A disciplina intitulada “Psicologia nas emergências e desastres” apresentada no Doutorado de Psicologia da Universidade Federal do Pará no ano de 2023, propôs uma reflexão sobre o campo de saúde mental coletiva e os processos de cuidado produzidos na rede frente a emergências e desastres. Neste sentido, foi abordado aspectos éticos e normativos da Psicologia como ciência e profissão para potencializar o debate em sala de aula.
Um ponto do debate que foi motivador para a produção deste trabalho, foi o relato de uma aluna que relatou sobre psicólogas do serviço público que atuavam com ela e apresentavam receio, medo e/ou insegurança em realizar atendimentos diante de emergências e desastres. Portanto, as perguntas norteadoras deste trabalho são: quais são os compromissos éticos-políticos dos psicólogos(as) frente as emergências e desastres? Quais os modos de subjetivação engendrados nesse contexto a ponto de causar receio em realizar o atendimento? Um profissional de psicologia pode negar atendimento sendo um trabalhador do serviço público ou privado? Será que essa negativa se deve a um déficit de currículo/formação?
Para refletir sobre as problematizações acima utilizaremos as referências bibliográficas trabalhadas na disciplina, assim como, os relatos dos professores convidados. As aulas foram realizadas de forma conjunta, com a contribuição de professores e pesquisadores com vasta experiência no campo da atuação do Psicólogo em emergências e desastres. A profª Sandra Fagundes (FIOCRUZ) retratou a dimensão do conceito da saúde mental coletiva e abordou sua experiência na gestão de crise; O profº Márcio Belloc (UFPA) apresentou sua experiência no caso da Boate Kiss; a profª Ana Cecília (FIOCRIZ) apontou sobre estratificação e classificação de risco em saúde mental; o Profº Rafael Wolsky(UFRGS) exibiu o acompanhamento psicossocial do tribunal de júri do caso da boate Kiss; A Psicóloga Débora Noal (FIOCRUZ) expôs suas vivências em campo usando como referência seu livro “Diário de uma psicóloga sem fronteira”.
Na medida em que os professores problematizavam as situações diversas nesse campo, ficou evidente a importância da atuação dos psicólogos(as) e não apenas dos profissionais que historicamente atuam em situação de risco diante das catástrofes cotidianas. Este artigo abordará os seguintes pontos: emergência e desastre sob a ótica do código de ética, onde entende-se por código de ética do profissional-as normativas que são criadas por um conjunto de técnicos de uma determinada profissão tendo como objetivo direcionar a conduta profissional em seu local de trabalho e por toda esfera da vida desse profissional; A psicologia na história de emergências e desastres, neste ponto será apresentado um histórico sobre o cuidado psicológico e a fundamental implicação do profissional de psicologia no contexto de emergência e desastre que está ancorada no trabalho interdisciplinar no contexto das políticas públicas; A formação em psicologia em emergência e desastre, este tópico debate sobre documentos oficiais que regulam a profissão nesse contexto, a Psicologia é regulada por uma série de documentos do Ministério da Educação e Cultura, do Sistema Conselhos de Psicologia, das Associações da Psicologia, do Conselho Nacional de Saúde etc. Assim, é possível perceber que as práticas de ensino trazem uma multiplicidade de forças que são singulares e heterogêneas, estas forças devem ser interrogadas em um processo de estudo que demanda atenção e rigor, procedimentos metodológicos cuidadosos e com princípios éticos a zelar; Defesa Civil e Psicologia, será apresentado um breve histórico desta relação no estado do Pará. a defesa civil do estado do Paqrá não tem psicólogo em sua composição. Porém, conta com a equipe de psicólogos do corpo de bombeiro. No site da corporação não é possível visualizar a quantidade de psicólogos, porém mostra algumas ações importantes: cursos de abordagem técnica a tentativa de suicídio; ações no estado frente a pandemia do coronavírus proveniente do plano de contingência nacional; ações diante das enchentes oriundas do verão amazônico dentre outros. No entanto, não foi encontrado quais os profissionais que executam as ações. A defesa civil é o órgão governamental que visa à segurança da população e proteção de todos; cabe ao poder executivo municipal garantir as condições para se prevenir e resolver situações diante de desastre. A defesa civil articula um conjunto de ações de prevenção e de socorro, assistenciais e reconstrutivas, destinadas a evitar ou minimizar os desastres, preservar a integridade física e moral da comunidade, bem como restabelecer o cotidiano social. O debate da inserção da psicologia nas emergências e desastres vem se intensificando ao longo dos últimos 15 anos por várias entidades (sistema conselho, associações, controle social, movimentos sociais). Falta mais transparência das ações, mais informações sobre como a população deve direcionar sua conduta em caso de tragédias, contratar mais profissionais, falta visibilidade e intersetorialidade.
O receio dos psicólogos(as) por não se considerar totalmente pronto para atender uma solicitação decorrente de situações de emergências e desastres é completamente compreensível, porém, devemos ponderar que a psicologia tem um compromisso social em cuidar das pessoas e não podemos nos eximir dessa responsabilidade por negligência ou capricho.
A formação generalista proposta e imposta desde 2011 para o curso de psicologia, embora não tenha um modelo único de estratégia que garanta o preparo dos alunos para qualquer demanda, sempre que convocados, constata-se que a DCN elucida de modo detalhado o que espera de uma boa formação. O código de ética do profissional também apresenta em seu texto no que se refere a atuação do psicólogo nas emergências e desastres a responsabilidade em dispor o serviço quando convocado, vimos que os princípios fundamentais são pautados nos direitos humanos. Logo, recusar a prestar atendimento aos sobreviventes, familiares e amigos expostos a tragédia não é recomendável.
Por fim, mostramos que a psicologia não compõe a equipe da defesa civil no Estado do Pará, logo, não atua nos planejamentos, gestões e execuções que articulam as estratégias que abrangem as ações de prevenção, mitigação, preparação, resposta e recuperação voltadas à proteção, seja ela de prevenção ou proteção. Manter a psicologia afastada dessa construção, fluxo, manejo, cuidado pode ser um fator significativo para o temor, insegurança/receio do psicólogo(a) em sua atuação no contexto das emergências e desastres. Espera-se que possamos avançar neste debate, para que haja o reconhecimento da importância do Psicólogo(a) e ele(a) possa ocupar esse espaço de extrema relevância.