Um desafio para a atenção primária: a sífilis congênita no município de Nova Iguaçu / RJ

  • Author
  • Vitória Machado Santos Bastos
  • Co-authors
  • Sandra Vitória Thuler Pimentel , Gabriela Quaresma Vasconcelos , Helia Kawa , Sandra da Costa Fonseca , Edna Yooko Massae
  • Abstract
  • Apresentação: A sífilis persiste como problema de saúde pública brasileiro e tem mostrado tendência crescente. Nesse contexto, desde 2017, o 3º sábado de outubro foi instituído como Dia Nacional de Combate à Sífilis e à Sífilis Congênita (SC). O objetivo é estimular a participação dos profissionais e gestores de saúde, enfatizando a importância do diagnóstico e tratamento adequados da sífilis na gestante durante o pré-natal, e em ambos os sexos como infecção sexualmente transmissível. A SC, adquirida por transmissão vertical, é um evento sentinela da qualidade do pré-natal, pois pode ser evitada por diagnóstico precoce e tratamento adequado da gestante, ambos disponíveis no SUS. Em 2021, o Ministério da Saúde instituiu a Campanha Nacional de combate às Sífilis, que objetiva a conscientização da população sobre infecções sexualmente transmissíveis (ISTs), e lançou o Guia para Certificação da Eliminação da Transmissão Vertical de HIV/Sífilis. Entretanto, ainda são observadas altas taxas de incidência de SC em nível nacional e estadual. Em 2022, foram registrados, no Brasil, 26.468 casos de SC com 200 óbitos e o estado do Rio de Janeiro (ERJ) foi a unidade federativa com a taxa mais elevada no mesmo ano. Merece destaque no ERJ o município de Nova Iguaçu, localizado na região Metropolitana I, que passou de 15,73/mil nascidos vivos (NV) em 2012 para 55,75/mil NV em 2021, mais de 111 vezes a meta estabelecida pela OMS/MS de 0,5/mil NV. Nova Iguaçu possui a quarta maior população do estado (825.388 em 2021), além de apresentar um IDH de 0,713, considerado alto. Com o objetivo de reduzir o agravo, o ERJ criou, em 2019, o Programa Estadual de Financiamento da Atenção Primária à Saúde, baseado em indicadores selecionados anualmente. Foram incluídos, entre outros, o indicador 4: proporção de NV de mães com 7 ou mais consultas de pré-natal, tendo como meta 75%; e o indicador 6: número de casos novos de SC em menores de 1 ano, com a meta de redução de 5% em relação ao ano anterior. Nos anos subsequentes ao Programa, o ERJ não alcançou a meta na proporção de NV de mães com 7 ou mais consultas, ficando com 71,4% (2020) e 71,8% (2021). Entre os anos de 2019 e 2021, o ERJ apresentou um incremento de 13,3% no número de casos de SC. Outros municípios da região metropolitana do ERJ reforçam essa realidade e apontam a necessidade de melhoria na qualidade do pré-natal oferecido no estado. Na cidade do Rio de Janeiro, a taxa de incidência de SC, em 2020, alcançou 18,65/mil NV. Em Niterói foi encontrado de 2007-2016 um aumento de 16%/ano na taxa de SC e em São Gonçalo o período de maior aumento foi de 2010-2015, representando 51,1%/ano. O objetivo deste trabalho é analisar a tendência temporal e os indicadores epidemiológicos da SC no município de Nova Iguaçu (RJ) no período de 2012 a 2021, levando-se em conta características maternas e da atenção primária no município. O estudo local sobre a ocorrência da doença se faz necessário para obter informações acerca da assistência prestada e contribuir na elaboração de medidas pertinentes de enfrentamento da enfermidade. Desenvolvimento do trabalho: Utilizaram-se dados secundários relativos à SC no município de Nova Iguaçu, disponíveis no Sistema de Informação e Agravos de Notificação (SINAN) ), do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) e no Sistema de Informação do Nascido (SINASC) acessados através da página da Secretaria Estadual de Saúde do ERJ, no período de 2012-2021, considerando idade da mãe, escolaridade, cor/raça, realização de pré-natal, momento do diagnóstico, tratamento materno e do parceiro. Para analisar a tendência temporal, utilizou-se o programa Joinpoint Regression. Foram consultados os Painéis de Indicadores da Atenção Primária à Saúde para informações sobre ações na atenção primária. Resultados: No período de 2012 a 2021 foram notificados 3274 casos de SC em Nova Iguaçu, alcançando uma incidência de 55,75/mil NV em 2021. A tendência temporal mostrou um crescimento na taxa de 2012 a 2021 de 14,5%/ano (IC: 5,4 a 24,4). Em 2021, a mortalidade infantil por SC (44,09/100 mil NV) foi mais de 6 vezes a nacional (7/100 mil NV) e 2 vezes maior que a estadual (22,6/100 mil NV).  Em relação às características maternas, as maiores incidências foram nos grupos com baixa escolaridade (47,1/mil NV), de 10 a 19 anos (37,8/mil NV) e de cor parda (28,6/mil NV). O pré-natal foi realizado em 71,2% dos casos, sendo a incidência no grupo que não realizou o pré-natal (174,9/mil NV), quase 9 vezes superior ao de mulheres acompanhadas (20,8/mil NV). O diagnóstico de sífilis materna foi feito durante o pré-natal em menos da metade (29,4%) dos casos, e, ainda assim, somente 2,4% receberam tratamento considerado adequado. Quanto aos serviços de saúde do município, observa-se que em 2020, a cobertura da população pela Atenção Básica era 69,5%, superior à do Estado (58,9%), e a cobertura da população por ACS foi de 41,2%. O município contava com 113 equipes de Saúde da família vinculadas a uma Equipe da Estratégia Saúde da Família e 60 equipes na Atenção Básica Tradicional, inferior ao mínimo de 207 preconizadas pelo Ministério da Saúde. Além disso, a proporção de gestantes com realização de exames para sífilis e HIV durante o pré-natal é baixa: em 2020, foi de 55%, ou seja, quase a metade das gestantes não foram testadas para sífilis durante o pré-natal, o que impossibilita o diagnóstico oportuno e o tratamento adequado da gestante e do parceiro para assim evitar a transmissão vertical. Considerações finais: A incidência de SC em Nova Iguaçu é elevada, crescente, desigual e distante da meta estabelecida pela OMS/MS de 0,5/mil NV. Falhas quantitativas e qualitativas estão presentes no pré-natal em relação ao agravo.  A cobertura pela atenção básica no município é insuficiente, principalmente ao se considerar a baixa cobertura por ACS, cujo papel é fundamental na busca ativa para a realização do pré-natal. As gestantes mais acometidas são as adolescentes, pardas e com baixa escolaridade. Os gestores municipais devem incorporar ao seu planejamento de ações, o uso de indicadores como meta, visando alcançar melhor desempenho das equipes na detecção de casos, adoção de medidas para controle da sífilis e, por conseguinte, aprimoramento do serviço ofertado para a população. Portanto, se faz necessário o desenvolvimento de estratégias por parte de gestores e profissionais da atenção básica que envolva a captação e adesão dos grupos mais vulneráveis, reduzindo a desigualdade. Além disso, é fundamental a educação continuada para que os profissionais de saúde estejam sempre atualizados, além da disponibilidade de testes diagnósticos e do tratamento nos serviços de saúde, visando promover a saúde materna, proporcionar uma gravidez saudável e controlar a endemia no município.

  • Keywords
  • Sífilis congênita, pré-natal, tendência temporal
  • Subject Area
  • EIXO 3 – Gestão
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