O Laboratório de Prática Sociais da Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC), em parceria com a 6° Coordenadoria Regional de Educação, orienta estudantes do curso de Psicologia para atuarem em escolas públicas estaduais nos estágios curriculares, em atividades de Psicologia Escolar e Educacional (PEE). A partir disso, este resumo trata de apresentar um relato de experiência de estudante da Graduação em Psicologia da UNISC, que realizou sua prática em uma escola localizada na periferia de uma cidade do interior do Rio Grande do Sul. A temática abordada foi o adoecimento mental de educadores e o papel do PEE neste contexto, em um trabalho de análise institucional envolvendo educação em saúde. Utilizou-se a ferramenta do Diário de Campo, com intuito de registrar as atividades realizadas pelo estagiário, juntamente com suas implicações, análises e interpretações das dinâmicas do espaço escolar. Seguindo o modelo de Análise Institucional Padrão de Baremblitt, como campo de análise, foi compreendida a educação e a saúde mental dos educadores, e a prática de psicologia escolar. Como campo de intervenção, compreendeu-se a referida escola, em um contexto comunitário e social, permeado de vulnerabilidades. A demanda institucional emergente, a partir de análise prévia do espaço e diálogos com a gestão escolar, foi reconhecida como sendo o adoecimento mental dos educadores da escola. Esses apresentaram, durante a prática, sentimentos de impotência e desesperança com acentuados sintomas depressivos e ansiosos, sustentando intenso sofrimento psíquico. Com frequência, problemas envolvendo a vida dos estudantes e vulnerabilidades sociais presentes no contexto social destes, trouxeram sofrimento para os profissionais, além de questões relacionadas à precarização e à desvalorização do trabalho que realizam. No cotidiano escolar, foi observada a ausência de momentos de pausa, reflexão e diálogo, no trabalho dos educadores, que se opera de forma cada vez mais acelerada e extenuante. Neste contexto, duas propostas de intervenção foram estabelecidas: 1) educação em saúde com objetivo de fomentar movimentos de autoanálise e autogestão, que são o “objetivo último” do processo de análise institucional, visando que os próprios agentes escolares busquem alternativas para cuidados em saúde mental; e 2) trabalho de mediação e facilitação de acesso a serviços de saúde no território, através de orientações e encaminhamentos. As intervenções de educação em saúde, em sua maioria, ocorreram a partir de escutas e acolhimentos na “sala dos educadores”, local onde os professores e funcionários se reúnem nos intervalos, para almoçar, descansar e conversar. As trocas nesse espaço evidenciaram a imprescindibilidade desses momentos, oportunizando uma ação catártica, nas quais é possível desabafar, lamentar, exteriorizar e legitimar, pela escuta do outro, as aflições vivenciadas na escola. O estagiário circulou neste lugar pois esse permitiu acessar os profissionais e entender sofrimentos cotidianos, debatendo questões relativas aos cuidados em saúde. Nos diálogos estabelecidos, foi recorrente o questionamento sobre como funciona a psicoterapia e como acessá-la. Durante as discussões, foi interessante observar que outros educadores que fazem psicoterapia, interrompiam as conversas, e passavam a falar de si e de suas relações com o tratamento. Abordavam questões do quanto esse ato de autocuidado os ajuda e a importância que assume em suas vidas, estimulando os colegas a fazerem. Ainda, realizou-se um trabalho constante de estímulo e incentivo na busca deste tipo de cuidado. Orientações quanto ao funcionamento dos serviços disponíveis na rede de saúde foram transmitidas sempre que possível. Além disso, outras ações de promoção de saúde foram estimuladas em conjunto com os professores durante os diálogos, refletia-se alternativas sobre hábitos e cuidados que promoviam bem-estar e para a busca de uma vida com mais qualidade. Enfatiza-se aqui a importância deste espaço de diálogo, que provavelmente passa despercebida pelas pessoas que o ocupam. Quando ofertado aos professores momentos de rodas de conversa, poucos demonstraram interesse em participar, dada uma limitação de tempo. Não há como reuní-los durante o expediente, e é preciso convocá-los fora desse período. Estes revelam insatisfação sempre que um evento fora de horário acontece na escola, como no caso das reuniões pedagógicas, e quando estas acontecem, desejam que acabe logo. Não há um espaço para os professores conversarem, além, é claro, da referida sala dos educadores, espaço que obrigatoriamente eles acabam ocupando. O acolhimento das angústias e sofrimentos dos agentes educacionais da escola, por parte do estagiário, auxiliou estes profissionais a amenizar suas dores. Mais de uma vez, após realizar “desabafos”, professores e funcionários agradeceram pela oportunidade de poder falar e se expressar, afirmando que se sentiram melhores após conversar. Nos acolhimentos, frente a discursos de impotência e frustração, o estagiário, além de escutar e acolher, buscava criar conjuntamente novas perspectivas. Duas professoras dos anos iniciais, entristecidas, falavam que seu trabalho é irrelevante, pois muitos de seus alunos, assim que se tornam adolescentes, abandonam a escola pelos mais diversos motivos e se “perdem na vida”. Após acolher suas lamentações, o estagiário estimulou uma nova perspectiva através da pergunta: E aqueles que não se “perderam”? Frente ao questionamento, as professoras se emocionam e concordam, passando a falar sobre aqueles alunos que acreditam ter ajudado. Uma terceira entrou no diálogo e disse que é importante mantermos essa perspectiva, por vezes ela também se abate com essas questões. O diálogo acabou envolvendo vários professores. Dois educadores, após acolhimento na escola em decorrência das interações na sala dos educadores, foram encaminhados para o Serviço Integrado de Saúde (SIS), clínica escola da UNISC, onde receberam atendimento de psicoterapia. Os profissionais expressaram gratidão pela ajuda no acesso aos serviços de saúde mental, durante o ano relataram o quanto o processo psicoterapêutico os auxiliou e vem auxiliando. Tratando de refletir quanto a esta experiência prática em formação acadêmica, desenvolvida no âmbito da Análise Institucional, é necessário esclarecer e apontar que esta intervenção acaba por produzir algo em nível de estabelecimento, ela é limitada e superficial ao se pensar um contexto mais amplo. Baremblitt explica que as bordas que delimitam uma instituição são borradas, elas não são limitadas a um espaço físico e extravasam suas próprias fronteiras. A educação e sua lógica de funcionamento vai além das paredes físicas da escola deste trabalho. Muito do sofrimento e adoecimento mental dos professores e funcionários, como eles frisaram em diversos diálogos e nos acolhimentos, está implicado em ações governamentais que vem causando um processo de sucateamento da educação pública. Os profissionais da educação sofrem com a desvalorização e a falta de reconhecimento de seu trabalho, que está cada vez mais difícil em um contexto social permeado de desigualdades sociais. Nesse contexto, como acadêmico e estagiário foi preciso lidar com frustrações ao compreender esses aspectos. Despendeu-se um esforço para evitar que o objetivo pretendido estagnasse diante de um discurso de impotência. Realçando a necessidade de um esforço maior diante de uma realidade que fragmenta e avassala as esperanças, buscou-se reforçar as potencialidades e possibilidades no espaço escolar, direcionando um olhar para aquilo que pode ser realizado. Assim, esse processo objetivou instigar os educadores a saírem da posição de impotência e desistência em relação a possíveis mudanças institucionais. Ainda, pôde envolver os agentes escolares, em movimentos de auto-análise e autogestão, suscitando e promovendo questionamentos, a partir de reflexões das práticas cotidianas.