Apresentação
A formação médica é uma jornada multifacetada, permeada pela busca incessante pelo conhecimento e pela compreensão da complexidade humana. No contexto atual, a expansão das fronteiras do aprendizado vai além das salas de aula e dos limites da universidade, adentrando muitos e diversos espaços que por vezes apresentam vulnerabilidades psicossociais, tais como os campos de estágio que se desenvolvem na Estratégia de Saúde da Família.
Assim, quando os currículos são estruturados para promover uma reflexão profunda sobre os determinantes sociais da saúde e as desigualdades no acesso aos serviços de saúde, os estudantes são instigados a questionar tanto as práticas clínicas como as estruturas sociais que perpetuam e influenciam o modo de cuidar e suas repercussões. O comprometimento com a transformação social pode formar profissionais conscientes de seu papel como agentes de mudança, logo o engajamento social dos estudantes de medicina é essencial na formação médica, compreendendo que o forjar do sujeito proativo e dinâmico pode acontecer dentro do processo de formação.
Ao participarem de atividades extracurriculares voltadas para o serviço comunitário e a promoção da saúde em contextos vulneráveis, os estudantes têm a oportunidade de aplicar os conhecimentos teóricos adquiridos em sala de aula na prática, ao mesmo tempo em que desenvolvem habilidades de liderança, empatia e trabalho em equipe. Essa abordagem não apenas enriquece a formação acadêmica dos estudantes, mas também os prepara para serem profissionais mais comprometidos com a saúde e o bem-estar das comunidades que irão servir.
Dessa forma, a participação do estudante de medicina na Coordenação Local de Estágios e Vivências (CLEV), uma representação local da Direção Executiva Nacional dos Estudantes de Medicina (DENEM), que os representam nacionalmente e tem como um de seus princípios um ensino médico voltado para as reais necessidades da população brasileira. Essas estruturas são pensadas e coordenadas pelos próprios estudantes, sob a luz de docentes e preceptores identificados pelos discentes enquanto modelos a serem seguidos. Assim, representam um caminho possível para a formação de um estudante de medicina diferente, visto que oferece um espaço de integração entre diferentes etapas do curso, promovendo a troca de experiências entre alunos de diferentes períodos e estimulando o aprendizado colaborativo.
Além disso, proporcionam oportunidades para que os estudantes desenvolvam habilidades de liderança, trabalhando em grupos e resolvendo problemas cotidianos reais, essenciais para o exercício da medicina. A interação com professores e preceptores de diferentes estados em um ambiente virtual também permite que os alunos aprimorem seus conhecimentos teóricos e práticos sob múltiplos ângulos, ampliando sua visão sobre as diversas áreas da medicina e fortalecendo sua formação como profissionais de saúde.
Por fim, o objetivo do presente relato é descrever como a participação de estudantes de medicina no projeto de extensão da CLEV os prepara para intercâmbios culturais e acadêmicos durante o preparo que antevêem a jornada.
Desenvolvimento do trabalho
A metodologia adotada para esta reflexão baseia-se nas experiências de alunos de medicina de diferentes períodos que desejam participar de programas de intercâmbio e trabalho social na Atenção Primária à Saúde (APS) brasileira, explorando os impactos dessas vivências em sua formação acadêmica e pessoal. Como parte da preparação, os estudantes ofereceram serviços vivenciais em uma Unidade de Saúde da Família da cidade de João Pessoa-PB, chamada Saúde e Vida Integrada, com a criação de uma agenda que dialogasse com as necessidades dessa comunidade, buscando performar momentos de educação em saúde aos usuários frequentadores deste espaço.
O relato de experiência nesse sentido é uma ferramenta poderosa no processo de aprendizado, pois permite aos alunos compartilhar suas vivências, reflexões e aprendizados, contribuindo para a construção coletiva do conhecimento.
No contexto da formação médica, o relato de experiência ganha ainda mais relevância, pois permite aos estudantes não apenas absorver informações teóricas, mas também compreender a realidade prática da profissão e desenvolver habilidades essenciais, como empatia e resiliência ao construírem grupos e momentos com os usuários do Sistema Único de Saúde e lidar com o inesperado, desde participação até a falta de adesão, assim como as dificuldades de ofertar espaços autônomos e respeitosos aos pacientes que sejam eficazes em informar, sem rechaçar o saber, o sentido e o desejo das pessoas.
Resultados
Reflexão sobre o Potencial do Olhar Ampliado dos Estudantes
Os estudantes de medicina que buscam ampliar suas fronteiras através de intercâmbios e trabalhos sociais em outros países e estágios têm a oportunidade única de vivenciar realidades diversas e enriquecedoras. Ao imergir em contextos de vulnerabilidade biopsicossocial, esses alunos são desafiados a repensar suas próprias percepções e preconceitos, desenvolvendo uma visão mais ampla e inclusiva da saúde e da sociedade.
Assim, conhecer diferentes culturas e formas de fazer saúde traz novas perspectivas e reflexões acerca da estrutura a qual o aluno está inserido. Quanto mais o aluno se engaja, praticando a observação participante, mais bem indicado será, potencialmente, sua avaliação permitindo o pleito a um leque maior de estágios dentro do pacto da DENEM, observando as premissas de oferecer práticas em cenários vulneráveis dentro do SUS. O SUS é o cenário ideal para a formação do estudante médico visto ser pautado em diversos princípios e diretrizes que versam sobre o atendimento humanizado e universal, reconhecendo as necessidades de cada pessoa e de cada grupo e utilizando-se da empatia para compreender os variados contextos.
Ademais, a empatia é um ponto crucial na prática médica que viabiliza a conexão, o reconhecimento e o respeito pelo estudante de medicina às diferentes culturas, hábitos e crenças dos necessitados de atendimento médico em um estabelecimento de saúde ou não, com foco na saúde e bem-estar global dos mesmos o que pode ser alcançado e ampliado sobremaneira nos intercâmbios culturais educativos dentro das proposta da DENEM.
A Diferença na Formação Médica
A decisão de realizar um intercâmbio através do trabalho social em espaços com vulnerabilidades psicossociais representa um ponto de inflexão na formação médica. Essa experiência não apenas amplia os horizontes acadêmicos dos estudantes, mas também os transforma em agentes de mudança social e saúde em suas comunidades e os desafia a se adaptar a diferentes situações de saúde comuns e incomuns na nossa sociedade e fortalece a formação acadêmica e pessoal dos alunos. Além disso, a construção de oficinas e formações por esses estudantes beneficia as populações atendidas, não se limitando apenas aos estudantes.
Considerações finais
Em um mundo cada vez mais interconectado e diversificado, a formação médica não pode se limitar às paredes da universidade ou, até mesmo, às fronteiras nacionais. O intercâmbio, através do trabalho social em espaços com vulnerabilidades psicossociais, é uma oportunidade única para os estudantes de medicina expandirem seus horizontes, desenvolverem empatia e resiliência, e se tornarem profissionais mais completos e humanizados.
Ao compartilharem suas experiências e aprenderem com diferentes realidades, esses alunos contribuem não apenas para sua própria formação, mas também para a construção de uma sociedade mais justa, inclusiva e plural.
Ao estimular a análise crítica das relações entre saúde, sociedade e poder, essa abordagem amplia o horizonte dos estudantes, capacitando-os não só a diagnosticar e tratar doenças, seguindo o modelo biomédico do cuidado, mas também a enfrentar os desafios mais amplos que afetam a saúde das populações.