Autopercepção do consumo alimentar em indivíduos com alto risco para desenvolver DM2 segundo raça: análise dos dados basais do PROVEN-DIA

  • Author
  • Danielle Cristina Fonseca
  • Co-authors
  • Thatiane Lopes Valentim Di Paschoale Ostolin , Camila Martins Trevisan , Raira Pagano , Olivia Garbin Koller , Andria Volz Andreia , Jussara Carnevale de Almeida , Ângela Cristine Bersch Ferreira
  • Abstract
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    Apresentação:

    Minorias raciais sofrem de maneira mais intensa com os determinantes sociais da saúde, incluindo maiores índices de diagnósticos tardios de Diabetes do tipo 2 e, por consequência, mais complicações decorrentes da doença. Diante disso, indivíduos de minorias raciais apresentam maiores valores de marcadores do controle glicêmico, sobretudo glicemia em jejum e hemoglobina glicada. No mundo, 3 em cada 4 adultos com Diabetes Mellitus do tipo 2 são de países de baixa e média renda. E, por isso, a análise do risco de Diabetes Mellitus do tipo 2 comumente considera a raça para determinar o risco. Ainda, mulheres de minorias raciais tendem a ter mais deficiências de micronutrientes. A prevenção do diabetes tipo 2 é amplamente influenciada pelo consumo alimentar e, para tanto, é essencial reconhecer a relação entre raça no risco de desenvolver a Diabetes Mellitus do tipo 2, mas também seu papel na prevenção. Diante disso, estratégias de prevenção devem ser sensíveis às diferenças sociodemográficas e culturais, visando promover hábitos alimentares saudáveis e abordar desigualdades estruturais, garantindo acesso à alimentação adequada e saudável por todas as comunidades. Para tanto, faz-se necessário compreender o consumo alimentar, sobretudo a partir de ferramentas práticas e de fácil assimilação para o paciente. Neste sentido, a teia alimentar é uma ferramenta em que o indivíduo avalia sua alimentação através da autopercepção do consumo alimentar separada em 11 grupos alimentares e água. Tais grupos contemplam carne vermelha, bebida açucarada, peixes, sementes e nozes, frutas, verduras e legumes, ultraprocessados, laticínios, embutidos, leguminosas e grãos integrais. Para cada grupo de alimentos, o participante deve referir se considera seu consumo ótimo, muito bom, bom, ruim ou péssimo de acordo com as porções recomendadas por dia ou semana. A qualidade da dieta avaliada pela autopercepção se associa com outros índices validados (a exemplo do Health Eating Index 2020). Além disso, a ferramenta pode contribuir para o aconselhamento nutricional, bem como favorecer a centralidade do cuidado ao estimular a participação ativa do paciente na conscientização sobre a qualidade de sua dieta e, consequentemente, na tomada de decisão na relação entre saúde e cuidado. Dada sua apresentação visual, a ferramenta se torna atrativa e amigável aos pacientes oportunizando sua utilização na prática clínica. Portanto, o objetivo do presente estudo é comparar o consumo alimentar por meio do uso da Teia Alimentar em adultos com alto risco de desenvolver Diabetes Mellitus tipo 2 estratificados segundo raça.

    Desenvolvimento do trabalho:

    O presente estudo refere-se a uma análise transversal dos dados coletados na visita basal dos 220 participantes do ensaio clínico multicêntrico controlado e randomizado PROVEN-DIA (ClinicalTrials NCT05689658) piloto, cujo objetivo foi avaliar a eficácia do Programa Brasileiro de Prevenção de Diabetes no nível de atividade física e consumo alimentar em adultos com alto risco para Diabetes Mellitus do tipo 2. O PROVEN-DIA foi conduzido pela BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo em parceria com o Ministério da Saúde via Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde (PROADI-SUS). Foram elegíveis ao estudo adultos com alto risco para Diabetes Mellitus do tipo 2, isto é, presença de sobrepeso, inatividade física, hipertensão, histórico familiar de Diabetes Mellitus do tipo 2 e/ou diabetes gestacional, idade acima de 40 anos e sexo masculino). Dados demográficos e socioeconômicos, incluindo a idade, o sexo, o estado civil, a escolaridade, a raça autodeclarada e o nível socioeconômico foram obtidos. A raça foi autodeclarada em brancos, pardos, negros e outros. Além disso, foram obtidos dados relativos ao consumo alimentar por meio do uso da Teia Alimentar em sua apresentação gráfica em associação à recomendação de consumo. Conforme descrito anteriormente, a percepção sobre o consumo alimentar poderia ser referida como ótima, muito boa, boa, ruim ou péssima de acordo com as porções recomendadas por dia ou semana. Os participantes que referiram um consumo “ótimo”, “muito bom” e “bom” foram agrupados em consumo adequado conforme a recomendação para a prevenção cardiovascular, enquanto aqueles que declararam “ruim” e “péssimo” como inadequado. A priori, os dados foram analisados descritivamente. Em seguida, o consumo alimentar foi comparado entre os grupos por meio da realização da análise de qui-quadrado ou teste exato de Fisher. A significância estatística foi fixada em p < 0,05 (bi-caudal).

    Resultados:

    Dentre os participantes avaliados, 158 eram mulheres (71,8%) com idade média de 49±10 anos, 64 se declararam brancos (29%), 90 pardos (41%), 63 negros (29%) e três participantes se declararam com outras raças (1%). Sendo assim, devido ao pequeno número amostral, estes três autodeclarados de outras raças foram excluídos desta análise. Quanto à percepção do consumo alimentar dos 11 grupos da Teia Alimentar entre as raças, observamos que participantes da raça negra relataram uma menor adequação de consumo de frutas (52% vs 77% vs 62%), lácteos (59% vs 72% vs 77%) e peixes (24% vs 45% vs 33%) quando comparados com aqueles que se declararam brancos ou pardos, respectivamente. Além disso, participantes de raça negra mais frequentemente relataram um consumo adequado de carne vermelha (71%) do que brancos (56%) e pardos (52%). Não houve diferenças entre o consumo para vegetais (53 a 61%), cereais integrais (27 a 36%), leguminosas (82 a 93%), oleaginosas (25 a 28%), carnes processadas (69 a 78%), bebidas açucaradas (62 a 70%) e alimentos ultraprocessados (60 a 63%) entre os três grupos raciais.

    Considerações finais:

    Com base no uso da Teia Alimentar para avaliar percepção do consumo alimentar, indivíduos com alto risco para desenvolver Diabetes Mellitus do tipo 2 difere segundo a raça. Participantes negros relataram uma menor adequação de consumo de frutas, lácteos e peixes quando comparados com aqueles que se declararam brancos ou pardos. Em contrapartida, relataram com maior frequência consumo adequado de carne vermelha conforme a recomendação quando comparados com brancos e pardos. A utilização da teia alimentar pode favorecer a identificação de oportunidades de mudanças em prol de uma alimentação adequada e saudável, mas esta hipótese precisa ser testada a partir da análise dos dados experimentais. A relação entre raça, poder econômico e custo de alimentos precisa ser também explorada na prevenção do diabetes uma vez que a capacidade de aquisição de alimentos pode exercer grande influência na aderência as recomendações.

  • Keywords
  • Grupos Raciais; Fatores Raciais; Teia Alimentar; Alimentos, Dieta e Nutrição
  • Subject Area
  • EIXO 6 – Direito à Saúde e Relações Étnico-Raciais, de Classe, Gênero e Sexualidade
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