INTRODUÇÃO: Discutir a adoção de tratamentos injustos dentro da sociedade requer a compreensão de que esse fenômeno acontece quando se fere o princípio da igual consideração por meio do qual entende-se que o que deveria importar em nossas deliberações morais é a magnitude dos prejuízos/benefícios em questão, e não sobre quem esses recairão. As posturas adotadas frente a experiência de tratamento injusto são múltiplas e distintas, assim como os locais onde esse fato pode ocorrer ou o público sobre o qual poderá recair esse tipo de tratamento. A ocupação das Instituições de Ensino Superior (IES) historicamente está associada a parcela elitizada da população, são os brancos ou pardos que ocupam a maior parte das vagas de ensino superior no país. Dessa forma, convém que se discuta a inter-relação entre etnia/raça ou cor e a experienciação de tratamento injusto entre os estudantes de ensino superior, assim como a investigação da forma como esses reagem a experiências desse tipo. OBJETIVO: investigar a incidência do tratamento injusto aos estudantes do ensino superior e como esses reagem ao tratamento injusto relacionado à etnia/raça ou cor. METODOLOGIA: Trata-se de estudo exploratório, descritivo e transversal, com abordagem quantitativa, realizado no período de setembro a dezembro de 2023. A população foi composta por estudantes universitários de cinco instituições de ensino superior públicas e privadas do Estado do Ceará. A amostra foi composta por 829 estudantes cearenses. Foram adotados como critérios de inclusão idade igual ou maior de 18 anos e matrícula ativa nas IES. E para os critérios de exclusão: estudantes desinteressados em participar do estudo e respostas incompletas ao instrumento. A identificação e abordagem dos estudantes ocorreu por meio dos sistemas acadêmicos institucionais e das redes sociais (WhatsApp e Instagram). A coleta presencial também foi empregada, e contou com o apoio de bolsistas e membros voluntários do Grupo de Estudo e Pesquisa Saúde Mental e Cuidado (GESAM) e mediação dos docentes. Um Instrumento estruturado e compartilhados pelo Google Forms contendo: termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE), questionário sociodemográfico e a Escala de Experiências de Discriminação. O recorte deste trabalho trata de uma dimensão da Escala de Discriminação sobre o tratamento injusto e a pergunta primária que questiona se o estudante já foi impedido de fazer algo, foi perturbado ou feito sentir- se inferior em alguma das nove situações listadas, pela raça, etnia ou cor. Os cenários são: na escola, procurando emprego, no trabalho, procurando moradia, buscando atendimento médico, recebendo serviços em restaurante ou loja, solicitando crédito, empréstimo bancário ou hipoteca, na rua ou em local público, da polícia ou em tribunal/da justiça. Os resultados serão analisados por meio da estatística descritiva simples. Este estudo faz parte de um estudo mais amplo denominado “Discriminação racial e saúde mental nas universidades” e possui parecer de comitê de ética pela Universidade Estadual Vale do Acaraú com o número 6.279.258. Além disso, salienta-se que esse trabalho respeita a resolução 466 de 12 de dezembro de 2012, do Conselho Nacional de Saúde, que regulamenta a pesquisa com seres humanos e contempla nos referenciais os princípios da beneficência, não maleficência, autonomia e justiça. RESULTADOS: A partir da análise dos dados sociodemográficos é possível perceber que o número de estudantes do sexo feminino (52,7%) incluídos na amostra possui discreta prevalência em detrimento aos estudantes do sexo masculino (46,4%). Quanto a idade, tem-se por média 23,1 anos, o que enfatiza a prevalência do público jovem e jovem adulto na amostra. Outrossim, quando avalia-se o item religião, seguindo a média do país, se tem a prevalência da religião católica (59,3%) e a segunda maior percentagem refere-se aos estudantes que declararam não possuir religião (17,6%). Por fim, quando investiga-se o item raça, a maior parte dos participantes declara-se parda (58,1%), seguido dos brancos (28%) e pretos (12,4%). Outrossim, quando questiona-se sobre qual a sua reação ao tratamento injusto a maioria dos estudantes referiu tentar fazer algo contra isto (75,6%), em contradição a aqueles que referiram aceitar isto como um fato da vida (24,4%), também a parcela mais expressiva referiu falar com outras pessoas sobre o tratamento injusto quando este vem a acontecer (76,5%), enquanto a minoria referiu guardar essa situação para si mesmo (23,5%). Por fim, os ambientes nos quais os participantes demonstraram alta incidência desses episódios, foram: “Na rua ou em estabelecimento público” (23,8%), “Solicitando serviço em loja ou restaurante”(18,8%) e a parcela mais significativa referiu ter vivenciado essas experiências “Na Escola” (31,5%). A comparação da prevalência das experiências de tratamento injusto sobre a amostra é necessariamente avaliada à luz da compreensão dos estudantes que a compõem. Compreende-se que a experienciação de discriminação e tratamento injusto é multicausal, a concepção social de “pessoa suspeita” descreve características especificas de raça, e tende-se a valorizar um em detrimento do outro. Outrossim, convém que se discuta o posicionamento desses jovens universitários frente às experiências de tratamento injusto, percebe-se claramente que a parcela mais expressiva da amostra encontra-se disposta a mudar algo, fazendo o que pode para mudar a situação sofrida, comunicando-se com outros sobre o vivenciado, saindo da passividade da livre aceitação de que lhe tratem como menor ou menos importante. Por fim, tristemente observa-se ser a escola o local com maior incidência de experiências injustas, o lugar que deveria representar para os jovens local de segurança e aprendizado, para muitos, findou por mostrar-se como lugar onde necessita-se de constante luta para que equipare-se a valorização das pessoas. CONCLUSÃO: Os resultados da pesquisa mostram que os jovens universitários pertencentes a diferentes raças/etnias ou cores enfrentam experiências injustas, porém estão abertos a mudanças na forma como lidam com essas situações. Isso levanta questões sobre os desafios enfrentados no ambiente acadêmico e em outros contextos sociais, bem como a importância de novas pesquisas que investiguem a relação entre raça e discriminação, e as ações necessárias para enfrentar esse problema. A discriminação racial continua sendo uma realidade para muitos estudantes universitários, que enfrentam obstáculos e injustiças com base em sua raça ou etnia. No entanto, os resultados sugerem que existe uma disposição por parte dos jovens em buscar mudanças e resistir a essas experiências injustas. Isso ressalta a importância de promover inclusão e equidade no ensino superior, garantindo que todos os alunos tenham uma experiência educacional justa e igualitária. Além disso, a pesquisa destaca a necessidade de expandir os estudos sobre as formas específicas de discriminação racial enfrentadas pelos estudantes universitários, e de desenvolver estratégias eficazes para combater essas desigualdades. É fundamental criar políticas e programas que promovam a diversidade e a igualdade racial no ambiente acadêmico, além de incentivar a reflexão e o diálogo sobre questões de raça e discriminação na sociedade em geral.