Revisão de literatura sobre plantas medicinais em saúde bucal: possibilidades para o trabalho no SUS

  • Author
  • Patrícia de Melo Guedes Facundo
  • Co-authors
  • Deison Alencar Lucietto , Carlos Alexandre Rodrigues Pereira
  • Abstract
  • Introdução

    O uso de plantas medicinais (PM) e suas aplicações na cura de doenças é uma prática realizada há milhares de anos. Estima-se que entre 70-95% da população mundial faça uso de PM. 

    Mesmo que grandes nomes tenham se destacado no estudo científico das PM ao longo da história, sua utilização foi desenvolvida principalmente a partir do saber tradicional sendo transmitida das gerações mais antigas para as mais recentes por meio da oralidade.

    Neste sentido, é importante diferenciar PM de medicamentos fitoterápicos: enquanto a PM é definida como a “espécie vegetal, cultivada ou não, utilizada com propósitos terapêuticos”, sendo considerada “medicinal” por possuir “substâncias que podem prevenir, curar ou tratar doenças”, o fitoterápico é tido como o “medicamento que se obtém a partir de uma PM”.  

    O Brasil possui uma legislação moderna no que tange à fitoterapia, o que foi possível em função de iniciativas anteriores de reconhecimento das Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS) e de seu potencial para promover o cuidado integral, materializados na Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPICS) no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), em 2006.

    Dentre as diversas PM disponíveis, algumas têm sido utilizadas como complementares na prevenção e no tratamento de condições bucais. Quanto ao uso, essas plantas podem ser administradas em Odontologia de diferentes formas: infusão ou chá; decocção e tintura. 

    Considerando o potencial de uso das PM na atenção à saúde bucal no SUS, a competência legal do cirurgião-dentista na prescrição e a regulamentação do uso de PICS pelo Conselho Federal de Odontologia em 2008, este estudo tem como objetivo revisar a literatura científica sobre a utilização de PM na prevenção e no tratamento de condições bucais.

    Método

    Tratou-se de revisão integrativa de literatura, conduzida por meio das seguintes etapas: definição do tema e elaboração da questão de pesquisa; elaboração dos critérios de elegibilidade, inclusão e exclusão dos estudos; levantamento das publicações nas bases de dados; categorização e análise das informações encontradas nas publicações; avaliação dos estudos selecionados; apresentação dos resultados, incluindo análise crítica dos achados e síntese da revisão. A partir da pergunta norteadora: “Quais as indicações das PM na prevenção e no tratamento de condições bucais?” foi elaborada a estratégia de busca com os seguintes descritores, com o booleano “AND”: “Plantas Medicinais”; “Fitoterapia”; “Odontologia”. Artigos com texto completo disponível, publicados nos últimos 20 anos (2002-2023) e no idioma português (pelo interesse em mapear PM brasileiras de uso corrente no país) foram incluídos. Foram excluídas as publicações que não respeitassem a delimitação do objetivo do estudo, bem como as resultantes de artigos de opinião, de uso veterinário e estudos de reflexão, editoriais, monografias, dissertações, teses, documentos ministeriais e capítulos de livro. Publicações que tratavam exclusivamente de medicamentos fitoterápicos foram excluídas (por não fazer parte do objeto em estudo). 

    Para a elaboração desta revisão, foram realizadas buscas nas bases de dados Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), Scientific Electronic Library Online (SciELO) e no Portal de Periódicos CAPES. A pesquisa por publicações foi realizada em formulário avançado em cada base, no mês de março de 2023.

    Resultados

    A busca em bases de dados resultou em um total de 247 publicações. Também foram identificados 4 artigos provenientes de outras fontes. Das 251 publicações identificadas, após aplicação dos critérios de inclusão e da exclusão, 34 artigos tiveram seu texto analisados na íntegra.   

    A revisão identificou 18 PM com uso potencial em condições da cavidade oral: Alecrim (Rosmarinus Officinalis); Araçá (Psidium Cattleianum Sabine); Aroeira (Schinus terebinthifolius); Babosa/Aloé Vera  (Aloe Vera L.); Calêndula (Calendula Officinalis L.); Camomila (Matricaria Chamomilla L.); Capim-Limão (Cymbopogon Citratus); Copaíba (Copaifera Langsdorffii); Curcumina (Curcuma Longa); Gengibre (Zingiber Officinalle); Jabuticaba (Myrciaria Cauliflora); Lavandula (Angustifolia Miller); Limão (Citrus limon linn); Malva (Malva Sylvestris); Melaleuca (Malaleuca Alternifolia Cheel (Myrtaceae)); Romã (Punica Granatum); Salvia (Officinalis), além do Própolis (Apis Mellífera L.), que embora seja de origem animal, utiliza espécies vegetais para coletar o néctar para a produção de mel.

    Dentre as ações das PM identificadas nos artigos destacam-se seus potenciais antimicrobianos, antifúngicos, anti-inflamatórios e cicatrizantes. Verificou-se que estas plantas, em conjunto, são indicadas com diferentes finalidades: controle/combate ao biofilme dental; prevenção de infecções após procedimentos cirúrgicos/endodônticos; tratamento de estomatites/candidose; cicatrização de lesões de mucosa; combate à halitose; tratamento de faringites e antissepia bucal. 

    A utilização segura e eficaz de PM requer um conhecimento apurado, abrangendo a identificação precisa da planta, a escolha das partes apropriadas para uso, o método adequado de preparo, a forma correta de administração e a dose adequada. É importante entender que o fato de ser natural, não quer dizer que não tenha contraindicações. Estes são pontos que devem ser levados em consideração para que a população seja orientada. 

    Tal ponto de vista implica afirmar que os cirurgiões-dentistas devem estar atentos às suas responsabilidades sociais, atuando como agentes de saúde, em favor da melhoria das condições de saúde da população e da efetivação das políticas públicas de saúde/saúde bucal do país. Para tanto, os profissionais precisam extrapolar o meramente odontológico, buscando pela integração de conhecimentos/práticas científicos com aquelas que fazem parte do saber popular, a exemplo do que acontece com o uso das PM.

    Acredita-se que o uso da fitoterapia/PM por cirurgiões-dentistas, especialmente pelos profissionais e equipes de saúde bucal no SUS - em função de fatores como facilidade de acesso, aceitabilidade e menor potencial tóxico -, pode contribuir para o alcance de melhores condições de saúde bucal pela população atendida, além de ser uma importante forma de promoção da saúde, de fomento à participação social, de fortalecimento de saberes populares em saúde e de minimização de desigualdades sociais em saúde bucal.

    Ainda há poucos estudos acadêmicos sobre a aplicação da fitoterapia/PM na atividade clínica dos cirurgiões-dentistas, especialmente quando se considera que o país detém uma legislação moderna sobre fitoterapia, há uma política nacional que inclui sua utilização no SUS e que há a recomendação da OMS para utilização da fitoterapia.

    Considerações finais 

    Esta revisão de literatura identificou 34 artigos científicos brasileiros relacionados às propriedades e indicações de 18 PM na prevenção e no tratamento de condições bucais. Os resultados indicam que essas plantas possuem notáveis propriedades antimicrobianas, anti-inflamatórias e cicatrizantes, mostrando-se promissoras em uma variedade de condições bucais. 

    Considerando a grande aceitação da população pelo uso de PM, as evidências da sua eficácia e o seu reconhecido uso como prática integrativa e complementar no SUS, é preciso fomentar novas pesquisas e aprimorar a formação dos futuros profissionais para que esta alternativa seja utilizada de forma mais efetiva na atenção em saúde bucal.

  • Keywords
  • Odontologia, Plantas Medicinais, Saúde bucal, Sistema Único de Saúde.
  • Subject Area
  • EIXO 2 – Trabalho
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