Desafios para Gestão da Educação e Trabalho na Promoção de Equidade de Gênero e Étnico-Racial na FIOCRUZ

  • Author
  • VALÉRIA CRISTINA GOMES DE CASTRO
  • Co-authors
  • Luciana Pereira Lindenmeyer
  • Abstract
  •  

    Apresentação: 

    Este trabalho apresenta resultados da experiência de um levantamento inicial sobre questões de gênero e étnico-racial em unidades e escritórios da Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), promovido pelo Comitê Pró-Equidade de Gênero e Étnico-Racial da instituição em 2023. Este Comitê existe desde 2009, sendo composto por representantes das unidades/escritórios da Fiocruz em diferentes estados da federação. São indicados pelas direções das unidades, sendo sua composição atualizada a cada dois anos. Este trabalho apresenta o resultado parcial deste levantamento, com dados referentes a ensino e pesquisa de unidades e escritórios em nível nacional. As autoras são duas servidoras públicas federais, mulheres, negras, de meia idade e integrantes do Comitê no período do levantamento, sendo uma da unidade da Fiocruz no Ceará e outra do Rio de Janeiro.

    As condições de saúde estão relacionadas a determinantes sociais que impactam o acesso ao trabalho das populações negras, indígenas e LGBTQIA+, o que exige esforços coletivos e institucionais capazes de priorizar essas temáticas, a fim de alcançar justiça social nas instituições públicas. Os dados apresentados evidenciam alguns desafios no desenvolvimento de políticas equitativas em espaços institucionais.

    Desenvolvimento do Trabalho: 

    Como primeiro movimento após a implementação da Política Étnico-racial e de Gênero da Fiocruz, foi realizado levantamento preliminar que buscou verificar a situação em eixos da política – educação/pesquisa, gestão do trabalho, serviços e comunicação/informação. Foram disponibilizados formulários online, que contiveram respostas de representantes de 31 unidades e escritórios. A partir dessas respostas, as informações foram sistematizadas por participantes do Comitê. O levantamento abrangeu questões objetivas, respondidas a partir de dados secundários sobre o desenvolvimento de ações em equidade de gênero e étnico-racial, sendo enfocado neste trabalho a análise sobre as questões relacionadas a educação e pesquisa.

    Resultados:

    Em 51,8% das unidades, foi relatado que já ocorreram ações formativas (presenciais ou online) sobre equidade étnico-racial ou de gênero, enquanto 48,4% responderam que não. Em relação ao fomento para implementação para programas de enfrentamento ao racismo e às discriminações relacionadas à equidade de gênero e sexualidades para fortalecimento de diretrizes pela equidade, 54,8% relataram que não ocorreu, enquanto 45,2% responderam que sim.

    Perguntados se na unidade/escritório existia algum programa interno de fomento à pesquisa, 64,5% responderam que sim e 35,5% responderam que não. Sendo que em 61,3% das respostas foi indicada a existência de iniciativas de pesquisa sobre desigualdades étnico-raciais, de gênero e sexualidade, racismo estrutural, violação de direitos dos povos indígenas, comunidades quilombolas e tradicionais, enquanto 38,7% responderam negativamente. Em relação a programas de ações afirmativas para a participação de pessoas negras e indígenas como pesquisadores, 38,7% responderam que sim e 61,3% responderam que não.

    Esses dados corroboram entre si, indicando que as pesquisas sobre equidade ocorrem em locais que já existe incentivo à pesquisa, no entanto, na maior parte das unidades ainda não há investimentos específicos neste campo. O menor percentual de respostas em relação à existência de ações afirmativas destinadas a pessoas negras e indígenas como pesquisadoras levanta a indagação sobre a valorização do protagonismo negro, indígena e diversidade de gênero na condução das pesquisas, mesmo quando os estudos se relacionam à equidade.

    Esses dados também são expressivos em relação aos processos seletivos para a pós-graduação, em que na maioria a lei de cotas é exclusivamente a forma de garantir o acesso para pessoas historicamente excluídas à pós-graduação. Foi perguntado se existiriam outras iniciativas de ampliação desse acesso, com 32,3% respondendo que sim e 67,7% respondendo que não há outras formas de garantia de acesso. No entanto, 67,7% afirmaram que já está em vigência a execução de procedimentos e etapas necessárias para implementação de ações afirmativas para o programa de pós-doc.

    Os dados demonstram que estão em curso ações que apoiam a permanência de estudantes cotistas na instituição, possivelmente, efeito da recente política institucional de apoio ao estudante na FIOCRUZ de 2022. Dessas medidas, foi evidenciado que o apoio estudantil para permanência no curso é a ação mais frequente (38,7%), seguida do acompanhamento do andamento do curso com escuta e acolhimento (35,5%), acompanhamento e escuta coletiva (19,4%), e prioridade para apoio a congressos e outros eventos (12,9%). Porém, a maioria (41,9%) respondeu que inexiste outras formas de apoio além do ingresso por cotas.

    Perguntou-se sobre a utilização de bases epistêmicas não eurocêntricas em currículos e referências bibliográficas nas unidades e escritórios. Em 51,6% das respostas, a resposta foi sim, enquanto 48,4% responderam que não. Em relação à incorporação de novos quadros para o ensino (Pós-doc, pesquisadores visitantes, docentes convidados, entre outros) para discussões de questões de equidade de gênero e étnico-racial, 86,2% responderam que não existe e somente 13,8% responderam que sim. Mais de 50% do quadro docente da instituição não discute questões étnico-raciais e de gênero.

    Sobre o enfrentamento ao racismo institucional e assédio moral no ambiente acadêmico e de pesquisa, os dados apontam que em 58,1% das respostas observou-se que não há estratégias específicas de combate ao problema e 41,9% responderam positivamente sobre a existência de estratégias específicas.

    Considerações Finais:

     

    Conclui-se que se encontra em desenvolvimento as ações institucionais na FIOCRUZ para o enfrentamento às iniquidades de gênero e étnico-racial no serviço público. Porém, muitos desafios ainda precisam ser enfrentados, seja no ensino, na pesquisa ou na gestão da educação e trabalho. Os dados aqui apresentados demonstram que, embora a instituição desenvolva atividades voltadas à equidade em saúde, ainda há necessidade de medidas que promovam a equidade de acesso aos seus quadros docentes e de pesquisadores por pessoas de origem populacional historicamente excluídas do protagonismo político institucional e acadêmico.

    Ressalta-se que a coleta de dados deste levantamento carece de maior aprofundamento, nos quais a limitação em respostas objetivas dificultou o aprofundamento da análise, sobretudo, em aspectos relativos ao enfrentamento ao racismo institucional e às bases epistemológicas no ensino e pesquisa. Porém, este estudo demonstra um esforço metodológico, por meio de um levantamento exploratório, que evidencia a necessidade de reflexões acerca dessa temática na Fiocruz.

    Os resultados apresentados ressaltam a necessidade de estratégias institucionais capazes de fomentar ações condizentes com os princípios da Política de Equidade Étnico-Racial e de Gênero da Fiocruz (2023). Estas ações devem ser dinâmicas e promotoras de letramento sobre questões raciais negras e indígenas, das mulheres, de diversidade de gênero e de classe social em perspectiva interseccional, buscando contribuir para o enfrentamento às violências e o acesso a direitos com questões críticas e atualizadas, em interação com a sociedade para além de espaços de representação institucional. Ressalta-se a necessidade do protagonismo negro, indígena e da diversidade de gênero em pesquisas e ensino sobre temas relacionados à saúde.

    Este levantamento, embora exploratório, sugere que são utilizadas bases epistêmicas diversas para ensino e pesquisa na FIOCRUZ, destinadas a trabalhadores do SUS e ao público em geral, o que reverbera na própria instituição. Porém, ainda há muito a ser feito para a equidade de acesso dessas populações na composição dos quadros de trabalhadores no ensino e na pesquisa.

    A criação do Comitê Pró-Equidade e de uma assessoria da Presidência - a Coordenação de Equidade, Diversidade, Inclusão e Políticas Afirmativas (CEDIPA) em 2023 - vem provocando avanços institucionais neste sentido. Porém, evidencia-se a necessidade de mais ações institucionais que colaborem para a superação de mecanismos opressivos que se reproduzem há séculos na sociedade e que não são diferentes na Fiocruz.

     

     

  • Keywords
  • Educação; Trabalho; Equidade; Racismo Institucional
  • Subject Area
  • EIXO 3 – Gestão
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