Em maio de 2024, o Rio Grande Sul enfrentou uma das maiores catástrofes climáticas da história, ocasionada por um volume grande de chuvas que levou a enchentes em diferentes municípios do estado. A capital, Porto Alegre, foi bastante afetada, o que levou a construção de abrigos provisórios para atender as vítimas dos alagamentos. Estes foram alocados em diferentes pontos da cidade como ginásios, escolas, igrejas, chegando a 147 instalações e 12,8 mil pessoas desabrigadas. Diante deste cenário, várias problemáticas foram sendo evidenciadas, entre elas a presença de doenças agudas e/ou crônicas entre as pessoas abrigadas, consequentemente sem seus medicamentos devido às inundações das suas residências. Este relato tem o objetivo descrever o acesso facilitado à terapia antirretroviral no período de calamidade pública em Porto Alegre. Em 02 de maio de 2024, instituiu-se o decreto N.º 22.647 de calamidade na cidade. Desta forma, a política de IST/HIV do município criou um instrumento de comunicação destinado aos abrigos para facilitar a solicitação da terapia antirretroviral e a entrega às PVHA. Tratava-se de um link com informações mínimas como: dados pessoais do usuário, dados do profissional responsável pela solicitação e o endereço para recebimento do medicamento. As informações eram preenchidas nos abrigos e chegavam para análise de médicos infectologistas. Estes realizavam a avaliação da situação do usuário no prontuário eletrônico, no sistema de exames e de dispensação de medicamentos. Verificada boa adesão ao tratamento e estabilidade da doença, a terapia antirretroviral era enviada por transporte rápido à PVHA. Havia opção de retirada em uma unidade dispensadora de medicamento antirretroviral mais próxima ao abrigo caso o usuário solicitasse. Na primeira semana de implantação, foram 289 solicitações e destas 207 optaram pela entrega diretamente no abrigo, 41 realizaram as retiradas no local desejado e 41 estavam em perda de seguimento necessitando de uma avaliação da equipe especializada para uma nova prescrição. Destes, 16 estavam em processo de aids avançada apresentado quadro de doença grave. A estratégia permitiu, mesmo diante de um cenário catastrófico, a identificação das PVHA e o acesso rápido à terapia antirretroviral. Evitando a interrupção do tratamento que pode levar ao aumento da viremia e agravamento do quadro. Também foi possível aos usuários a escolha entre receber no abrigo ou a retirada no local mais confortável, garantindo o sigilo do seu diagnóstico. Foi uma oportunidade importante para identificar usuários em processo de adoecimento grave. Em suma, percebe-se que a estratégia eliminou barreiras de acesso à terapia antirretroviral e oportunizou a inclusão de PVHA em perda de seguimento a reintegração ao seu tratamento.