Desafios Ético-Políticos da Psicologia em Serviços de Saúde Mental: Um Relato de Experiência em Ananindeua, Pará

  • Author
  • Ana Paula Monteiro Leite
  • Co-authors
  • Cinthia de Castro Santos
  • Abstract
  •  

    Este trabalho reflete sobre prática e produção de cuidado em saúde mental em um serviço especializado da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS). Trata-se de um relato de experiência de trabalho de duas psicólogas em Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), nas modalidades adulto (CAPS II) e infanto juvenil (CAPSi) no município de Ananindeua no Pará, apresentando questões específicas do fazer da psicologia neste contexto.

     Neste serviço, em ambas as modalidades, as atividades realizadas pelo psicólogo em geral não diferem: triagem para avaliar se a demanda que chega pode ser atendida pelo CAPS, atendimentos individuais, de avaliação, anamnese e exame do estado mental, acompanhamento regular individualmente e/ou com responsável, condução de grupo terapêutico, palestras e reuniões informativas, visitas domiciliares, estudos de caso e trabalho interdisciplinar em equipe. Conhecer quais os processos de saúde-doença são vivenciados por usuários e usuárias e auxiliá-los na observação e compreensão destes processos juntamente com suas famílias são fazeres observados no dia a dia do exercício profissional da psicologia.

    São necessários estes fazer e olhar da psicologia em um serviço de saúde mental, mas compreendemos que esta prática parte de um modus operandi da psicologia que não cabe mais principalmente em um serviço público de saúde. À psicologia não cabe mais apenas fazeres, diríamos, clínicos; como profissão, ela deve atentar-se em ocupar um lugar ético-político nos espaços aos quais ela é convocada.

    A Política Nacional de saúde mental e o movimento antimanicomial nos convocam para esse lugar de resgate da cidadania, reinserção social e garantia dos direitos das pessoas com transtornos mentais e/ou em sofrimento mental, no entanto os discursos e fazeres da psiquiatria enquanto instituição não superada e “reformada” ainda atua de maneira por vezes imperiosa no CAPS, justo este o serviço criado com o objetivo de ser substitutivo ao manicômio.

    Havia a priorização da noção biomédica de adoecimento em detrimento a compreensão de ser humano integral, que também adoece em razão da falta dos mínimos sociais, de violências de toda espécie, pelas exigências da lógica neoliberal de vida e trabalho, de maneira que suas práticas tinham um viés patologizante e, consequentemente, a compreensão de doença e saúde pelos usuários e familiares não inserida em um campo relacional.

    Observamos a alta procura dos serviços do CAPS e, consequentemente a limitação e sobrecarga dos profissionais, inclusive alguns afastamentos destes do ambiente de trabalho ao longo dos anos, motivados por doença. Evidenciamos que os aspectos apontados são reflexo destas práticas patologizantes que não priorizam matriciamento, incentivo ao protagonismo do usuário em seu tratamento e o controle social, educação permanente e a efetiva utilização e funcionamento da RAPS.

    Em nosso entendimento, a psicologia não pode e nem deve pactuar com estas práticas de não-cuidado, inclusive porque é uma obrigação ética da profissão. Ao contrário, ela deve construir recursos junto ao usuário que incentivem, fortaleçam e deem visibilidade ao seu protagonismo no cuidado de si e reinserção social, bem como fomentar com os seus pares a discussão na prática e sobre práticas não manicomiais nos espaços da assistência em saúde mental.

     

  • Keywords
  • Psicologia, saúde mental, CAPS, prática de cuidado, patologização
  • Subject Area
  • EIXO 2 – Trabalho
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