Apresentação:
Esta rota narrativa expõe uma pequena parte do universo vivido pela mulher que a violência doméstica impôs. O objetivo deste trabalho é expor uma realidade de traumas odontológicos que ocorrem na vida da mulher violentada fisicamente e narrar criticamente sobre uma rede institucional e voluntária de amparo e apoio, além dos acompanhamentos da sociedade civil organizada para prevenção de violências de gênero, promoção, proposição e cuidado das vítimas.
Desenvolvimento
Todos os dias, pelo menos 600 mulheres sofrem violência doméstica são machucadas, subjugadas, incapacitadas, deslegitimadas e desrespeitadas pela tentativa de subtração da condição de mulher, de pessoa.
A violência pode trazer uma condição de desestruturação, onde o desamparo, abandono e solidão oferecem o tom da vida às mulheres violentadas em suas faces, têm os seus dentes destruídos, a sua saúde bucal abandonada e não conseguiriam, na integralidade, os procedimentos odontológicos mais complexos na unidade básica do Sistema Único de Saúde (SUS), pois as políticas públicas existentes são insuficientes sozinhas para acolher e cuidar, tirá-las do ciclo de violência e dar condições para que restabeleçam qualquer situação que as suas identidades possam ser reconstruídas.
Em certo momento docente, um membro do Instituto Capixaba de Ensino, Pesquisa e Inovação (ICEPI) em supervisão na educação permanente de uma Unidade de Saúde da Família (USF) de um município do interior do Espírito Santo, em uma oficina sobre violência doméstica contra a mulher, abordou o projeto “Apolônias do Bem” e o seu voluntariado de cirurgiões-dentistas que atendem mulheres vitimadas pela violência doméstica.
Surgem, portanto, narrativas individualizadoras delas, estruturantes e estruturadas pela reflexão crítica das narrativas dos procedimentos odontológicos empáticos em mulheres que sofreram ou sofrem violência, fundamentadas em suas realidades e dados, escuta e compreensão dos seus episódios violentos e nos resultados dos tratamentos advindos dos encaminhamentos do Ministério Público, delegacias de polícia, poder judiciário e entidades apoiadoras do terceiro setor, tais como o projeto “Apolônias do bem”.
Resultados:
O acolhimento da mulher vitimada pela violência perpassa ao processo de violência de gênero, à situação inicial de desamparo e abandono, à rede de amparo ampliada, para modelo de integralidade no acolhimento, com o apoio clínico estruturado nos dentistas e em sua co-reconstrução a partir de suas verdades narrativas.
A escuta visa a qualificação afetiva e a ressignificação dos sentimentos trazidos, a partir da aceitação do feminino em si própria, nos seus fortalecimentos e na reestruturação como pessoa, por meio da possibilidade ampliada da sua apresentação.
Pode não ser possível que o SUS consiga abarcar uma política de saúde específica para mulheres vítimas da violência doméstica, que necessitam de cuidados físicos, psíquicos e emocionais altamente especializados, que possam trazer amparo, acesso e acolhimento à sua condição latente de dor e ressignifiquem o processo de violência nas suas características de gênero.
Considerações finais:
Considera-se que a violência doméstica de gênero é um produto social a ser combatido em todos os setores, como insumo transversal de reflexão crítica pautada em discussões sobre o feminino e processos de reinclusão da mulher em suas próprias identidades e pessoas.