Na literatura é viável encontrarmos estudos que compreendam a proposta da utilização de plantas medicinais como alternativa curativa, todavia, como não é plausível dissociar a boca do restante do corpo, é indispensável que busquemos associar as práticas integrativas e complementares no cotidiano dos tratamentos de saúde bucal, entre elas o uso de plantas medicinais e fitoterápicos. Para isso, é necessário conhecer as plantas medicinais que poderiam ser utilizadas nos cuidados em saúde bucal e dar mais visibilidade ao uso destas na odontologia e, principalmente, aos conhecimentos tradicionais, ambos, ainda pouco valorizados na academia como prática de cuidado em saúde.
Com isso, esse trabalho buscou identificar algumas plantas medicinais que poderiam ser indicadas para os cuidados em saúde bucal no Brasil a partir dos saberes tradicionais e dos documentos oficiais que versam sobre uso das plantas medicinais e fitoterápicos. Metodologicamente, apresenta-se como revisão narrativa na literatura, metodologia apropriada para realizar o “estado da arte” de uma temática, a partir de uma análise teórica, atrelada a interpretação e análise crítica-reflexiva do pesquisador. O que difere essa abordagem metodológica das demais revisões, é justamente a análise dos materiais com base também nas perspectivas do autor, bem como, a não delimitação rigorosa das demais revisões.
Sendo assim, partiu-se da pergunta de pesquisa “O que a literatura científica apresenta sobre os saberes tradicionais, quanto ao uso das plantas medicinais que poderiam ser utilizadas nos cuidados em saúde bucal?”. Foram realizadas buscas na SciELO, LILACS, Pubmed, Google acadêmico e sites governamentais como os Conselhos Federal e Regional de Odontologia, Ministério da Saúde, Anvisa, Secretaria Estadual da Saúde do Rio Grande do Sul e outros sítios de universidades que trabalham com esta temática.
A coleta dos dados ocorreu entre agosto e dezembro de 2023. A seleção dos textos para utilização na pesquisa foi realizada pela autora principal, buscando responder à pergunta de pesquisa, sem esgotar todos os textos encontrados. Destaca-se que o presente resumo, é um recorte de um trabalho final de graduação, sendo assim, não serão estratificados todos os achados.
Foram encontradas algumas plantas medicinais para fins de saúde bucal citadas por indígenas das comunidades Vista Alegre (VA) e Darora (DA), na Terra Indígena São Marcos (TISM), no estado de Roraima. Apresentam-se neste estudo 37 plantas medicinais que, de acordo com suas indicações, poderiam ser utilizadas para os cuidados em saúde bucal. Os termos utilizados localmente para identificar plantas medicinais variam conforme a região geográfica e as práticas culturais específicas. Algumas famílias agricultoras das comunidades rurais de Passo Liso, Rio Verde e Rio do Tigre, município de Laranjeiras, no estado do Paraná, listaram 23 plantas que poderiam ser utilizadas em saúde bucal. Cabe ressaltar que a maioria das plantas mencionadas pelas agricultoras são de origem europeia, evidenciando a influência desta cultura no uso das plantas.
Apesar da grande variedade de plantas medicinais que podem ser utilizadas na Odontologia, percebe-se pouca adesão de cirurgiões-dentistas na indicação de plantas medicinais para tratamento em saúde bucal. Ainda assim, nota-se com a busca na literatura que o uso de práticas alternativas de saúde pode ser fundamental para recuperação e manutenção da saúde. Sendo, importante, no entanto, que tais práticas sejam adotadas em consulta com profissionais de saúde bucal, para garantir uma abordagem integrada e segura para o bem-estar oral.
Possivelmente, a pequena adesão dos cirurgiões-dentistas na indicação de plantas medicinais pode estar associada com a falta ou pouca oportunidade de estudos durante a graduação desta temática, levando ao desconhecimento e insegurança dos profissionais para indicação e uso destas. Ainda visualiza-se uma formação em saúde, incluindo a Odontologia, centrada na medicina ocidental, tendo pouco espaço para a medicina tradicional. Além disso, há uma espécie de facilidade e de comodismo ao realizar ampla divulgação dos tratamentos/medicamentos convencionais que acabam por desestimular o uso e prescrição de plantas medicinais e fitoterápicos.
Também é necessário resgatar as limitações que a resolução feita pelo Conselho Federal de Odontologia, que regulamentam a prática da fitoterapia por cirurgiões-dentistas, requer uma carga horária extensa para o exercício da fitoterapia, o que poderia tornar quase inviável uma habilitação dentro do ensino de graduação, mesmo que esta prática estivesse nos currículos. Mas independente da resolução, as grades curriculares precisam ser mais flexíveis e incluir esta importante temática na formação em Odontologia e nos demais cursos da saúde.
Ainda assim, apesar deste estudo escolher apenas dois estudos principais para revisar, foi perceptível a quantidade pequena de trabalhos sobre plantas medicinais em revistas indexadas e quando adiciona o termo de busca dos saberes populares, esse número reduz ainda mais, e questiona-se que tal dado, conversa com os processos de colonialismo e do capitalismo, que desvaloriza os saberes populares e tradicionais. A academia é um ambiente que necessita abrir espaço para discussão e para o avanço em práticas do cuidado centrada nas pessoas, considerando o uso milenar das plantas medicinais, bem como incentivar as pesquisas relacionadas às plantas medicinais e fitoterápicas.
Por fim, o Memento Fitoterápico da Farmacopeia Brasileira e o Formulário de Fitoterápicos têm um papel importante na identificação, conhecimento e prescrição de diferentes plantas medicinais e fitoterápicos para auxiliar os profissionais da saúde que os indicam. Entretanto, a sua compreensão ainda é difícil e pouco fomentada, por isso, talvez, poucos profissionais optam por utilizá-los.