O presente resumo consiste em um relato de experiência de práticas metodológicas de educação em saúde e promoção de cuidado em saúde mental, realizadas com adolescentes de duas escolas públicas do interior do Rio Grande do Sul. As referidas ações foram sistematizadas por dois estagiários, graduandos do curso de Psicologia da Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC), através do Laboratório de Práticas Sociais (LAPS). Por meio do LAPS, os estagiários realizam práticas no campo da Psicologia Escolar e Educacional, sendo este um importante articulador entre serviços de saúde, universidade e comunidade. As reflexões apresentadas foram construídas junto ao Grupo de Pesquisa sobre Adolescências (GRUPAD), o qual trabalha há 14 anos com promoção e educação em saúde na região. A partir da inserção no campo, da observação e escuta das demandas presentes nas duas escolas, totalizaram-se 14 encontros de rodas de conversa com os escolares. Compreendeu-se nesta ação que atividades coletivas seriam mais efetivas que intervenções individuais, tendo em vista que a escola é um espaço social e coletivo. Por meio dessa metodologia ativa, buscou-se produzir reflexões quanto aos processos de sofrimento psíquico e às concepções acerca da saúde mental no contexto das adolescências, além de disseminar informações quanto à funcionalidade e à disponibilidade dos serviços oferecidos pelas Políticas Públicas em Saúde no território. As rodas foram realizadas durante horário letivo escolar, somente com a presença dos estagiários, partindo da premissa que figuras que possam ser percebidas como autoritárias, podem produzir medo e receio nos estudantes, dificultando a expressão espontânea de suas opiniões e experiências de vida. As práticas se estruturaram com base em temáticas de interesse dos participantes, que foram analisadas mediante questionários previamente preenchidos por eles ou depositadas anonimamente em uma “caixa de perguntas”, utilizada antes do início das rodas de conversa. Os instrumentos foram elaborados de forma a possibilitar que os escolares selecionassem as temáticas consideradas relevantes para o debate, de forma a fazer valer suas expectativas, desejos e necessidades de diálogo. No total foram coletados 44 questionários, entregues e preenchidos de forma individual e anônima pelos estudantes de cinco turmas de Ensino Médio e uma turma do sexto ano. As duas temáticas que tiveram maior interesse dos estudantes, representando a maioria, foram sobre ansiedade (57%, n=25) e álcool e outras drogas (52%, n=23). A partir deste levantamento foram realizadas seis rodas de conversas: três sobre ansiedade e três sobre álcool e outras drogas. Outras temáticas foram solicitadas pelos adolescentes, como: depressão, relações sociais e bullying, as quais não foi possível, devido a limitação de tempo, desenvolver em outras rodas de conversa. Apesar disso, estes assuntos transversalizam muitos momentos e foram debatidos nos grupos. Já no método da caixa de perguntas, os estudantes escreveram, em um pedaço de papel, alguma dúvida ou questionamento sobre Saúde Mental, de modo aberto e abrangente, sem tópicos pré-estabelecidos. As perguntas anônimas foram depositadas na caixa e retiradas uma por vez para a discussão, sendo todos convidados a refletir e contribuir para a resposta. A atividade da caixa foi realizada com oito turmas de estudantes do sexto ao nono ano do ensino fundamental. Nas perguntas, grande parte dos escolares escreveu sobre como amenizar sintomas e lidar com crises de ansiedade. Questões como: “O que se pode fazer para diminuir a ansiedade?”, “O que afeta a saúde mental?, “Existe alguém que é saudável mentalmente?”, “Como agir quando a ansiedade provoca o nó na garganta?” e “Você toma remédio para saúde mental?” são exemplos. Assim como apontado pelos questionários, a ansiedade foi a temática mais demandada por eles, tendo sido contabilizadas 31 perguntas sobre esse tema. Por vezes, os questionamentos eram devolvidos aos escolares, para que pudessem pensar em alternativas frente às interrogações por eles levantadas. Em ambas as atividades de rodas de conversa realizadas, tanto as oriundas dos questionários, quanto das caixas de perguntas, de modo coletivo e instigados a pensar a própria saúde e a do outro, os estudantes refletiram sobre aquilo que consideravam importante. Foi possível observar uma necessidade por espaços de fala e escuta, que através do engajamento nas rodas, evidenciou o interesse por temáticas relacionadas à saúde mental. Quando os diálogos envolviam a temática da ansiedade, relataram como a vivenciam e quais estratégias usam para enfrentá-la. Dentre estas citaram os esportes, os jogos de computador, a dança, a música, o celular, as amizades e o uso de cigarro e álcool. Um estudante relatou que, quando está tendo crises, segura um bloco de gelo na mão para desviar o foco e aliviar os sintomas, ou dá socos e gritos em um travesseiro. Alguns estudantes relataram que no passado, devido a um sofrimento intenso, se autolesionaram para lidar com suas ansiedades e angústias. Em conjunto com os estudantes foram pensadas alternativas para lidar com essa problemática. Dialogou-se sobre evitar situações que acarretam em prejuízo para sua saúde (autolesão, cigarro, álcool, etc.), e foi incentivada a busca de alternativas saudáveis. Debateu-se com os jovens sobre os serviços de saúde mental no território e sobre o trabalho da(o) profissional psicóloga(o), de forma a promover conhecimento quanto a possibilidades de cuidado em saúde. A ansiedade se revelou de forma intensa no cotidiano dos jovens, sendo produtora de sofrimentos. Uma temática, entre tantas outras que se fizeram presentes, foi o uso de álcool e outras drogas. Nestes diálogos se produziram reflexões sobre os sofrimentos contemporâneos, atrelados às redes sociais e à sociedade de consumo. Os adolescentes foram convidados a pensar a problemática do uso das drogas não tão somente como dependência química, mas como emocional e afetiva, atrelada a determinantes sociais que podem ser produtores de sofrimentos. Nestes momentos foi conversado sobre o funcionamento dos serviços de saúde mental do território, também se debateu sobre o surgimento destes serviços no Brasil, retomando o movimento histórico da reforma psiquiátrica. Os estudantes se envolveram e participaram das atividades, compartilhando histórias de vida e suas experiências. As rodas de conversa proporcionaram oportunidades de acolhimento e abertura para momentos de troca e escuta. Nessa perspectiva, atuar no espaço escolar de forma a promover saúde e qualidade de vida, em interlocução com as políticas públicas e a garantia de direitos, estende a prática em Psicologia para além de uma concepção clínica individual. A ideia da intervenção individualizante, realizada em espaço escolar, deve ser desconstruída, oportunizando e fomentando movimentos que contemplem aspectos sociais e institucionais nas coletividades. Estes são pontos preconizados pelas notas técnicas do Conselho Federal em Psicologia (CFP), que orientam a prática em Psicologia Escolar e Educacional, sinalizando que esse fazer no espaço escolar, pressupõe um olhar voltado ao grupo, aos modos como se engendram as relações e os cuidados em saúde. Ressalta-se que o trabalho no coletivo abraça as questões sociais que se apresentam nas múltiplas realidades adolescentes, dialogando com a diversidade de saberes populares, sendo um potencializador das práticas em saúde com os escolares. Por fim, as implicações produzidas a partir das rodas de conversa, resultaram em reflexão e desconstrução de ideias deterministas acerca da saúde, transformando a formação dos estagiários envolvidos nessa prática.