Apresentação: A visita domiciliar é uma ferramenta adotada no cotidiano da Atenção Primária à Saúde, especialmente, nas equipes da Estratégia Saúde da Família, visando ampliar o acesso e melhorar a qualificação do cuidado em saúde. Uma equipe de saúde bucal da área de abrangência do Distrito de Saúde Oeste da Secretaria Municipal de Saúde de Manaus realizou visita domiciliar, com a avaliação clínica e respectivo plano de cuidados, a um usuário que foi submetido a procedimento cirúrgico bucal de uma lesão maligna. O presente trabalho relata a experiência de cuidado em saúde bucal a um usuário em tratamento oncológico, como parte de uma atividade de preceptoria, na perspectiva da integração ensino-serviço-comunidade, objetivando a avaliação das condições de saúde bucal do usuário e execução das intervenções necessárias, bem como oportunizando o fortalecimento de vínculo do usuário com os profissionais de saúde. Desenvolvimento: No cotidiano das Equipes de Saúde da Família, a visita domiciliar constitui-se em uma estratégia de intervenção que possibilita a ampliação e qualificação das ações de saúde bucal, bem como proporciona o fortalecimento de vínculo dos usuários com os profissionais, resultando em uma nova forma de se produzir o cuidado em saúde bucal. A visita domiciliar foi realizada por uma cirurgiã-dentista, uma técnica em saúde bucal e dois acadêmicos de Odontologia da Universidade Federal do Amazonas. O usuário tinha 50 anos de idade, é do sexo masculino e é venezuelano, residente no Brasil há um ano. Inicialmente, realizou-se anamnese e exame clínico geral ao paciente que estava com o tempo pós-cirúrgico de quatro meses. A queixa principal do usuário estava relacionada às dúvidas sobre a indicação de exodontia de todos os elementos dentários remanescentes em ambas as arcadas, antes de realizar as sessões de quimioterapia e radioterapia. Com relação aos fatores de risco, o paciente relatou não fazer uso de tabaco ou álcool, referiu ter histórico de câncer na família e que enfrentava barreiras de acesso à saúde bucal em seu país de origem. Em um primeiro momento, foi atendido na Atenção Primária à Saúde por outra equipe da Estratégia Saúde da Família, com demanda de queixa ortopédica, dor lombar, para assistência médica. Na oportunidade, ele também foi atendido pelo cirurgião-dentista que, em razão da presença de uma lesão bucal potencialmente maligna o referenciou à Policlínica Odontológica da Universidade do Estado do Amazonas, para fins de diagnóstico da lesão bucal. Após o resultado da biópsia incisional, que foi Carcinoma Mucoepidermóide de grau intermediário, o paciente foi encaminhado à Fundação Centro de Controle de Oncologia do Estado do Amazonas, onde foi realizada a cirurgia de maxilectomia direita. Na visita domiciliar, foi realizado o exame bucal, sendo observada a limitação de abertura bucal, possivelmente, devido ao procedimento cirúrgico. O usuário relatou a não indicação de tratamento fisioterapêutico, assim como afirmou que a sua alimentação passou a ocorrer, exclusivamente, por meio de sonda nasoenteral após a cirurgia bucal, e que três meses depois da cirurgia voltou a se alimentar via oral, mas com a prescrição de nutrição enteral para adicionar nas preparações da alimentação. Com relação à saúde bucal, durante o exame bucal, observou-se acúmulo de biofilme dentário e presença de cálculo dentário, com a indicação de exodontia de apenas um elemento dentário. A equipe realizou orientações de higiene bucal, demostrando como utilizar escova dental e fio dental, e prescreveu bochecho com solução de digluconato de clorexidina à 0,12 %. Na ocasião, foi solicitada uma radiografia panorâmica e foi agendada uma consulta na unidade de saúde. Resultados: Na consulta para reavaliação e realização de procedimentos odontológicos, observou-se que o paciente apresentou melhora na remoção do biofilme, possivelmente, como resultado da orientação preventiva em saúde bucal durante a visita domiciliar. Ao realizar o exame bucal, minuciosamente, com espelho, cureta e sonda periodontal, à luz do refletor, não foi observada cárie dentária. Vale ressaltar que a instrumentação periodontal supragengival foi realizada manual e cuidadosamente, devido à extensão da perda óssea na maxila, sendo realizada, também, profilaxia e aplicação tópica de flúor. Dada à complexidade da condição de saúde bucal do paciente, optou-se por referenciá-lo para a avaliação odontológica e fisioterapêutica na Atenção Especializada. Dessa forma, ele foi encaminhado para tratamento da abertura limitada de boca ao Grupo de Dor Orofacial do Amazonas, serviço oferecido pela Faculdade de Odontologia da Universidade Federal do Amazonas. Vale ressaltar que o acesso e o rápido atendimento no serviço referenciado foram facilitados pela participação de um dos acadêmicos no Grupo de Dor Orofacial. O paciente foi recebido por essa equipe de saúde, progredindo a abertura bucal de 22 milímetros para 27 milímetros já na primeira sessão de tratamento. No que se refere ao exame radiográfico panorâmico, é importante destacar que os elementos dentários 28 e 38, anteriormente não identificados no exame clínico bucal, estão inclusos. Atualmente, o usuário se encontra em tratamento oncológico, fisioterapêutico e com o acompanhamento na Atenção Primária à Saúde com uma equipe de saúde da família. Considerações finais: O câncer bucal está entre as principais causas de óbito por neoplasias, representando metade dos casos diagnosticados em estágios avançados da doença. É o oitavo tipo de câncer mais comum na população brasileira, no entanto é uma doença que pode ser prevenida, quando se priorizam a promoção à saúde, o acesso aos serviços de saúde e o diagnóstico precoce. Essa patologia tende a acometer mais o sexo masculino e pessoas com idade acima de 40 anos. Os cuidados domiciliares em saúde bucal compõem um conjunto de ações de educação em saúde, orientações sobre autocuidado, prevenção de doenças e assistência odontológica, além do estabelecimento de relação dialógica com usuários e família. Nesse sentido, a visita domiciliar proporciona o cuidado em saúde bucal, por meio do acompanhamento do paciente na Atenção Primária à Saúde, ainda que o paciente esteja em tratamento oncológico. Essa aproximação do serviço com usuário em seu domicílio, na sua condição de vida, possibilita o fortalecimento de vínculos e o estreitamento de uma relação de confiança, imprescindíveis à adesão ao tratamento. A importância da preceptoria pode ser compreendida pela sua dupla função, em que a academia contribui com o serviço, na reflexão da prática profissional e os serviços, com seus cenários de práticas, proporcionam um exercício de aprendizagem efetiva aos acadêmicos no contexto do Sistema Único de Saúde. Essa via dupla qualifica o cuidado em saúde aos usuários. A preceptoria é, portanto, uma estratégia que aproxima Ensino-Serviço-Comunidade, possibilitando o compartilhamento de experiências, articulação entre teoria e prática e o incentivo para a abordagem integral do paciente.
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