UMA MÃE LEVA A OUTRA: EXPERIÊNCIAS DE LUTA PELA SAÚDE MENTAL MATERNA

  • Author
  • Giulia Dos Santos Goulart
  • Co-authors
  • Anelise Beheregaray dos Santos , Kely Rathke Bonelli , Bibiana Copatti , Iuri Trezzi , Letícia Oliveira Damitz , Daniela dos Anjos , Fernanda Beheregaray Cabral
  • Abstract
  • Introdução: Existe uma considerável estigmatização social associada aos assuntos relacionados à saúde mental, e esse estigma é ainda mais pronunciado quando relacionado à maternidade. Isto corrobora para um aumento alarmante nos casos de depressão, ansiedade e suicídio entre mulheres que são mães. Em diversos níveis de atenção à saúde, pouca ou nenhuma consideração tem sido dada aos elementos contribuintes para o sofrimento mental enfrentado por mulheres diante das crescentes exigências da maternidade. Ainda, as desigualdades de classe desempenham um papel fundamental na determinação do acesso aos serviços de saúde mental. Mulheres-mães da classe trabalhadora, muitas vezes, enfrentam a impossibilidade de tirar tempo do trabalho ou das responsabilidades familiares para buscar ajuda, então enfrentam dificuldades financeiras que as impedem de buscar tratamento adequado para transtornos de saúde mental. Além disso, a falta de recursos em áreas de baixa renda, muitas vezes, se traduz em uma escassez de serviços de saúde mental disponíveis, exacerbando ainda mais as disparidades de acesso. Não obstante, as desigualdades de gênero desempenham um papel significativo na forma como as mulheres-mães são tratadas e percebidas no contexto da saúde mental. Muitas vezes, as mulheres são socializadas para assumir o papel de cuidadoras principais da família, o que pode levar a uma negligência de suas próprias necessidades de saúde mental. Além disso, estereótipos de gênero podem resultar em subestimação ou minimização dos sintomas de doenças mentais em mulheres. Esses estereótipos também podem contribuir para o estigma em torno das doenças mentais femininas. As desigualdades relacionadas à sexualidade também desempenham um papel crucial na saúde mental materna. Mulheres que não se enquadram na heteronormatividade dominante podem enfrentar discriminação e marginalização adicionais, o que pode aumentar o risco de problemas de saúde mental. Além disso, a falta de sensibilidade cultural e qualificação de profissionais de saúde pode levar a uma falta de acesso a tratamentos adequados e de apoio para mulheres-mães que pertencem a comunidades LGBTQIAPN+. Assim, reconhecer e confrontar essas desigualdades não é apenas uma questão de justiça social e direitos humanos, mas também de se reconhecer a vida como imanência, ou seja, como uma rede interconectada de relações onde o bem-estar de cada indivíduo está intrinsecamente ligado ao bem-estar da coletividade. Definir justiça social e direitos humanos nesse contexto implica garantir que todas as pessoas, independentemente de sua classe social, gênero ou sexualidade, tenham acesso igualitário aos recursos e oportunidades necessários para viver uma vida plena e saudável. Nesse sentido, o Sistema Único de Saúde (SUS) desempenha um papel crucial na promoção da justiça social e dos direitos humanos, pois busca garantir o acesso universal e igualitário aos serviços de saúde para toda a população brasileira. No entanto, o SUS também enfrenta seus próprios desafios, incluindo a falta de financiamento adequado, a escassez de recursos humanos e a desigualdade na distribuição de serviços. Para defender verdadeiramente a justiça social e os direitos humanos no contexto da saúde mental materna, é essencial fortalecer e expandir ações de conscientização para a causa, buscando suporte para o fornecimento de serviços de qualidade e culturalmente sensíveis para todos, independentemente de sua posição social, gênero ou sexualidade. Objetivo: Relatar vivências e atividades de uma campanha desenvolvida por meio de mobilização conjunta, intitulada Maio Furta-Cor. Desenvolvimento: Trata-se de um estudo descritivo, com abordagem qualitativa, tipo relato de experiência. O Relato de experiência é uma forma de construção de conhecimento na qual o texto aborda uma experiência vivenciada no contexto acadêmico e/ou profissional. Sua característica essencial é a descrição da intervenção realizada. Na elaboração desse tipo de estudo, é fundamental promover uma reflexão crítica sobre a experiência relatada. Neste sentido, o estudo abordará ações de capacitação realizadas, de maio de 2023 a abril de 2024, com as 514 representantes - de 22 diferentes estados do Brasil e do Distrito Federal - que aderiram à campanha. Tais capacitações, consistiram em ações como rodas de conversa, encontros de mães, reuniões, palestras, feiras de empreendedorismo materno, seminários, fóruns de saúde mental e violência obstétrica, aulas abertas, encontros políticos, marchas coletivas, mateadas e divulgações informativas realizadas de forma territorializada. Para desenvolver estas atividades, as representantes qualificaram-se sobre temáticas interseccionais à saúde mental materna, dedicando-se às ações de cuidado, promoção, conscientização e incentivo à saúde mental materna e ao desenvolvimento de atividades alusivas ao mês da campanha. Ainda, dividiram-se de acordo com seus territórios (municípios, estados e regiões), para que fosse possível a organização do calendário oficial de eventos que se correlacionem com a temática. Ademais, tais representantes comprometeram-se com o incentivo de órgãos de administração pública, entidades de classe, empresas, associações, federações e entidades civis a apoiarem as campanhas do Maio Furta-Cor. Resultados: A partir da reprodução do conhecimento das representantes que constroem o coletivo da campanha Maio Furta-Cor para sociedade, obteve-se como resultado a contribuição para uma maior conscientização e compreensão social sobre os desafios enfrentados pelas mulheres em relação à saúde mental durante a maternidade. Ainda, as reuniões, palestras, seminários, fóruns de saúde mental e violência obstétrica, aulas abertas, encontros políticos e divulgações informativas oportunizaram capacitar profissionais de saúde, assistentes sociais, educadores e outros agentes comunitários sobre a importância da abordagem interseccional na promoção da temática, bem como sobre estratégias de identificação precoce e intervenção adequada. Também, por meio de rodas de conversa, encontros de mães, feiras de empreendedorismo materno, marchas coletivas e mateadas puderam-se fortalecer a rede de apoio às mulheres-mães, oferecendo espaços seguros e solidários para compartilhar experiências, buscar apoio mútuo e acessar recursos que promovam o bem-estar mental durante a maternidade. Não obstante, encontros políticos, marchas coletivas e divulgações informativas possibilitaram observar uma maior conscientização pública sobre a importância da saúde mental materna e mobilização de recursos e apoio para políticas e práticas que promovem o bem-estar das mães, especialmente aquelas que enfrentam múltiplas formas de discriminação e opressão. Exemplifica-se isso a partir da aprovação de projetos de leis envolvendo a promoção da saúde mental materna em 76 municípios brasileiros. Além disso, novos conhecimentos sobre a interseccionalidade da saúde mental materna foram compartilhados, não apenas dentro da comunidade acadêmica, mas também com a sociedade em geral, por meio de publicações, mídias sociais e outros canais de comunicação acessíveis. Finalmente, o conhecimento gerado e as discussões promovidas por essas atividades influenciaram positivamente as políticas públicas relacionadas à saúde materna, levando a uma maior inclusão de perspectivas interseccionais e a medidas concretas para melhorar o acesso a serviços de saúde mental de qualidade para todas as mulheres, independentemente de sua origem étnico-racial, socioeconômica, orientação sexual, identidade de gênero, entre outros aspectos. Considerações Finais: A campanha Maio Furta-Cor aborda as desigualdades de classe, gênero e sexualidade na saúde mental das mulheres-mães de maneira holística e interdisciplinar, reconhecendo e confrontando as múltiplas formas de opressão que elas enfrentam. Isso envolve não apenas a busca pela melhoria do acesso aos serviços de saúde mental, mas também da criação de políticas e programas que abordem as raízes estruturais da desigualdade vivenciada na maternidade.

  • Keywords
  • Saúde Mental, Saúde Materna, Perspectiva de Gênero, Enquadramento Interseccional.
  • Subject Area
  • EIXO 6 – Direito à Saúde e Relações Étnico-Raciais, de Classe, Gênero e Sexualidade
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