os serviços procurados, como a Apae, ressaltando as dificuldades de acesso e a importância do encaminhamento por profissionais da saúde e da escola. Enquanto isso, na Classe "A pílula mágica?", predominou a busca por medicação entre os familiares da AB, destacando as dificuldades de acesso a especialistas como neurologistas.
Por fim, a Classe "Forças e Fraquezas dos serviços", com 15,82%, revelou a percepção dos familiares sobre os serviços de saúde mental, ressaltando a importância do acolhimento e do acompanhamento oferecido, mas também apontando fragilidades, como a falta de comunicação entre profissionais e famílias. Apesar das dificuldades enfrentadas, os participantes reconheceram a importância do suporte recebido e das melhorias observadas no desenvolvimento das crianças, evidenciando a complexidade e a importância do cuidado em saúde mental na infância.
Os resultados apontam para dificuldades presentes na AB em identificar e manejar situações de Saúde Mental Infantojuvenil (SMIJ), por meio de uma lógica ainda medicalizante. Ressalta-se que a escola é apresentada como lugar de destaque na produção da demanda por cuidado e a família ainda é pouco convocada à construção das ações. Conclui-se, então, que avanços ainda são necessários para operacionalização de um cuidado pautado nas diretrizes da política de SMIJ.