A experiência do parto e nascimento é singular na vida de uma mulher, marcada por uma série de transformações tanto físicas quanto psicológicas. Ao longo da história, testemunhamos diversas mudanças nesse processo. Inicialmente, era caracterizado por um ambiente familiar e pouco medicalizado, frequentemente conduzido por parteiras que aplicavam seu conhecimento empírico. Gradualmente, essa prática evoluiu para um modelo institucionalizado, predominantemente médico, com uma ampla gama de intervenções.
A crença de que o parto cirúrgico é mais seguro, muitas vezes baseada em percepções distorcidas de ausência de dor e supostos benefícios para a mãe e o bebê, tem influenciado significativamente as taxas de cesariana. Embora a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomende que essas cirurgias não ultrapassem os 15%, os números muitas vezes não refletem essa orientação. Nesse cenário, a luta pela humanização do parto, em prol da autonomia das mulheres, tem ganhado força ao longo dos anos, com o Ministério da Saúde desempenhando um papel crucial na regulamentação e normatização de práticas que visam melhorar a assistência obstétrica.
Com isso, nota-se as formas de enfrentamento à institucionalização dos partos e as intervenções desnecessárias em grandes escalas realizadas. Nesse sentido, volta-se com um olhar maior para as práticas de humanização e combate a violência obstétrica, que por sua vez se configura como qualquer ato ou intervenção sem aviso ou consentimento da mulher.
Reconhecendo a importância de uma assistência digna e de qualidade durante o período gravídico-puerperal, é fundamental considerar os sentimentos e valores das mulheres. A humanização da assistência vai além do ambiente físico confortável, abrangendo condutas e procedimentos que promovem um parto e nascimento saudáveis, respeitando o processo natural e as escolhas individuais das mulheres, enquanto evita intervenções desnecessárias.
Ademais, a equipe de saúde desempenha um papel significativo para a adequada implementação e execução das políticas públicas e da assistência humanizada. Para isso, é imprescindível que os profissionais de saúde estejam fundamentados em conhecimento científico e demonstrem comprometimento profissional. Por meio de iniciativas interdisciplinares, busca-se promover, proteger e restabelecer a saúde em diferentes níveis de atenção, de maneira abrangente e eficaz, levando em consideração as necessidades sociais, emocionais e culturais da população feminina.
Ainda, no município da pesquisa, durante o ano de 2022, foram registrados um total de 424 partos, desses 378 foram por via cirúrgica (cesariana), um número bastante expressivo e elevado, chegando aos 89,15%, sendo 5,94 vezes maior que o indicado pela OMS. Por isso, encontrar as justificativas dessa grande prevalência é um assunto iminente e revela extrema importância, visto que essa via de parto pode trazer danos consideráveis para a mãe e à criança.
Por isso, esse trabalho se trata de uma nota prévia sobre a escolha da via de parto de puérperas, tendo como objetivo identificar os motivos para a escolha da via de parto dessas, além de apontar fatores que interferem nessa decisão.
Refere-se a uma pesquisa exploratória descritiva, de natureza qualitativa. O estudo será desenvolvido no município de Palmeira das Missões, Rio Grande do Sul, o qual conta com 11 centros de saúde, uma clínica de Especialidades e o Hospital de Caridade de Palmeira das Missões (HCPM) o qual possui uma maternidade composta por 13 leitos. Participarão da pesquisa as puérperas e profissionais de saúde que atuam no atendimento ao parto, sendo o pré, intra e pós-parto, incluídos colaboradores da atenção básica de saúde e da atenção hospitalar.
A coleta de dados será por meio de entrevistas semiestruturadas onde as pesquisadoras utilizarão uma lista de questionamentos que conduzirão a entrevista. Os participantes serão escolhidos intencionalmente sendo as puérperas todas aquelas que possuem contato informatizado pela ESF, além da indicação dos profissionais de saúde que conduziram o acompanhamento pré-natal.
Aos profissionais que atuam na assistência de saúde da mulher e dos partos, será solicitado a participação em seus respectivos lugares de trabalho, sendo a entrevista dos colaboradores das ESFs em algum momento em que não estiverem em atendimento e dos colaboradores do hospital nos tempos de descanso. Por fim, todas as informações serão transcritas para facilitar a compreensão e junção de todos os resultados e dados obtidos.
Para análise dos dados será utilizado a Análise de Conteúdo de Bardin que consiste em organizar a coleta em torno de três polos cronológicos: a pré-análise; a análise do material; o tratamento dos resultados, a inferência e a interpretação. De forma resumida, a primeira parte se dará então pela gravação das entrevistas, a seguir tornaremos todos os dados transcritos, caracterizando informações e separando todas que se adequam ao tema de pesquisa, por fim, interpretar, estando atento à discurso simbólico e a coerência do objetivo principal.
O projeto foi submetido ao Comité de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Maria, seguindo as recomendações da Resolução nº 466/12 do Conselho Nacional de Saúde (CNS) e a Resolução 510/2016 as quais regulamentam as diretrizes e normas para a realização de pesquisas envolvendo seres humanos, a fim de assegurar os direitos e deveres dos participantes da pesquisa, da comunidade científica e do Estado.
Assim, espera-se identificar os fatores condicionantes a respeito da escolha da via de parto, além de investigar e compreender todo conhecimento das mulheres, sobre os benefícios e malefícios atrelados à via, mitos ou até mesmo medos e inseguranças.
Saber também sobre a perspectiva da equipe multiprofissional de assistência ao parto acerca da decisão da via de escolha para o parto, identificando se as orientações possuem embasamentos científicos e se convergem para a escolha mais segura para o binômio mãe-bebê, oportunizando às mulheres o direito de informações fundamentadas e esplanadas, permitindo a plena compreensão.
Ressalta-se que o trabalho tem o papel fundamental de alertar profissionais de saúde à autonomia da mulher enquanto gestante, além de retratar a importância da transmissão de conhecimento a respeito do planejamento reprodutivo, da atenção humanizada à gravidez, ao parto e ao puerpério, bem como a garantia à criança do direito ao nascimento seguro e ao desenvolvimento saudável.
Por fim, aguarda-se da pesquisa o destaque a relevância de um atendimento qualificado para as mulheres durante o pré-natal, parto e pós-parto, garantindo a todas elas o direito a uma assistência de saúde livre de quaisquer violações. Somado a isso, pretende-se fornecer à equipe de saúde uma perspectiva mais sensível e abrangente, por meio da qual possam reconhecer e atender às necessidades sociais, emocionais e culturais específicas da população feminina.