Introdução: A incorporação de um modelo de gestão centrada na relação público-privada, por meio da contratação de uma Organização Social (OS), tem implicações na organização do Sistema Único de Saúde (SUS), sobretudo na gestão dos processos gerenciais e assistenciais do trabalho em saúde, reverberando na exploração da força de trabalho e no processo de privatização do SUS. Este fenômeno expressa, de forma ampla, dois outros fenômenos históricos intimamente relacionados: o aprofundamento da inserção de modelos gerenciais próprios da iniciativa privada no modelo estrutural do SUS, como resultado das contrarreformas do Estado brasileiro mediante a aplicação do ideário neoliberal, desde os anos 1990, em distintos entes federados, principalmente nos municípios. Objetivo: Analisar o fenômeno do modelo de gestão híbrido público-privado no processo de privatização e exploração da força de trabalho na experiência do município de Fortaleza, Ceará. Método: Trata-se de um estudo de caso, com abordagem qualitativa, na perspectiva histórico-social, realizado no município de Fortaleza, Ceará. Integraram o estudo conselheiros de saúde, gestores e trabalhadores da Estratégia Saúde da Família (ESF), totalizando 37 participantes. Os dados foram apreendidos por meio de entrevistas semiestruturadas e análise documental, sistematizados em uma matriz de análise, sendo analisados por meio da técnica hermenêutica-dialética. Resultados: A gestão público-privada implicou na organização de um modelo desigual, concentrando o poder em favor das OS, o que gerou vários conflitos entre gestores locais e a empresa, como o caso do Instituto de Saúde e Gestão Hospitalar (ISGH), que impedia a circulação de gestores locais, conselheiros e trabalhadores nos espaços da unidade. Apesar da empresa assumir o modelo de gestão compartilhada, primando pelo reposicionamento e reequilíbrio na distribuição de poderes com a gestão local, evidenciaram-se experiências de privatização associadas às dificuldades no acesso, prejudicando a assistência da população aos serviços de saúde. Além disso, ainda se deparam com práticas autoritárias de gestão, mercantilização da atenção à saúde e perda, redução dos vínculos e exploração entre trabalhadores de saúde que cuidam e são cuidados no interior do sistema. Ao mesmo tempo, emergem expressões de insatisfação e frustração com aquilo que os defensores do modelo prometeram e não cumpriram e com os métodos adotados pelo governo para garantir sua implantação. Considerações Finais: Percebe-se que a terceirização de processos de gestão, caracterizando o mix público-privado tem desdobramentos na oferta do cuidado e na gestão da força de trabalho, produzindo precarização das condições e relações de trabalho, tal como pressão e assimetrias entre os profissionais que atuam na saúde, ocasionado a perda na autonomia tanto de gestores locais quanto de trabalhadores de saúde, a qualidade da atenção à saúde e ampliação dos processos de privatização que não cumprem os princípios e diretrizes do SUS, como também não dão concretude a eles, burocratizando e obstaculizando o trabalho e o atendimento em saúde, propagando a desqualificação e o retrocesso das políticas públicas de saúde.