Apresentação: A equipe do Consultório na Rua (eCR) foi implementada a partir da Política Nacional de Atenção Básica, em 2011, e possui como principal objetivo ampliar o acesso da População em Situação de Rua (PSR) aos serviços e as ações de saúde. Conforme a Constituição do Brasil de 1988, a saúde é um direito de todos e dever do Estado garantindo através do acesso universal e igualitário. De acordo com o Decreto n° 7.053 de 23 de dezembro de 2009, que instituiu a Política Nacional para a População em Situação de Rua, entende-se como PSR “grupo heterogêneo de pessoas, que possuem em comum a pobreza extrema, vínculos familiares fragilizados ou interrompidos, inexistência de moradia convencional regular e utilizam os espaços públicos como abrigo, sendo temporário ou não, além das casas pernoite de acolhimento como moradia fixa ou temporária”. Vale ressaltar que as PSR vivem em vulnerabilização social, uma vez que estão mais expostos ao consumo de álcool e outras drogas, ao convívio em aglomerados humanos insalubres e higiene precária, que propicia o contágio e a transmissão de parasitas, infeções sexualmente transmissíveis e o desenvolvimento de doenças crônicas e doenças psiquiátricas. Dessa forma, garantir o acesso dessa população ao sistema de saúde é essencial para a manutenção, proteção e reconhecimento da dignidade da pessoa humana. O Consultório na Rua atua de forma itinerante seja na unidade móvel ou nas instalações de unidades básicas do território adscrito, sendo adaptada para cada realidade identificada na rua. É composta por uma equipe multiprofissional, com o intuito de proporcionar uma assistência que contempla as necessidades dos sujeitos nos aspetos biopsicossocial. Para que haja uma eCR é necessário pelo menos 80 pessoas em situação de rua no município. As visitas sistemáticas da eCR aos territórios se referem a um enfoque de territorialização, em que o objetivo não é apenas identificar as características geográficas, mas também identificar as condições sanitárias, ambientais, áreas de risco e situação de violência. Nesse contexto, o itinerário terapêutico revela a influência do contexto em que o sujeito está inserido, visto que os determinantes socioculturais e socioeconômicos possibilitam e interferem nas escolhas individuais e no percurso do sujeito nos serviços assistenciais de saúde. No que concerne a PSR o itinerário terapêutico trilhado por esse grupo evidencia o acesso reduzido que os referidos possuem aos serviços formais de atenção, além de expor a ineficácia do sistema de saúde em contemplar as necessidades deste público, que demonstram itinerários traçados por junções tecidas pelo próprio sujeito entre as redes informais e sociais para o autocuidado e validação do direito à saúde, impactando diretamente o modo como adentram os serviços de saúde. Em Palmas-Tocantins existe apenas uma eCR, que atua desde 2016, tendo sua instalação na Unidade de Saúde da Família Professora Isabel Auler e utilizando de base móvel para realizar seus atendimentos. Frente ao exposto, a disciplina de Internato Rural tem como objetivo geral desenvolver atividades de atenção à saúde, ações educativas, gerenciais, participação comunitária e de investigação em enfermagem nos serviços da rede de atenção à saúde. A partir disso, o presente artigo tem como objetivo relatar as experiências e as ações desenvolvidas por estagiárias de enfermagem junto a eCR do Município de Palmas-Tocantins. Desenvolvimento: Trata-se de um estudo qualitativo do tipo relato de experiência por meio narrativas, realizado em Palmas, no mês de fevereiro de 2024, como parte da disciplina de Internato Rural, junto a única eCR existente no município. A equipe é composta por assistente social, técnico de enfermagem, agente social, enfermeira e médica que percorre Palmas de norte a sul, em pontos estratégicos. Segundo levantamento realizado pelo Centro de Referência da Assistência Socias (CREAS), na capital são pelo menos 19 pontos de aglomeração, e a PSR vem crescendo nos últimos anos. A população do estudo foi composta por pessoas em situação de rua assistidos durante o período do Internato Rural Integrado, onde foi realizado busca ativa de pacientes, administração de medicação, avaliação clínica, encaminhamentos e devolutiva de exames laboratoriais, educação em saúde, prevenção de agravos e entrega de kits de higiene pessoal. As experiências relatadas foram possíveis a partir da disciplina de Internato Rural Integrado do estágio supervisionado obrigatório do Curso de Bacharel em Enfermagem da Universidade Federal do Tocantins (UFT). O presente relato aborda ações desenvolvidas pelos discentes de Enfermagem durante o Internato Rural que teve como campo o Consultório na Rua, durante o mês de fevereiro de 2024. Resultados: O internato rural, em sua complexidade de campos, trouxe como oportunidade à entrada de acadêmicos de enfermagem, da Universidade Federal do Tocantins, no Consultório na Rua de Palmas-TO. Na primeira abordagem da eCR foi possível observar a organização e o empenho em prol da PSR. Os dias atuando em campo forneceram desde a realização de ações de redução de riscos, à entrega de medicamentos, receitas e exames, até busca ativa. Funções estas que demandam planejamento e versatilidade dos profissionais de acordo com o que as ruas lhes oferecem. Foi possível observar, também, que essa população se encontra em locais atípicos, fora do nosso cotidiano, mas ao mesmo tempo, em frente aos nossos olhos. Ademais, acompanhar a rotina da eCR é uma experiência diferente de qualquer outro campo de estágio. É possível notar que a atuação do Consultório na Rua vai além da assistência à saúde convencional, pois a equipe trabalha realizando articulação entre vários setores, como atenção básica, cartórios, defensória pública, Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), programas sociais como bolsa família e programas habitacionais para garantir a integralidade do cuidado, apoio, autonomia e possibilidade de melhoria na qualidade de vida. É importante ressaltar a organização do processo de trabalho e o conhecimento acerca do território que a rotina no Consultório na Rua demanda devido a vigilância em saúde e a toda dinâmica complexa que são os locais visitados pela equipe. O mapeamento e todo o arquivo de registro desenvolvido pela equipe também são fundamentais para reconhecer a distribuição e as caraterísticas da população em situação de rua. Contudo, o mapeamento é dificultado pela migração geográfica da população, assim, impactando na continuidade do cuidado integral e longitudinal. Dessa forma, atender a PSR requer uma escuta qualificada, paciência, empatia, respeito e acolhimento livre de preconceitos e julgamentos para que a confiança entre o profissional e o usuário seja criada diariamente. Sendo assim, a imersão do acadêmico na realidade das populações vulneráveis é extremamente importante dentro do contexto de aprendizagem no âmbito universitário e como futuros profissionais da saúde, um vez que amplia nosso olhar para além da unidade básica e que envolve ações não só de prevenção e promoção à saúde, mas uma educação voltada para a realidade vivenciada pelo usuário de modo a reduzir os riscos diários. Considerações finais: A experiência no consultório de rua foi de grande relevância para nossa formação enquanto futuros profissionais de enfermagem, pois ampliou nosso olhar para além das práticas curativista e em ambiente controlado, como a UBS. As narrativas elaboradas desvelaram um campo de possibilidades de atuação da enfermagem.