Apresentação: O público idoso vem ganhando destaque em pesquisas acadêmicas de vários setores, isto decorre do fato de existir uma tendência de crescimento para essa população já destacada pelos últimos censos brasileiros. A saúde mental é sem dúvida uma das questões a serem consideradas ao se pensar nessa transformação da estrutura etária, ainda mais em um país com altos índices de desigualdade social, porém, quando se trata da saúde dos idosos, a preocupação com direcionamentos a especialistas se sobrepõe àquilo que diz respeito às vivências dos idosos em seu processo de envelhecimento. Neste sentido, o presente estudo relata uma experiência, ainda em andamento, no Centro de Referência da Assistência Social – CRAS com um grupo de idosas, no qual se buscou trabalhar o autocuidado e a saúde mental, considerando as vivências compartilhadas das idosas em seu contexto social e comunitário. Desenvolvimento: O relato de experiência com o grupo de idosas é um estudo qualitativo de caráter descritivo que foi elaborado a partir das vivências de sete acadêmicos de Psicologia e da professora supervisora, referentes às ações desenvolvidas pelo Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos, previsto pela Proteção Social Básica no CRAS do bairro do Guamá em Belém-PA. As atividades realizadas estão vinculadas ao Projeto de Extensão “Semear: a clínica psicológica como dispositivo de empoderamento”, e são amparadas pelos ideários da Terapia Comunitária, Terapia Expressiva e facilitação de grupos calcada na Abordagem Centrada na Pessoa. Tal corolário teórico se justifica porque localiza nas relações estabelecidas no grupo a potência ao desenvolvimento de estratégias para lidar com os acontecimentos da vida, o que versa sobre o objetivo central deste projeto que é a facilitação de expressões de autocuidado por meio da trajetória de vida, visando promover o desenvolvimento de auto e hetero suporte no público-alvo das intervenções. Já no que diz respeito à estrutura dos encontros, cita-se que seu planejamento é prévio e realizado semanalmente. Contudo, isso não significa rigidez, de maneira que se admite uma flexibilidade para contemplar as demandas emergentes no grupo. Está prevista a realização de oito encontros (de abril a junho de 2024), com duração de 2 horas e 30 minutos, nos quais se propõe a discussão de aspectos relacionados ao autocuidado e à trajetória de vida, além do uso de recursos criativos (a música, a pintura, a confecção, o artesanato, a dança, dentre outros) para facilitar a expressão e acesso à dimensão vivencial dos participantes. Por fim, cita-se que os encontros serão registrados por meio de relato grupal e em diários de campo escritos pelos estagiários do projeto e, a cada encontro, há um objetivo a ser alcançado, sendo que nos dois primeiros buscou-se construir a vinculação dos estagiários com o grupo. Resultados: Os encontros do grupo tiveram início no dia onze de abril, tendo ocorrido dois encontros até o momento da publicação deste estudo, e que permanecem em andamento. A partir da análise do que foi relatado nos grupos de encontros, foram mostradas as vivências do processo de envelhecimento das idosas, suas percepções de autocuidado e a significação de bem-estar e saúde mental. Durante os primeiros encontros, percebeu-se uma forte vinculação e aproximação entre as idosas componentes do grupo, manifestados pela preocupação umas com as outras, o que permite concluir que um dos objetivos dos encontros, que é o estabelecimento de vínculos, foi alcançado. Espera-se que nos próximos encontros estes vínculos se fortaleçam a partir do compartilhamento das experiências que estão por vir. As primeiras atividades voltaram-se para a Focalização, um recurso sistematizado por Eugene Gendlin, no qual podemos acessar o conjunto de sensações imediatas que emergem corporal e concretamente na experiência vivida. Em seguida, um debate sobre o que foi experienciado ocorreu, resultando na construção de uma “cápsula do tempo” com metas e objetivos de vida. Inicialmente, as idosas apresentaram dúvidas e incompreensão sobre o que deveria ser feito, mas após novas explicações, as incertezas foram superadas. Elas demonstraram apropriação do sentido da experiência, ampliação da consciência de si e do grupo. Ademais, espera-se que, durante os encontros, elas possam ampliar suas percepções corporais, emocionais, psicológicas e comunicacionais, tornando-se capazes de associar isto ao autocuidado, sendo este o segundo objetivo a ser alcançado nos encontros. Uma das preocupações emergentes na velhice é a de como passar o tempo de maneira satisfatória, tanto no nível individual como no social. Em consonância a esta ideia, a percepção de autocuidado relatada pelas idosas volta-se para a realização de atividades consideradas prazerosas, sendo as práticas mais citadas: tempo dedicado a hobbies pessoais, viagens há muito tempo desejadas, afazeres domésticos, ouvir músicas e a dedicação à religião. Em contrapartida, algumas idosas revelaram não terem tempo para esta prática, devido à rotina extensa de trabalho, porém sentem o desejo de fazê-lo, sendo esta uma das metas estabelecidas entre o grupo, a serem cumpridas em seu término. Desse modo, as narrativas das idosas demonstram o quanto o envolvimento em atividades que geram sentimentos positivos para as mesmas é importante para a manutenção do bem-estar físico e psicológico, no qual o envelhecimento torna-se uma experiência criativa e saudável, desde que sejam oferecidas condições para que o indivíduo, na relação com grupo, mantenha seus projetos de existência em constante atualização. Associado a isso, diversas idosas relataram manterem-se ativas, tanto no que se refere à prática de atividades físicas, quanto a participação em oficinas de artesanato e teatro desenvolvidas dentro do CRAS, com o próprio grupo desempenhando um papel importante em suas rotinas, com destaque para as intervenções de aquecimento realizadas no início de cada encontro. A partir disso, nota-se um rompimento do estigma que associa a velhice ao declínio e à doença, visto que as idosas do grupo se apresentam como indivíduos ativos e autônomos. Quanto às percepções de saúde mental, os fatores relacionados à manutenção do bem estar psicológico entre as idosas foram a socialização com familiares e amigos, a dedicação à religião pessoal, e os encontros do próprio grupo, associados ao bem-estar e à felicidade. Relacionado a isso, quando perguntadas sobre suas metas para o futuro, a grande maioria apresentou o desejo de construir uma casa longe das tribulações da cidade, revelando a busca por uma vida tranquila e calma. Para elas, a velhice deve ser vivenciada como um período de descanso, no qual possam realizar sonhos e objetivos adiados pelo tempo, como uma recompensa após anos dedicados à criação dos filhos ou ao trabalho, no qual poderão, finalmente, dedicar-se a si mesmas. Considerações Finais: Ratifica-se, portanto, a relevância deste relato para uma compreensão valorativa a respeito das experiências do envelhecimento sob um prisma que restitui o protagonismo do viver e do significar sobre o viver para a pessoa idosa. Os resultados do grupo de idosas do CRAS Guamá demonstram consistente vínculo relacional entre suas participantes, numa apropriação conjunta da experiência do envelhecimento, que propiciou, até este momento, narrativas de vida que apreciam a convivência familiar e social, a possibilidade de vivências inéditas e a realização de outros sonhos. Os recursos criativos, utilizados nas atividades com o grupo, oportunizaram a expressão destes significados, o que abarca o objetivo central do projeto de facilitar a expressão do autocuidado, numa perspectiva que entende tal conceito como intrinsecamente ligado ao apropriar e ao acolher de cada vivência por cada pessoa.