A Política Nacional de Saúde Mental foi instituída no ano de 2001 através da aprovação da Lei Federal 10.216. Posteriormente, em 2011, foi criada a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) por meio da Portaria nº 3.088 de 23 de dezembro, com o objetivo de criar, expandir e articular pontos de atenção à saúde para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e necessidades relacionadas ao uso de crack, álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Essa rede é composta por um conjunto interligado e coordenado de diversos serviços e um dos serviços ofertados são os leitos em Unidades de Saúde Mental dentro de hospitais gerais, que será o foco do presente trabalho. Este é um estudo descritivo, de abordagem qualitativa do tipo relato de experiência. O objetivo do trabalho é relatar as experiências de estudantes de Enfermagem durante atividades práticas em uma Unidade de Saúde Mental. As atividades foram realizadas por cinco acadêmicos do 5º semestre do curso de Enfermagem da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA) durante as aulas práticas do componente curricular de Gestão do Cuidado II na Unidade de Saúde Mental de um hospital geral localizado em um município da Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul, no período de março a abril de 2024. A Unidade foi inaugurada no ano de 2022. Com relação a infraestrutura, a unidade apresenta um hall de entrada, 3 consultórios, 1 posto de enfermagem, 1 quarto coletivo feminino, 1 quarto coletivo masculino, 1 quarto privativo feminino, 1 quarto privativo masculino, banheiros para os usuários, banheiro para os profissionais, refeitório e pátio. A unidade conta com uma equipe multiprofissional formada por 2 enfermeiros, 8 técnicos de enfermagem, um médico psiquiatra e um clínico geral, uma assistente social, uma psicóloga e uma pedagoga. Durante as vivências foi possível observar a dinâmica de funcionamento da unidade e as práticas de cuidado estabelecidas pela equipe multiprofissional para abordagem aos usuários internados. Foram evidenciados alguns fatores que contribuem para a presença de lacunas no cuidado aos usuários, como: barreiras no acolhimento, dificuldade de realização de uma escuta ativa e empática, restrição de visitas dos familiares aos usuários, falta de orientações acerca das medicações administradas, falta de planejamento da reinserção social dos usuários, ruídos na comunicação entre os profissionais da equipe e problemas relacionados à infraestrutura. Observa-se a alta demanda por tratamentos que desenvolvam principalmente a comunicação efetiva entre a equipe e o usuário, abordando o reconhecimento dos cuidados prestados ao usuário, bem como a oferta de autonomia sobre o seu próprio tratamento. Vale destacar a importância dos grupos de convivência que a unidade possui, no qual os usuários podem compartilhar seus sentimentos, experiências e sobre suas vidas. Entretanto, há poucos profissionais participando desses momentos, o que poderia ser uma oportunidade de conhecer um pouco mais sobre o contexto de vida dos usuários para além do que é descrito no prontuário. Durante as atividades práticas, também foi observado a insegurança de alguns profissionais da equipe em relação à abordagem em situações de crise, onde havia pouco espaço para diálogo e negociação diante das demandas trazidas pelos usuários. Além disso, falas carregadas de preconceitos e estigmas podem ser evidenciadas no cotidiano das práticas dentro da unidade, o que acaba reforçando estereótipos negativos sobre as pessoas com transtornos mentais ou que fazem uso de substâncias psicoativas, criando barreiras no processo de cuidar e dificultando ainda mais a criação de vínculo. Neste contexto, reflete-se que as barreiras em relação a comunicação entre equipe e usuários podem ser geradoras de ansiedade, irritabilidade e angústia às pessoas hospitalizadas em unidade de saúde mental. Em contrapartida, compreende-se que, em tais situações, o uso de tecnologias leves deveriam ser consideradas como balizadoras no processo de cuidado, estimulando a autonomia e corresponsabilização, promovendo a escuta ativa e vínculo entre usuário e profissional. Para a adoção de um cuidado eficaz em saúde mental dentro de hospitais gerais é preciso que os trabalhadores tenham compromisso com a produção de novas práticas de cuidar que levem em consideração os aspectos biopsicossociais de cada usuário. Nesse cenário, considera-se imperativo a necessidade de iniciativas por parte das instituições de saúde no sentido de promover capacitações para qualificação dos profissionais para atuarem na área da saúde mental, a fim de que sejam adotadas estratégias de cuidado mais humanizadas dentro dos serviços. Especialmente no tocante aos profissionais de enfermagem, vêm sendo apontadas pela literatura algumas barreiras enfrentadas para o cuidado aos usuários com demandas de saúde mental no hospital geral, sendo as principais, a falta de conhecimento e habilidade no cuidado à pessoa que sofre mentalmente. Estas circunstâncias, podem potencializar o sofrimento dos usuários, bem como interferir negativamente no processo de recuperação durante a internação. Neste sentido, estudos reafirmam a necessidade de qualificar enfermeiros generalistas para cuidarem adequadamente dos pacientes com transtornos mentais, sugerindo a atuação de enfermeiros especialistas por meio da interconsulta de enfermagem psiquiátrica no hospital geral, auxiliando-os na condução do processo de cuidar em saúde mental. Outro ponto importante a ser destacado, refere-se à dificuldade de articulação da unidade de saúde mental com outros serviços da rede de atenção psicossocial do município. Neste contexto, vislumbra-se que a integração dos serviços garantiria a superação da fragmentação do cuidado através do compartilhamento de saberes entre os profissionais da rede e auxiliaria na pactuação de estratégias de transição do cuidado de forma conjunta. Além disso, a discussão dos casos entre as diferentes equipes propicia um melhor planejamento da reinserção social dos usuários após a alta hospitalar. Assim, através dessa inserção do paciente na rede, a reincidência de novas internações poderia ser evitada. Por fim, considera-se que as experiências dentro da Unidade de Saúde Mental em um hospital geral foram essenciais para aplicar os conhecimentos teóricos aprendidos em sala de aula. Além disso, as acadêmicas puderam aprimorar habilidades interpessoais, de comunicação, empatia e trabalho em equipe, agregando na vida acadêmica e pessoal. Ante ao exposto, destaca-se a necessidade da educação continuada e sistemática das equipes multiprofissionais que atuam em unidades de saúde mental de hospitais gerais, a fim de que possam aperfeiçoar constantemente as suas habilidades, conhecimentos e competências na atuação profissional, ofertando assim um cuidado de qualidade, humanizado, integral e individualizado.