A conceituação do fenômeno da violência de gênero é um processo que perpassa muitas áreas do conhecimento. Além de ser um acontecimento histórico, cultural, e social, apresenta ligação com as desigualdades e relações de poder envolvendo as representações de gênero. Entre as diversas práticas violentas existentes, a violência contra as mulheres está diretamente relacionada a um dos mais marcantes traços do patriarcado na nossa sociedade, se caracterizando como uma força social estruturante marcada pelo exercício do poder sobre os corpos femininos. Os caminhos percorridos pelas mulheres em situação de violência em busca por proteção são chamados de rota crítica e delineiam os passos antes da chegada aos serviços da rede. É um processo de múltiplas interações, marcado por fatores que facilitam e dificultam o acesso ao cuidado, sendo influenciado pela disponibilidade de informação e conhecimento que a mulher tem acesso, bem como por suas percepções e atitudes, experiências anteriores. Este trabalho apresenta uma análise de como mulheres vítimas de violência buscaram estabelecer relações com os serviços de saúde ao longo de suas rotas buscando proteção e cuidado. O objetivo do estudo foi analisar os caminhos percorridos com foco nas experiências relatadas no encontro com o setor saúde de forma a identificar as possíveis lacunas e potencialidades de atenção ofertadas pelos serviços e profissionais. Trata-se de uma pesquisa exploratória de abordagem qualitativa realizada através da utilização do método história oral temática. O projeto de pesquisa foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da Universidade Estadual de Londrina, no ano de 2021. As sujeitas desta pesquisa foram 7 mulheres maiores de 18 anos que vivenciaram algum tipo de violência ao longo de suas vidas, encontravam-se em fase de superação da situação de violência, residem no município de realização da pesquisa e aceitaram compartilhar suas histórias. As entrevistadas relataram abertamente suas experiências em relação à violência vivenciada, sem interferência da pesquisadora, sendo posteriormente resgatadas as principais partes da história relatada que se alinhem ao fenômeno pesquisado e os objetivos da pesquisa. Foram solicitados aprofundamento dos eventos, momentos ou fatos específicos das histórias possibilitando acesso aos contextos e sentimentos presentes. Observou-se que as mulheres empregaram diversas estratégias para o enfrentamento da situação de violência. O setor saúde se apresentou distante das mulheres, mesmo quando elas estavam dentro dos serviços, logo após terem vivenciado situações violentas. Os ferimentos foram vistos de forma descolada do contexto em que ocorreram e as demais consequências na saúde mental das sujeitas não foram consideradas mesmo em serviços especializados, o que demonstra como as mulheres precisaram conviver com a invisibilidade da violência mesmo quando buscaram ajuda. A formação para uma escuta qualificada e formas de acolhimento mais efetivas, de maneira a diminuir relatos futuros de desamparo e manutenção de situações de violência, são evidentemente necessárias na área da saúde. É preciso olhar de outra perspectiva sobre o fenômeno, partindo da defesa de políticas públicas para mulheres consistentes que de fato sejam mecanismos facilitadores no processo de rompimento de violência contra as mulheres.