PRÁTICAS PEDAGÓGICAS INTERCULTURAIS EM ATIVIDADES FORMATIVAS COM PARTEIRAS TRADICIONAIS NA AMAZÔNIA BRAGANTINA

  • Author
  • Haroldo Gonçalves de Jesus
  • Co-authors
  • Bruna Melo Amador , Maricilia Nascimento Prestes , Bnuã do Socorro Almeida Diniz , Mayana Silva dos Remédios Matos , Ellem de Tascia do Nascimento Vieira , Josias da Costa Júnior
  • Abstract
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    Apresentação: Parteiras tradicionais são interlocutoras muito conhecidas na região Norte, principalmente em comunidades rurais e ribeirinhas, devido às particularidades geográficas dos territórios e das dificuldades no acesso aos serviços de saúde, grande parte do acompanhamento das gestantes até o momento dos partos são efetuados por elas. Seus saberes e o papel que ocupam nas comunidades onde atuam enquanto agentes de saúde são notórios, por isso a necessidade da construção de saberes a partir da escuta das narrativas das parteiras. Neste sentido as práticas pedagógicas interculturais são uma alternativa para momentos de integração, atualização e capacitações por promover intercâmbios entre pessoas, conhecimentos, saberes e práticas culturalmente diferentes, buscando desenvolver um novo sentido entre elas na sua diferença. Nesta perspectiva, este trabalho objetiva relatar a experiência de desenvolvimento de ações voltadas à valorização e qualificação do trabalho das parteiras tradicionais no município de Bragança-Pará. Desenvolvimento do trabalho: Trata-se de um estudo descritivo de abordagem qualitativa, que contém relato de experiência do ciclo de atividades formativas que vêm sendo realizadas junto às parteiras tradicionais de Bragança. Para destacar as particularidades locais em face do vasto mundo amazônico, passamos a utilizar a expressão “Amazônia Bragantina”, nessa compreensão apreendem-se as expressões culturais e dinâmica das populações que transitam entre-lugar do campo/cidade dessa área do nordeste do Pará como representativas de um modo de viver na Amazônia.  As atividades formativas propostas às parteiras, fazem parte da agenda do Programa das Parteiras Tradicionais, o Programa foi reestruturado e encontra-se ativo no município desde 2018. Atualmente, 30 parteiras são vinculadas, a maioria idosas oriundas do meio rural. As ações estruturadas buscam a articulação das parteiras com as equipes de saúde dos territórios, seguindo as orientações estratégicas para redução da mortalidade materna e neonatal. Participam dos encontros profissionais como nutricionistas, técnicos de enfermagem, residentes de enfermagem em saúde da mulher e da criança e residentes de enfermagem em saúde da família, educadores físicos e pedagogos. Os encontros propõem práticas pedagógicas problematizadoras de temas que acompanham as orientações do Ministério da Saúde. Desta forma, as temáticas elencadas são construídas a partir de uma transposição didática que seja relevante para a troca de saberes na comunidade, relacionada ao ciclo gravídico e puerperal e os primeiros cuidados à criança. Assim como, são ofertados serviços para o cuidado de saúde da parteira, como vacinação, testes rápidos, rastreamento de câncer de colo e útero e mama. Os encontros realizados para execução das atividades formativas são estruturados a partir do emprego de metodologias ativas e participativas de ensino, desenvolvendo não apenas o conhecimento sobre temáticas inerentes aos cuidados com a gestante, mas também as habilidades (destrezas) e as atitudes (comportamentos) adequados aos elementos do cotidiano das parteiras. Resultados: Destacam-se três atividades realizadas com o grupo. A primeira, denominada “Pescaria e Catação de Caranguejo”,  resgatando a atividade econômica importante no cotidiano das comunidades locais, mas que também estabelece dimensão simbólica das relações de compadrio e respeito mútuo que a pesca e catação do caranguejo representam para as comunidades tradicionais na amazônia bragantina. Partindo deste pressuposto, utilizou-se como recurso didático duas piscinas plásticas uma representando a pesca, continha peixes regionais impressos em papel, e na outra representando o mangue continham os caranguejos. Cada um dos peixes e caranguejos continha um número e ao serem retirados das piscinas direcionavam a uma pergunta disparadora sobre a temática hipertensão arterial na gestação, para estabelecer a troca de experiências entre as mesmas e ressaltar a importância do acompanhamento compartilhado com a equipe de saúde do território e pontos de apoio na rede de saúde. A segunda atividade, denominada “Vira Carta das Parteiras”, foi proposta para abordar a temática da doação de leite materno, foram produzidas cartas, que no verso continham informações sobre doação de leite e amamentação. As cartas eram espalhadas no chão e ao serem viradas pelas participantes, estas eram estimuladas a discutir sobre a questão, para desmistificar mitos e ressaltar a importância das informações relevantes sobre o contexto abordado. Desencadeando aprendizagens simultâneas a partir da análise crítica e reflexiva, desenvolvendo, ainda, atitudes e comportamentos essenciais ao exercício da profissão, como tolerância, respeito às ideias diferentes das suas e autoestima. A terceira atividade foi denominada “Um Pé de Quê?”, objetivando abordar conteúdos acerca do teste do pezinho. Utilizou-se como material didático um painel construído no formato de uma árvore, cujo os frutos no formato de pés continham perguntas norteadoras. Ao serem colhidos, cada pezinho direcionava a discussão do grupo quanto a importância e o incentivo da parteira para o encaminhamento do neonato à realização do teste, período ideal de coleta, prejuízos quando não realizados e busca do resultado. Explorando os seus conhecimentos prévios, ao mesmo tempo em que buscou-se desenvolver habilidades e atitudes consideradas essenciais para sua atuação no território. Considerações finais: Sob o ponto de vista pedagógico, as técnicas e atividades adotadas atuam despertando a curiosidade e a criatividade, à medida que as parteiras e os demais profissionais envolvidos nas atividades trazem enfoques para os problemas propostos que emergem do seu processo de cuidar. Estes elementos trazidos da confluência de saberes servem de base para discussões, o que estimula o comprometimento e a sensação de que são de alguma forma, pertencentes ao tema. Assim entende-se que articular os saberes científicos aos tradicionais para produção de conhecimentos contribui para o reconhecimento das parteiras como parceiras na atenção à saúde da comunidade, pois são possuidoras de saberes intrínsecos, que não passaram pelo modelo formal de ensino/assimilação/aprendizagem das técnicas utilizadas em seus atendimentos mas tem muito a contribuir articulando seu trabalho ao SUS. Ser parteira vinculada ao programa e atuante nos encontros, nas atividades formativas e qualificações é muito significativo para essas mulheres. Os certificados emitidos a cada atividade, principalmente para as parteiras não alfabetizadas, é uma forma de legitimar e autenticar os seus conhecimentos tradicionais por esferas institucionais, que durante muito tempo não levaram em consideração esses saberes. Assim a  atenção dispensada aos processos de cuidar da gestante e do neonato vivenciados pelas parteiras, provoca um movimento de transformação da prática em saúde desenvolvida nos territórios pelas equipes de saúde ao  articular ambientes entre natureza e cultura da ação, que resgata e reconhece as “sociabilidades da amazônia bragantina”, para além do domínio das técnicas e práticas sobre a os processos curativos propiciados pelas parteiras a partir de sua inserção junto às equipes, possibilitando a todos os atores envolvidos uma compreensão e assimilação das técnicas empregadas no partejar, através de uma pedagogia que fortalece a valorização do saber tradicional.

  • Keywords
  • Prática Pedagógica, Parteiras, Educação em Saúde.
  • Subject Area
  • EIXO 1 – Educação
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