A Fisioterapia possui formação generalista, humanista e reflexiva, com práticas integradas em todas as instâncias e níveis do sistema de saúde e uma atuação para além da técnica. No entanto, o profissional fisioterapeuta historicamente tem o cerne de sua atuação nas atenções secundária e terciária, com um caráter essencialmente curativista e reabilitador, sendo os principais e reconhecidos campos de trabalho da profissão. A evolução do conceito de saúde serviu para ampliar seu entendimento e compreender o sujeito como ator social, político e cultural numa íntima relação com o ambiente, considerando o impacto de determinantes sociais na produção de saúde. Dessa forma, há um (re)direcionamento da concepção de trabalho em saúde baseado nos desafios ético-políticos da transdisciplinaridade, multiprofissionalidade e integralidade, que compõem as práticas no Sistema Único de Saúde e Estratégia de Saúde da Família. O surgimento dessa nova lógica de organização nos sistemas de saúde permite afirmar que o processo de inserção do fisioterapeuta na Atenção Primária significa uma amplificação no campo de atuação profissional, o aproximando da promoção e educação em saúde, já que possibilita romper com a lógica da Fisioterapia Reabilitadora, focada em danos, ultrapassando o modelo individualista de um cuidado fragmentado. Essa prática isolada e associada apenas a reabilitar reduz as possibilidades de interlocução com outros atores da saúde e principalmente com o social. Portanto, com o objetivo de contribuir com debate sobre atuação da fisioterapia na Saúde Coletiva, em especial, na Atenção Primária à Saúde, esse relato de experiência traduz o compromisso de implementar o serviço de fisioterapia em duas Unidades de Saúde da Família, localizadas em territórios com necessidades distintas bem evidentes, no município de Vitória-ES em 2022. O desafio esteve em torno de uma preceptoria em Saúde Coletiva a fim de desenvolver intervenções e cuidados distanciados do modelo biomédico. A produção foi um desenrolar coletivo – docente – estudantes - equipe da ESF - comunidade, com construção de vínculos sólidos entre atores e engajamentos dos estudantes numa produção desejante. Inicialmente, os encontros foram direcionados ao diagnóstico da demanda populacional adstrita às USF. Posteriormente, com informações coletadas, as intervenções se organizaram na construção de grupos de educação em saúde para dor crônica, exercícios funcionais, saúde da mulher, gestantes e idosos. O encontro com usuário era, inicialmente, individualizado, sua demanda previamente estabelecida e acordada, sua inserção nos grupos monitorada e evoluída. Alguns encontros se deram fora das unidades de saúde, como ONG´s e escolas. Mesmo diante de um cenário novo e desafiador para essa profissão e das dificuldades de sua inserção em um processo de trabalho leve e coletivo, foi possível atravessar os muros da USF e do puro reabilitar e revelar uma experiência exitosa no transformar de práticas de ensino e cuidado. Pode-se concluir que há a necessidade de maiores reflexões sobre o lugar do fisioterapeuta na Atenção Primária, bem como sobre suas atribuições na produção de saúde, para que seja possível a desconstrução dos limites atrelados à sua atuação profissional nesse espaço, a ampliação do campo de trabalho e o desdobrar de novos saberes.