O uso dos grafismos como bahsese–uma técnica de cura dos povos indígenas no Brasil

  • Author
  • Alexandra de Paula Oliveira
  • Co-authors
  • Fabiana Mânica Martins , Raniele Alana Lima Alves , Edson César dos Santos Seixas , Lynda Beckman do Carmo , Catarina Vitória Ozorio Paz , Danielly Modesto de Souza , Luiz Felipe da Silva Oliveira , Anne Vitória Ramos Beltrão
  • Abstract
  • Tema: O uso dos grafismos como bahsese–uma técnica de cura dos povos indígenas no Brasil

     

    Apresentação:

    Este resumo tem como objetivo compartilhar a experiência de escrita científica sobre os usos medicinais dos grafismos indígenas dentro do projeto de Iniciação Científica “Grafismos como técnica de cura e prevenção de doenças entre as diferentes comunidades indígenas”, sendo assim, um relato de experiência. Os grafismos são uma técnica própria dos indígenas que habitam o Brasil, sendo aplicadas para diversos fins,como por exemplo: como identificação de status social, idade, gênero; comemoração de datas significativas; para uso ritualístico; para emprestar “força” ao usuário; e também para proteção, prevenção de doenças e também para a cura de diversos problemas de saúde física e (ou) espirituais. Estes últimos ainda não foram a temática principal de pesquisas, sempre sendo analisados ora ao lado de outras técnicas de cura, ora ao lado de outros usos dos grafismos. Diante dessa lacuna na literatura surgiu a ideia de conduzir uma pesquisa aprofundando-se no uso de grafismos como bahsese – um elemento de cura. 

     

    Desenvolvimento

    O projeto de pesquisa será de cunho qualitativo, epistemológico e fenomenológico, e realizado entre os anos de 2024-2025, sendo, antes do início das atividades, submetido à avaliação pela “Comissão Nacional de Ética em Pesquisa” por ter como participantes pessoas indígenas. Consistirá de duas etapas, sendo a primeira etapa uma pesquisa bibliográfica sobre o estado da arte da literatura sobre grafismos na saúde, e os resultados dessa análise serão comparados com as informações coletadas na segunda etapa, que irá consistir de  entrevistas semiestruturadas feitas com “kumus” (os praticantes da medicina indígena entre os povos amazônicos do Alto Rio Negro - ARN), grafistas e praticantes da medicina indígena que residem na cidade de Manaus, capital do Estado do Amazonas. 

    A escolha da cidade se dá por conta de que nela se localizam o “Parque das tribos”, uma comunidade indígena urbana, cujos moradores muitas vezes transitam tanto entre o cenário urbano, quanto em suas comunidades de origem; e o “Centro de Medicina Indígena Bahserikowi”, onde os kumus realizam vários métodos de Bahsese. Esses dois locais serão instrumentais para o contato com os praticantes das artes do grafismo – artes porque reconhecemos que diferentes povos têm concepções diferentes dos grafismos medicinais. A pesquisa não irá se limitar a entender as práticas de saúde de uma única comunidade, mas sim dos vários povos em contexto urbano na cidade de Manaus.

     Os participantes serão convidados por meio de divulgações em redes sociais pelas quais eles serão informados e convidados. Em seguida, se fará captação bola-de-neve, e deverão assinar um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido - TCLE. As entrevistas serão realizadas de forma semiestruturada, seguindo um formulário elaborado antecipadamente pelos autores da pesquisa, mas de modo a ter a flexibilização que venha a possibilitar que perguntas sejam adicionadas, de acordo com as respostas dos participantes, ou seja, que caso as respostas necessitem de perguntas específicas, que o formulário seja adaptado para tal. 

    O desenho do estudo foi motivado pela ideia de observar e descrever o fenômeno dos grafismos de cura, e, por mais que trate de uma temática da área da saúde, será interepistêmico, levando em consideração que a concepção de saúde e as relações entre as esferas física-mental-espiritual para os povos indígenas são completamente diferentes das noções da medicina biomédica,  portanto, não podem ser compreendidas apenas por esse viés. 

     

    Resultados: 

    Através do encaminhamento, da aplicabilidade e dos resultados dessa pesquisa espera-se trazer visibilidade para a perspectiva indígena sobre a saúde e o bem-estar, além da possibilidade de poder vir a contribuir para a discussão da compreensão ampliada sobre esses temas, e também valorizar as práticas tradicionais dos povos indígenas e reafirmar a necessidade de que essas sejam respeitadas por profissionais de saúde inseridos no contexto biomédico. Existe uma falta de entendimento e em muitas ocasiões, também o desrespeito por parte de outras culturas e do homem ocidental em relação à cultura dos povos ancestrais, e existe a necessidade da valorização dessas práticas, para que venham a não ser vistas como maneiras de negação da medicina biomédica, mas como um novo olhar em relação às práticas de significância cultural, essas que podem ser benéficas no sentido de coexistir com outros tratamentos, promovendo abordagens integrativas entre dois modos de fazer-saúde. 

     Buscamos, ainda, analisar o impacto que o convívio entre diferentes povos num mesmo ambiente — o urbano — pode ou não ter nas práticas tradicionais de grafismo: elas são modificadas? Permanecem as mesmas? É possível haver o sincretismo entre práticas fechadas (ou seja, praticadas exclusivamente por um povo) de comunidades com cosmologias tão diferentes, apenas porque elas compartilham o uso da tinta e pincel? 

    Assim sendo, os objetivos específicos do projeto incluem investigar como diferentes sociedades indígenas utilizam o grafismo, catalogar quem desenha os grafismos e em quais contextos, analisar qual a simbologia ou associação espiritual por trás dos grafismos e investigar se essas práticas se limitam a uma etnia ou se povos diferentes trocam técnicas de grafismos medicinais.  

     

    Considerações finais:

    Os povos indígenas possuem compreensões próprias do processo saúde-doença e do próprio conceito de saúde, esse que muitas vezes sequer pode ser traduzido para outras linguagens, além daquela do povo que a concebeu. Muitas vezes a cultura ocidental não entende a importância dessas visões de saúde, e essa falta de entendimento faz com que elas sejam julgadas pelas lentes do modelo biomédico de saúde, e não como práticas inseridas dentro de uma visão de mundo e cultura únicos.

    Esse comportamento típico, com origem na colonização, é comum em todas as localidades, povoados e aldeias indígenas e principalmente notado nos povos do ARN, esses que tiveram sua cultura e costumes suprimidos pelos colonizadores e pelas companhias religiosas que se estabeleceram naquela região, pertencente à Amazônia brasileira. Entretanto, apesar da colonização, essas práticas sobreviveram e são realizadas até hoje. É importante para os autores evidenciar a prática do bahsese na atualidade para mostrar que esses povos sobrevivem e vivem apesar da colonização e preconceito, e que suas técnicas medicinais não são algo restrito ao passado ou que deve ser “superado” pelo advento da medicina ocidental. A pesquisa busca valorizar a cultura dos povos indígenas e do seu modo ancestral de fazer saúde e que ainda é praticado por eles na atualidade

  • Keywords
  • Sistemas Médicos Complexos Tradicionais, Profissionais de Medicina Tradicional, Integralidade em Saúde
  • Subject Area
  • EIXO 5 – Saúde, Cultura e Arte
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