Apresentação: Quando os primeiros imigrantes pomeranos chegaram ao distrito de Melgaço, no Espírito Santo, entre 1857 e 1873, enfrentaram grandes desafios no processo de desbravamento. A falta de equipamentos adequados para a lavoura e a ausência de assistência governamental, aliadas às dificuldades linguísticas, contribuíram para o isolamento significativo dessa comunidade, que hoje é reconhecida como um dos Povos e Comunidades Tradicionais brasileiros. Atualmente, o idioma pomerano é um traço marcante dessa cultura, e alguns descendentes comunicam-se exclusivamente em sua língua materna, sem compreender o Português, o qual chamam de “brasileiro”. É necessário considerar que a barreira linguística dificulta a compreensão mútua, silenciando tanto as queixas do paciente, quanto as orientações e cuidados do profissional.
Desenvolvimento do trabalho: Trata-se de um relato de experiência, que consistiu na associação de orientações de saúde bucal no idioma pomerano, durante atendimento odontológico na Atenção Primária, em distrito pomerano no município de Domingos Martins. A necessidade de tradução da fala dos profissionais de saúde foi entendida ao observar que os pacientes de origem pomerana, embora tivessem a comunicação básica em português, tinham dificuldade de entender orientações mais específicas, ou explicar sua situação de saúde. Na ocasião, a cirurgiã-dentista (CD) realizava as orientações, e a mediação era realizada pela auxiliar de saúde bucal (ASB). As orientações em português eram feitas também direcionadas ao olhar do paciente, de forma a criar vínculos, mas repetidas em pomerano pela ASB em seguida.
Resultados: A tradução para pomerano foi utilizada principalmente para orientações pós-cirúrgicas e escovação dental supervisionada, situações em que o sucesso do tratamento depende significativamente da adesão do paciente às orientações. Também foi importante nos encaminhamentos a outros serviços e profissionais, garantindo que os pacientes compreendessem plenamente o seguimento do tratamento. O número de faltas diminuiu quando a data e o horário da próxima consulta eram repetidos em pomerano, pois muitos pacientes tinham dificuldade em entender datas e números em português. No caso dos pacientes infantis, a tradução mostrou-se particularmente útil para facilitar a colaboração durante procedimentos. A maioria das crianças da comunidade aprende apenas o idioma pomerano e entra em contato com o português na fase escolar. As crianças em idade pré-escolar, portanto, sentiam-se mais acolhidas quando atendidas em pomerano. A CD dedicou-se a aprender algumas expressões em pomerano, embora isso não garantisse uma comunicação ou entendimento completo do que precisava ser transmitido. Entretanto, essa iniciativa ajudou a criar vínculo com os pacientes e melhorar a aceitação dos tratamentos. Os pacientes sentiam que sua cultura era respeitada e viam o interesse genuíno da equipe em acolhê-los e cuidar deles.
Considerações finais: A tradução nas consultas odontológicas resultou em maior adesão ao tratamento, redução no número de faltas, estabelecimento de vínculo e maior facilidade no condicionamento das crianças. Em um cenário ideal, recomenda-se que todos os profissionais sejam fluentes no idioma pomerano. No entanto, caso isso não seja possível, é fundamental que ao menos um membro da equipe tenha habilidade para mediar a comunicação entre o “brasileiro” e o pomerano falado na comunidade.