Introdução: A Atenção Primária à Saúde (APS), por meio de práticas baseadas na territorialização e no estabelecimento de vínculos entre os usuários e a equipe, representa um dos aspectos fundamentais para a produção cuidado em saúde, tal qual para assegurar a integralidade e o acompanhamento permanente das famílias. Nesse sentido, sabendo-se que a pandemia ocasionada pelo novo coronavírus entre os anos de 2020 e 2023 resultou no isolamento social e no afastamento entre a equipe de saúde e os usuários devido a alta taxa de contágio, entende-se que a existência do vínculo característico da atuação no contexto da APS foi essencial para o alcance da resolutividade do cuidado. A resolutividade diz respeito à capacidade de reconhecer os riscos, necessidades e demandas de saúde utilizando diversas abordagens de cuidado para mitigá-las, com o objetivo de promover, prevenir e restaurar as condições de saúde reveladas. Além disso, também constroem conexões significativas, realiza-se intervenções eficazes e são oferecidos os encaminhamentos adequados de acordo com as necessidades dos demandantes. Levando em consideração que a resolutividade é um princípio organizativo do SUS, o vínculo, enquanto uma tecnologia leve do cuidado, foi recurso estratégico potente para o alcance de tal preceito durante a pandemia de Covid-19. Segundo a Política Nacional de Atenção Básica (PNAB), o vínculo é caracterizado como um elemento orientador das práticas em saúde, tendo em vista que trabalha diretamente com as relações socioafetivas no processo de cuidado entre os profissionais de saúde, os Agentes Comunitários de Saúde (ACS) e a comunidade atendida. Além disso, também estrutura a co-participação na atenção à saúde dos usuários, promovendo a corresponsabilização do cuidado. Durante o contexto pandêmico ocasionado pela COVID-19, e contemplando especialmente a resolutividade do cuidado, o vínculo foi uma ferramenta fundamental para a continuidade dos processos de trabalho no contexto dos pontos de atenção da APS e contribuiu para potencializar as intervenções territorializadas em saúde. Objetivo: Analisar os efeitos dos vínculos produzidos para a resolutividade do cuidado no contexto da pandemia de Covid-19 no âmbito da APS. Metodologia: Trata-se de um estudo de abordagem qualitativa e de natureza exploratória. O campo de estudo foi a macrorregião de Saúde Centro-Leste do Estado da Bahia. Das quatro microrregiões de saúde que compõem esta macrorregião, foram selecionados os municípios que estivessem com 100% de cobertura da Estratégia Saúde da Família (ESF) e apresentassem os maiores números de casos notificados para a Covid-19. Após a aplicação dos critérios foram escolhidas seis cidades. O número de participantes foi definido por saturação das respostas totalizando 11 pessoas dentre as quais estavam: secretários municipais de saúde, diretores e coordenadores da APS que atuassem no cargo há um período superior a seis meses. O instrumento utilizado foi entrevista semi estruturada conduzida sob o formato virtual, em local sigiloso, mediante a anuência concedida pela concordância com o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Salienta-se que a etapa de entrevistas foi iniciada somente após a aprovação do projeto de pesquisa pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Estadual de Feira de Santana. Para análise, guiou-se pela Análise Temática, e inicialmente com o intuito de organizar os dados, as entrevistas que foram gravadas em um IPhone 11 foram transcritas de forma literal associada a leitura flutuante e exaustiva do material na busca de sentidos e significados. Por conseguinte, reuniu os sentidos em núcleos e formou uma categoria empírica. Após este momento, houve o tratamento dos resultados em um instrumento denominado trilha interpretativa feito em uma planilha que tem como finalidade a interpretação dos dados mediante a construção de uma síntese horizontal em que observou as convergências, divergências, diferenças e complementaridades das falas dos entrevistados, em seguida confrontava as informações produzidas, com o referencial teórico da temática existente. Este estudo foi realizado conforme as normas éticas de pesquisa com seres humanos, com base nas Resoluções nº 466 de 2012, nº 510 de 2016 e na Carta Circular 001/2021. Resultados e Discussões: Na APS, o vínculo se configura como elemento decisivo nas práticas cotidianas em saúde, sendo que a territorialização e o elo com a comunidade de forma abrangente fazem parte dessa estratégia para alcançar a população adscrita. O vínculo pode contribuir para potencializar as intervenções na APS, por meio do conhecimento amplo do território, da busca ativa de informações, do contato com as famílias, da escuta qualificada e da legitimação de suas vivências. Sem a vinculação entre profissionais e usuários, o trabalho não é efetivado, uma vez que dificulta a possibilidade de conexões potentes das usuárias e usuários acompanhados pelos serviços, o que se torna um obstáculo para o monitoramento das famílias. Ademais, o vínculo possibilita a participação dos sujeitos na construção das estratégias do cuidado em saúde que estabeleça um protagonismo e autonomia cidadã. No contexto de pandemia de Covid-19, a existência do vínculo foi essencial para a efetivação do trabalho, visto que durante o período de emergência sanitária, sem os conhecimentos precisos acerca do vírus que circulava e da doença que se alastrava. Destaca-se como parte da estratégia dos gestores para o enfrentamento do vírus, o estabelecimento de vínculos entre a unidade de saúde e o território, assim como o protagonismo do ACS enquanto dispositivo para a continuidade do cuidado e acompanhamento das famílias cadastradas. Os ACS operam sob a lógica de apresentar e incentivar a participação da comunidade nas políticas públicas, com ações práticas de saúde e por meio das visitas domiciliares permanentes ao fornecer orientações às famílias sobre a utilização apropriada dos serviços de saúde, bem como pelo monitoramento das condições de vida dos usuários. O contato direto dos ACS com a comunidade é o diferencial para a resolutividade uma vez que incita o compromisso, estabelecendo essa relação cotidiana com as famílias e promovendo o encontro de saberes técnicos e populares, impulsionando a co-participação estratégica. O acolhimento é uma ferramenta que pode ser utilizada para fortalecer o vínculo, bem como pode ser uma técnica para superar o modelo de atenção à saúde curativista e fragmentado. Apesar do vínculo não ser uma conquista imediata, tendo em vista que pode levar um tempo para ser estabelecido, quando este é consolidado, impele numa melhor relação entre profissionais-usuários e compartilhamento de saberes, bem como melhores resultados em busca da resolutividade. Sendo este aspecto, portanto, uma estratégia aliada da equipe de saúde da família durante a pandemia. Conclusão: Compreender o vínculo como uma ferramenta fundamental para uma oferta abrangente e completa do cuidado, visando atingir a integralidade, é um elemento que contribui significativamente para o fluxo de trabalho e, por conseguinte, para a eficácia no alcance da resolutividade tanto no contexto pandêmico quanto para além dele. Assim, trata-se de um recurso que viabiliza a elaboração de cuidados personalizados, promove a autonomia, incentiva o protagonismo do usuário, compreende a realidade social e emocional de cada indivíduo e facilita a abordagem das necessidades específicas de cada cidadão.