Introdução: A mortalidade materna representa um evento de grande magnitude não somente no Brasil, mas no mundo, e é uma das mais graves violações dos Direitos Humanos das mulheres. Em 92% dos casos poderiam ser evitadas, principalmente nos países emergentes. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a morte materna é definida como o óbito de uma mulher durante a gestação, parto ou puerpério em até 42 dias após o parto, independente da localização ou duração da gravidez, devido a complicações prévias ou desenvolvidas durante a gestação, excetuando acidentes ou incidentes. A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que 185 países com população maior que 100 mil habitantes chegaram a cerca de 287.000 mortes maternas, o que corresponde a uma RMM de 223, se equiparando a quase 800 mortes maternas todos os dias, e aproximadamente uma morte materna a cada dois minutos no mundo. Já no Brasil, estima-se com o fator de correção que ocorreram 1.655 MM em 2019, com razão de mortalidade materna de 58MM/100.000NV no país. O Brasil, assumiu o compromisso junto às Nações Unidas de alcançar os Objetivo de Desenvolvimento Sustentável, onde o ODS 3 - Saúde e Bem-Estar tem como uma de suas aspirações reduzir a taxa de mortalidade materna mundial para menos de 70 por cada 100 mil nascidos vivos e garantir que nenhum país tenha uma taxa de mortalidade materna que supere o dobro da média mundial. O combate à mortalidade materna também implica na atuação sobre os Determinantes Sociais de Saúde (DSS) que tem o objetivo de sensibilizar sobre a importância dos Determinantes Sociais na situação de saúde de indivíduos e populações, a combater as iniquidades em saúde geradas por eles. Os DSS são variáveis relacionadas a fatores sociais, econômicos, culturais, étnicos/raciais, psicológicos e comportamentais que têm influência nas condições de saúde e seus fatores de riscos para a sociedade. As injustiças em saúde são desigualdades em saúde que além de serem sistemáticas, são evitáveis, injustas e desnecessárias, entre indivíduos e população, quesito no qual o Brasil representa um dos traços mais marcantes sobre a situação de saúde do país. O Relatório Anual das Desigualdades Raciais no Brasil, relata que mulheres negras têm maiores chances de morte materna e infantil e menor acesso a serviços de saúde, quando comparada ao restante da população, devido às desvantagens sofridas pela população negra, tudo isso somado a escassa tomada de ações para o seu enfrentamento, o que possibilita a disparidade nas condições de vida da população. As mulheres negras e indígenas têm menos probabilidade de realizar o número recomendado de consultas de pré-natal, receber consultas de pré-natal adequadas, obter alívio da dor no trabalho de parto e de obter o direito ao acompanhante. As mulheres negras e indígenas são menos propensas do que as mulheres brancas a dar à luz por cesariana, e quando o fazem, têm maior probabilidade de sofrer complicações pós-parto. Essas disparidades raciais nos cuidados obstétricos refletem desigualdades mais amplas na saúde reprodutiva para mulheres negras e indígenas. Ainda existem poucos estudos que considerem as questões étinco raciais como um fator importante para o aumento de vulnerabilidade à perda da saúde, especialmente os que abordam a saúde reprodutiva, assim como há poucos estudos que analisem a qualidade do atendimento pré-natal e ao parto considerando a cor das mulheres, principalmente em municípios com altas proporções de população rural, indígena ou quilombola. Neste sentido é necessário compreender o motivo pelo qual determinados grupos estão mais vulneráveis e suscetíveis à mortalidade. Desse modo, é necessário investigar se estas mortes estão relacionadas a um acompanhamento inadequado e ou a uma má-qualidade na assistência à saúde da mulher durante a gravidez e no momento do parto. Estas considerações, tanto sobre os DSS, quanto como especificamente as questões raciais que envolvem as diferenças da morte materna; nos desafia a pensar de um modo complexo como nos exige um objeto fortemente mediado pelo que se refere a vida das mulheres e de seus corpos e que estas já se dão conta do envolvimento do racismo institucional (incluindo no campo da saúde); o campo da epidemiologia segue expressando a objetivação destes eventos que há muito tempo vem sendo sentidos por mulheres em seus corpos em suas vidas e de suas famílias. Sendo a mortalidade materna um problema de saúde pública e uma grave violação dos direitos humanos, e sabendo que racismo e o sexismo são barreiras de acesso que afetam sobretudo mulheres periféricas e negras, levanta-se a seguinte questão: como se apresenta a produção científica, nacional e internacional, sobre a mortalidade materna de mulheres negras e o racismo como barreira que impede o acesso aos cuidados de saúde? Objetivo: Mapear a produção científica, nacional e internacional, acerca da mortalidade materna de mulheres negras de 2018 a 2023; Identificar as barreiras de acesso ao cuidado da saúde das mulheres negras; Avaliar o impacto do racismo na mortalidade das mulheres negras. Método: Trata-se de uma revisão de escopo com recorte temporal entre 2018 a 2023 em bases de dados nacionais (BVS, SciELO e Lilacs) e internacionais (PubMed, Embase, CINAHL e Scopus), em português, inglês e espanhol, tendo como critério de inclusão a disponibilidade gratuita das publicações, com isso, foram selecionados 22 artigos científicos. Resultados: A amostra foi composta por 22 artigos, a maior parte publicados no Brasil e no idioma inglês. Destaca-se que a maior concentração de artigos ocorreu em 2021. De acordo com o delineamento do estudo, dos 22 artigos selecionados, 5 são revisões sistemáticas (22,73%). 3 artigos adotam uma abordagem descritiva e transversal cada, representando 13,64%. Os estudos de coorte retrospectivos de base populacional, epidemiológicos e de abordagem quantitativa compreendem 9,09% da amostra, totalizando 2 artigos cada. Outros delineamentos, como estudo ecológico, estudo prognóstico, estudo qualitativo e revisão integrativa, estão presentes em 4,55% da amostra, representando cada um 1 artigo. Ao analisar os estudos que traçam o perfil da mortalidade materna identifica-se que mulheres negras têm menos probabilidade de realizar o número recomendado de consultas de pré-natal, bem como obter alívio da dor no trabalho de parto e ter acompanhante durante o pré-parto, parto e após nascimento. Considerações finais: racismo representa uma barreira significativa no acesso à assistência para mulheres negras, colocando-as em maior risco de morte por causas maternas, destaca a urgência em abordar questões sistêmicas e estruturais que perpetuam desigualdades na saúde e a necessidade de realizar mais estudos que considerem raça/cor como um fator crucial no cuidado.