Introdução: Este trabalho é fruto de uma Pesquisa em Iniciação Científica, da Universidade Federal de Sergipe, Campus Lagarto, ainda em andamento. Para tanto, toma como objetivo analisar a estratégia da Pesquisa-Intervenção em Saúde Coletiva, através das contribuições do Método da Cartografia proposto por Gilles Deleuze e Félix Guattari para as pesquisas em Saúde, no âmbito do Sistema Único de Saúde. Nosso interesse por esse tema e problema de pesquisa está na possibilidade de pensar a pesquisa como intervenção, no qual não separamos o sujeito do objeto, o saber e o fazer, proporcionando uma estratégia de pesquisa que permite ao pesquisador mergulhar nas intensidades do presente, do campo a ser pesquisado, dando passagem e, ao mesmo tempo, dando sentido ao plano dos afetos que os atravessam. A abordagem da pesquisa-intervenção representa uma mudança significativa em relação à pesquisa-ação, que tradicionalmente enfatiza "conhecer para transformar". Na pesquisa-intervenção, a perspectiva muda para "transformar para conhecer", destacando a importância de implementar intervenções práticas para compreender melhor os fenômenos em estudo. Essa abordagem reconhece a ação e a transformação como elementos essenciais na produção de conhecimento. Além disso, ao enfatizar o papel do pesquisador como produtor de novos sentidos e interconexões, a pesquisa-intervenção reconhece a subjetividade e a influência do pesquisador na construção do conhecimento. Essa abordagem também pode ser vista como uma forma de engajamento crítico, onde o pesquisador não apenas observa e analisa, mas também participa ativamente na transformação do contexto em estudo, buscando gerar impactos positivos e promover mudanças significativas. Nesse sentido, dada a sua característica de interferência, compreendemos que esse tipo de pesquisa assemelha–se a estratégia de pesquisa cartográfica proposta por Gilles Deleuze e Félix Guattari. Para estes, a cartografia envolve uma operação ativa sobre o objeto estudado, onde o cartógrafo atua diretamente sobre a matéria a ser cartografada. O cartógrafo não conhece antecipadamente os efeitos ou itinerários de sua ação, a pesquisa ganha forma através dos encontros e dobras geradas enquanto o pesquisador explora e vive os territórios. A forma de se produzir conhecimentos com a cartografia utiliza a lógica rizomática, o rizoma apresenta estrutura não-hierárquica e descentralizada, onde não possui um ponto central dominante; as conexões no rizoma ocorrem horizontalmente, sem uma hierarquia fixa. Não há um ponto de origem privilegiado, e as relações entre os elementos são de igual importância, possibilitando multiplicidade de conexões. A cartografia e o rizoma atuam em sinergia em um processo de mapeamento que está sempre em evolução, adaptando-se e se transformando conforme novas conexões são estabelecidas. A imprevisibilidade é uma característica fundamental nesse tipo de pesquisa, uma vez que surge da complexidade das interações entre o pesquisador e o seu objeto de estudo. As dimensões imprevisíveis tomadas durante o processo da cartografia aproximam-se com a imprevisibilidade presente no campo de estudo da saúde coletiva no Brasil. A saúde coletiva apresenta-se como um campo de conhecimento e experimentação e se realiza no encontro das dimensões da natureza epistêmica e política. É uma produção social naturalmente brasileira decorrente de movimentos históricos que reflete a evolução do sistema de saúde e das políticas públicas ao longo do tempo. Esse campo de saber traz um olhar crítico frente a um modelo de atenção à saúde e aos modos de fazer pesquisa, pautados numa perspectiva biomédica e apresenta-se como uma estratégia significativa na construção de bases epistêmicas, éticas e políticas para o Sistema Único de Saúde, bem como para a formação em saúde.
Metodologia: Por se tratar de um primeiro processo de aproximação com essa perspectiva metodológica e conceitual, para os discentes envolvidos no processo, optamos por uma pesquisa de cunho bibliográfico, por meio do qual fizemos um levantamento e/ou revisão das obras publicadas, sobre o tema específico desse trabalho. Ressaltamos que esse tipo de pesquisa se baseia em um tipo de estudo teórico sobre o que já foi publicado, com o intuito que o pesquisador possa se apropriar sobre os conhecimentos produzidos, ao mesmo tempo em que intenta por elaborar reflexões e sistematizações sobre o material estudado. Dividimos a pesquisa em dois planos de trabalho, a saber: 1. Desenvolver uma revisão sistemática sobre o conceito de Cartografia para Deleuze e Guattari, a partir da obra dos referidos autores, bem como também a partir de livros de comentadores das obras dos referidos pensadores, artigos científicos e demais trabalhos acadêmicos publicados. 2. Mapear os estudos e produções teóricas existentes, no âmbito da Saúde Coletiva e que se utilizaram da cartografia como importante ferramenta metodológica em pesquisas no campo da Saúde, em específico no SUS. Para essa última etapa, utilizar-nos-emos de uma pesquisa em bancos de dados de períodos indexados, buscando por artigos científicos, a partir dos seguintes descritores “Pesquisa-intervenção”, Método da Cartografia” e “Saúde Coletiva”. Para análise dos resultados, tomaremos a proposta da Revisão Integrativa (RI) como norte para o estudo. A RI permite que apresentemos um panorama atual sobre o assunto em questão, uma vez que se configura como um tipo de revisão de literatura que conecta um grupo de pesquisas desenvolvidas de várias maneiras, permitindo aos revisores sintetizarem os resultados sem que se altere suas bases epistemológicas.
Resultados e discussão: Por se tratar de uma pesquisa ainda em andamento, os resultados parciais nos mostram que a abordagem cartográfica de Deleuze e Guattari tem sido aplicada de forma significativa em pesquisas na área da saúde, principalmente em estudos que buscam compreender as dinâmicas complexas das práticas de cuidado, a produção de subjetividade e as relações de poder presentes nos contextos de saúde no âmbito Sistema Único de Saúde. A cartografia valoriza a multiplicidade de saberes e experiências presentes nos contextos de saúde, permitindo uma análise mais ampla e inclusiva das práticas de cuidado. O uso do método cartográfico na pesquisa em saúde permite mapear as redes de cuidado não apenas como estruturas fixas, mas como processos dinâmicos de interação entre diferentes atores, práticas e instituições. Além disso, a cartografia possibilita uma análise das relações de poder a partir da noção da micropolítica, analisando as relações de poder presentes nos contextos de saúde, revelando como certas práticas e discursos são hierarquizados e mantidos. Com isso, a cartografia também permite explorar as linhas de fuga presentes nos contextos da saúde, ou seja, as possibilidades de ruptura e transformação das práticas dominantes. Nessa perspectiva, compreendemos que o uso da cartografia nas pesquisas em saúde engrandece a formação de profissionais atuantes nessa área, uma vez que, esse método incentiva a desconstrução de dualismos, como o conceito de saúde/doença, normal/patológico e indivíduo/coletivo. Além disso, o uso da cartografia propicia a exploração de multiplicidades e conexões entre diferentes elementos, sejam eles sociais, culturais, ambientais ou biológicos. Isso pode enriquecer a compreensão dos determinantes de saúde e estimular a busca por soluções com integração de múltiplos saberes e perspectivas, incluindo conhecimentos das ciências humanas e biológicas, propiciando a criação de uma abordagem em saúde mais integrada e holística.