A gravidez e a maternidade de meninas menores de 14 anos evidenciam uma questão grave de saúde pública, por decorrerem sempre de um estupro presumido. As construções sobre a saúde e o cuidado e as compreensões sobre a infância e a adolescência se modificaram ao longo do tempo, assim como os debates sobre violência sexual e consentimento. Por isso, para ampliar o entendimento dos profissionais sobre a situação e qualificar a assistência, compreende-se a relevância de estudos que identifiquem percepções das mulheres que tiveram filhos antes dos 14 anos sobre a gravidez e a maternidade. O objetivo deste estudo foi compreender como mulheres que atualmente têm mais de 18 anos, percebem a gravidez e a maternidade vividas antes dos 14 anos. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (Parecer n. 5679264) e se caracteriza como uma pesquisa qualitativa. Ela foi desenvolvida como um Trabalho de Conclusão de Residência, defendida em janeiro de 2024. As autoras desse resumo são a orientadora, pesquisadora principal e estudante de graduação que desenvolvou iniciaçlão científica vinculada à pesquisa. As participantes foram dez mulheres, maiores de 18 anos que passaram por uma ou mais gestações e tiveram seus filhos antes dos 14 anos. Foram entrevistadas dez mulheres e o critério de saturação foi utilizado para a cessação da produção de dados. As entrevistas foram realizadas entre julho e dezembro de 2022. Os dados foram analisados por meio da análise de conteúdo temático. As participantes foram mulheres entre 28 e 72 anos, que engravidaram entre os anos de 1964 e 2007. Atualmente, nenhuma delas está casada com o genitor dos filhos que tiveram antes dos 14 anos. A partir da análise de dados, foi possível identificar três categorias: 1) “Como se eu fosse uma mulher” – o contexto da gravidez; 2) “Parabéns, é uma menina” – os (des)cuidados em saúde; e 3) “Muito pequena para dar conta” - repercussões das experiências. Inicialmente, observa-se que o contexto era de obrigatoriedade do casamento após a descoberta da gravidez. Nas décadas seguintes, a rede de apoio auxiliou no cuidado com a gravidez e maternidade. Com o avanço do feminismo a partir de 1980, as meninas-mães começam a identificar a gravidez como consequência de uma violência sexual. O acesso aos serviços de saúde era restrito e com o surgimento do SUS, o acesso a cuidados foi ampliado e priorizado. Porém, as especificidades da gravidez de meninas ainda não são cuidadas de modo integral, além de informações sobre prevenção, possibilidade de interrupção da gestação, vias de parto e amamentação não serem fornecidas. As experiências de violências repercutiram na maternidade, na relação consigo mesma, nas possibilidades de estudo e trabalho, o que gerou consequências a curto e longo prazo. Dessa forma, é necessário debates acerca da violência contra crianças e adolescentes e sobre a maternidade nesse período, a fim de ofertar proteção, cuidado e o desenvolvimento integral a essa população.