A ótica de puérperas e profissionais de saúde acerca da violência obstétrica: nota prévia

  • Author
  • Gabriela Schons Theisen
  • Co-authors
  • Priscila Orlandi Barth , Stefanie Rodrigues Betinelli , Brenda Zambenedetti Chini , Roberta Ribeiro Venturini , Giovana Dorneles Callegaro Higashi
  • Abstract
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    O processo de parto-nascimento é uma experiência ímpar na vida da mulher, onde ocorrem diversas transformações, ao longo da história, houve a transição de um ambiente familiar, pouco medicalizado, realizado em sua grande maioria por mulheres que utilizavam de seu conhecimento empírico para a concepção, indo em direção a um processo institucionalizado, predominantemente médico, e com uma série de intervenções. Com isso, gerou-se eventos fogem do natural, indo ao encontro de um processo regrado, muitas vezes danoso tanto para a parturiente quanto para o seu feto, levando a sofrimentos desnecessários em âmbito físico e psíquico.

    Devido aos riscos do processo de parturição e as altas taxas de morbimortalidade materno-infantil, teve-se, dentro do contexto histórico, a ideia de que a transição do parto natural para um procedimento cirúrgico complexo, fosse algo que indicasse segurança. A prática médica acabou deixando de lado a subjetividade de cada processo de parturição, a mulher acabou perdendo a sua autonomia, deixando de ser o sujeito do processo, sendo isso designado ao médico, responsável por tomar as decisões. Isso acabou por gerar uma certa dependência nas mulheres, as quais entenderam que todo movimento de medicalização do processo de parto, aliado ao conhecimento científico e ao desenvolvimento tecnológico, fizessem com que as respostas médicas acerca desse assunto fossem inquestionáveis e mais eficientes. Tais fatos trouxeram um ponto de fragilidade que abre margem para a ocorrência de práticas violentas, sendo a mesma realizada em virtude de interesses médicos e institucionais, deixando de lado a subjetividade do sujeito principal desse processo.

    A luta por partos humanizados vem se intensificando com o passar dos anos, tendo o Ministério da Saúde (MS) um papel importante na normatização e regulamentação de ações que estimulam a melhoria na assistência obstétrica. Desse modo, permitindo e assegurando por meio de portarias ministeriais, que o serviço assista as mulheres com segurança e dignidade no momento do parto e nascimento. Como exemplo disso tem-se a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher, com enfoque na promoção da melhoria das condições de vida das mulheres através da garantia de direitos, redução da morbimortalidade feminina e a ampliação, qualificação e humanização da atenção integral à saúde da mulher, assim como as Diretrizes Nacionais de Assistência ao Parto normal, que objetivam promover, incentivar e proteger o parto normal, a redução das intervenções desnecessárias e os agravos causados por elas, por meio do fornecimento de informação científica revisada e atualizada sobre as práticas mais comuns na assistência ao parto, a mulher e ao recém-nascido.

    Tem-se refletido quanto às formas de enfrentamento à institucionalização dos partos e as intervenções desnecessárias em grandes escalas que levam a violência. Nesse sentido, volta-se com um olhar maior para as práticas de humanização e combate à violência obstétrica, que se configura como qualquer ato ou intervenção sem aviso ou consentimento da mulher, assim como qualquer atuação que fira a dignidade ou a envergonhe, sendo ela verbal, física ou figurativa, implícita ou explícita, cometida durante o ciclo gravídico-puerperal.

    Seguidamente a violência é naturalizada por profissionais, e acaba sendo invisibilizada devido à percepção limitada das vítimas que acabam não percebendo a violência presente nas ações, principalmente pelo fato de ocorrer em um momento de vulnerabilidade, o que é reforçado pelo fator histórico do parto ser um processo doloroso.

    A equipe de saúde desempenha um importante papel para que as políticas públicas e a atenção humanizada sejam adequadamente implantadas e executadas, portanto, se faz necessário que os profissionais da saúde estejam embasados em conhecimento científico e engajamento profissional. Assim, por meio de ações multiprofissionais busca-se à promoção, proteção e recuperação da saúde em diferentes níveis de atenção, de forma integral e resolutiva, vislumbrando as necessidades sociais, emocionais e culturais da população feminina.

    Nos últimos anos apresentou-se uma melhora em relação ao amparo legal e suporte à mulher em relação ao parto humanizado e a violação de seus direitos durante esse momento de suas vidas, porém a efetivação desses direitos ainda é um desafio, e o estudo da violência obstétrica é fundamental para subsidiar a criação e implementação de políticas públicas mais eficazes.  Dentro disso, o presente estudo objetiva: Compreender a violência obstétrica sob a ótica de gestantes e profissionais de saúde; identificar fatores que geram violência obstétrica no processo de pré, intra e pós-parto.

    Trata-se de uma pesquisa exploratória descritiva, de natureza qualitativa, que será desenvolvido no município de Palmeira das Missões que se localiza na região noroeste do estado do Rio Grande do Sul, o qual conta com uma população estimada de 35.045.

    Participarão da pesquisa as puérperas e profissionais de saúde que atuam no atendimento ao pré, intra e pós-parto, sendo incluídos colaboradores da atenção básica de saúde e da atenção hospitalar.

    Critérios de inclusão puérperas:  mulheres com até o 42º dia pós-parto, maiores de 18 anos.

    Critérios de exclusão puérperas: déficit cognitivo, feto morto, complicações durante o parto e/ou pós-parto.

    Critério de inclusão profissionais de saúde: ter no mínimo 6 meses de atuação.

    Critérios de exclusão profissionais de saúde: férias e/ou afastamento por motivos de saúde.

    A coleta de dados será por meio de entrevistas semi estruturadas, através de questionário semiestruturado com questões prévias e alguns dados sociodemográficos. Para coleta dos dados, os participantes serão escolhidos intencionalmente, o convite será realizado via ligação ou mensagem pelo WhatsApp, o qual será sugerido que a coleta dos dados ocorra após a consulta de puericultura dos primeiros 7 dias, e para os profissionais que atuam na assistência de saúde da mulher e dos partos, será solicitado a participação em seus respectivos lugares de trabalho. As entrevistas serão gravadas por meio de gravador digital e transcritas na íntegra, a coleta dos dados se finalizará por meio da saturação dos dados.

    A análise dos dados será feita por meio da Análise de Conteúdo de Bardin que consiste em organizar a coleta em torno de três polos cronológicos: a pré-análise; a análise do material; o tratamento dos resultados, a inferência e a interpretação.

    O projeto está aprovado na Plataforma Brasil sob parecer n. 6.613.977, e no momento encontra-se na fase de coleta dos dados.

    Espera-se por meio desse estudo esclarecer a compreensão, vivências e condutas de puérperas e profissionais da saúde dentro do período gravídico puerperal em relação à violência obstétrica, apresentando todos os atos ou intervenções sem aviso ou consentimento da mulher, tratamentos que firam a dignidade ou a envergonhe, desde as expressões verbais, físicas ou figurativamente, podendo ser implícita ou explícita, cometida durante o ciclo. Assim, espera-se contribuir para a construção de um cenário mais humanizado e com menos riscos para essa população através de evidências para subsidiar e incentivar a implementação de políticas públicas mais eficazes para o combate da violência obstétrica no Brasil.

    Entende-se a importância de retratar a violência obstétrica nos diferentes momentos da mulher, expondo as feridas e promovendo estratégias de combate à essa violência implícita e explícita no cotidiano dos profissionais de saúde.

    Por meio de evidências cientificas busca-se oferecer a pesquisa como lente para toda equipe se atentar às necessidades sociais, emocionais e culturais da população feminina, tendo em vista a relevância do assunto para a saúde pública, indo assim ao encontro de práticas mais humanas e a redução da violação dos direitos, traçando assim estratégias para o enfrentamento de tais condutas.

     

  • Keywords
  • Saúde da mulher, violência obstétrica, direitos sexuais e reprodutivos
  • Subject Area
  • EIXO 7 – Rotas Críticas - Narrativas de Violência Contra a Mulher
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