Introdução: Os desafios contemporâneos enfrentados no âmbito da saúde mental são caracterizados por complexidades influenciadas pela evolução da percepção da loucura e pelas dinâmicas sociais. A psiquiatria tradicional é uma contribuinte para uma cultura intolerante que afeta especialmente os estudantes universitários, um grupo com alta incidência de transtornos mentais. Esses estudantes enfrentam pressões acadêmicas, mudanças pessoais e adversidades socioeconômicas, incluindo o racismo, que é uma ideologia com concepções individualista, institucional e estrutural. A abordagem individualista simplifica o racismo como ações “patológicas” ou “irracionais” de indivíduos, ignorando suas raízes políticas e estruturais. A visão institucional reconhece o papel das instituições na perpetuação das desigualdades raciais, enquanto a abordagem estrutural entende que o racismo está enraizado nas estruturas sociais, econômicas e políticas, sendo parte fundamental da organização da sociedade. As disparidades educacionais entre brancos e pretos não se limitam apenas a processos discriminatórios no ambiente educacional, mas são também influenciadas por uma série de variáveis, como renda, residência, estrutura familiar, nível educacional dos pais e características do sistema de ensino. O racismo científico, a patologização das diferenças e a negação das identidades afetam negativamente a saúde mental, criando barreiras para a inclusão e permanência de estudantes pretos no ensino superior. Portanto, é crucial compreender os desafios enfrentados por estes estudantes, cujas experiencias de discriminação racial têm grandes implicações em seu bem-estar psicologico. Assim, este estudo objetiva caracterizar o perfil sociodemográfico desses estudantes e analisar suas vivências de discriminação racial, bem como suas preocupações com o racismo. Ao identificar fatores de risco, o estudo visa contribuir para o desenvolvimento de intervenções e políticas eficazes que promovam o bem-estar psicológico e a inclusão acadêmica, mitigando os impactos negativos da discriminação racial. Metodologia: Trata-se de um recorte de uma pesquisa mais abrangente intitulada “Discriminação Racial e Saúde Mental dos Estudantes Universitários”. A amostra foi composta por 833 estudantes universitários, dos quais 829 forneceram respostas válidas após consentirem em participar do estudo. A coleta de dados ocorreu entre 9 de setembro de 2023 e 4 de janeiro de 2024. O instrumento utilizado para avaliar as experiências de discriminação dos participantes consiste na Escala de Experiências de Discriminação, composta por nove itens que abordam diversas situações em que a discriminação pode ocorrer, tais como ambiente escolar, ambiente de trabalho e processo de busca por emprego. As respostas foram categorizadas em dois grupos: "baixa exposição à discriminação" e "alta exposição à discriminação", visando facilitar a análise dos dados. Além disso, a dimensão de Preocupação com a Discriminação foi explorada por meio de três questões que avaliam o grau de preocupação dos participantes em relação à discriminação em diferentes contextos. Assim como na escala anterior, as respostas foram agrupadas em "baixa exposição à preocupação com a discriminação" e "alta exposição à preocupação com a discriminação", para fins de análise. Resultados: Os dados sociodemográficos quanto ao gênero, revelaram que, o fato de haver uma maioria feminina (52,7%) na amostra pode indicar uma tendência de maior participação de mulheres em pesquisas sociais ou uma verdadeira disparidade de gênero na população estudada, e uma distribuição significativa de participantes não-binário (0,5%) e os que preferiram não se identificar (0,4%), ressaltando a importância da diversidade em uma ampla gama de identidades. Em relação a idade, a concentração dos participantes concentrou-se na faixa etária de 18 a 25 anos, sugerindo que o estudo pode estar centrado em questões relevantes como educação, emprego e discriminação. A predominância da raça parda na amostra (58,1%), assim destacando uma possível desigualdade socioeconômica e oportunidades educacionais em relação aos indivíduos pretos (12,4%). A renda entre 1 a 2 salários mínimos (37,3%) teve predominância, assim como os católicos (59,3%). Ao fazer a análise quanto aos dados sobre discriminação racial, observa-se uma exposição generalizada nos mais diversificados contextos, incluindo a escola, trabalho, na rua ou ao procurar um emprego, onde entre estes a escola se destacou na alta exposição (31,5%). A disparidade nessas exposições à discriminação ressaltam uma complexidade das experiencias individuais e destacam a grande necessidade de abordagens para lidar com essas diversificadas formas de discriminação, assim, como sugerem que a discriminação continua sendo uma preocupação significante para a maioria dos participantes no último ano quando questionados tanto sobre a forma de tratamento injusto por causa da raça ou cor da pele com seu grupo racial (70,2%), quanto em relação aos outros quanto a si mesmos (56,2%), essas preocupações sugerem um reconhecimento das desigualdades raciais. A diferença nas preocupações ao longo do tempo, particularmente entre a infância/adolescência e o último ano, pode refletir mudanças na percepção ou experiência pessoal dos participantes em relação à discriminação racial, destacando a importância de considerar o desenvolvimento e as trajetórias de vida ao examinar as preocupações com a discriminação racial. A relação entre a discriminação e gênero revela diferenças grandiosas na forma como cada gênero responde à discriminação. Enquanto as mulheres tendem a falar mais sobre o assunto, os homens são mais propensos a guardar para si mesmo. Essa discrepância pode refletir normas de gênero relacionadas à expressão emocional e busca de apoio social, ressaltando a importância de considerar as complexidades das identidades de gênero ao abordar a discriminação e suas consequências. Essas descobertas têm implicações importantes para o desenvolvimento de intervenções e políticas que visam mitigar a discriminação e promover a igualdade de gênero e racial em diferentes contextos sociais. Conclusão: É evidente que estudantes universitários enfrentam diversos desafios complexos e multifacetados. Em particular, aqueles estudantes de origem racialmente minoritária, que frequentemente são alvos de discriminação racial persistente em diversos ambientes acadêmicos e sociais. Tal exposição contínua a preconceitos retrógrados impõe um impacto negativo na saúde mental desses indivíduos, assim, exacerbando a necessidade de um ambiente universitário mais inclusivo e acolhedor. Para promover tal ambiente equitativo, é primordial implementar políticas educacionais inclusivas e programas de apoio psicológico adaptados às necessidades específicas desses estudantes. A implementação de tais políticas e programas é imprescindível para a garantia de que todos os estudantes possam prosperar academicamente e pessoalmente, refletindo um verdadeiro progresso social. Além disso, é essencial aumentar a conscientização sobre o racismo e desenvolver ações concretas para combatê-lo, contribuindo assim, para uma sociedade mais justa. Este compromisso com a inclusão e a equidade é fundamental para o avanço social e acadêmico de toda a comunidade universitária.