Apresentação: a vulnerabilidade social é um fenômeno complexo que afeta milhões de pessoas em todo o mundo, refletindo desigualdades econômicas, políticas e culturais, sendo evidenciada de maneira aguda nas vidas das pessoas em situação de rua, as quais enfrentam uma série de desafios, o que inclui a falta de acesso a alimentos diariamente. Pensando nisso, um projeto de distribuição de marmitas nas ruas foi desenvolvido por um grupo parceiro associado a uma rede de voluntários da graduação de Medicina de uma faculdade local, com o foco principal de fornecer alimentação digna para as pessoas em situação de rua em Vitória-ES. Além disso, o projeto visa amplificar as conexões humanas e os sentimentos de compaixão e solidariedade, contribuindo não só para o bem-estar geral da comunidade local, mas também para a formação médica. Dessa forma, o objetivo deste trabalho é relatar a experiência de uma ação voluntária de entrega de marmitas para pessoas em situação de rua, na capital Vitória, no Espírito Santo, realizada por um grupo de voluntários acadêmicos de medicina e descrever seu impacto no processo de formação do profissional médico. Desenvolvimento do trabalho: esse projeto foi uma iniciativa de um grupo de voluntariado composto por 49 voluntários que visa desenvolver diversas atividades a fim de ajudar a comunidade local, principalmente grupos em situação de vulnerabilidade social. O projeto de voluntariado possui, ainda, como objetivo secundário, aprimorar competências, em que se destaca a empatia, a solidariedade e o trabalho em equipe, que capazes de agregar no desenvolvimento profissional dos alunos e de um olhar mais crítico e mais individualizado na assistência médica. Nesta ação específica, os voluntários foram divididos em sete grupos, os quais escolheram datas em diferentes semanas para cozinhar, cada um, 50 marmitas e distribuí-las pela cidade, totalizando 350 marmitas no semestre. Os garfos plásticos e os recipientes de isopor, para serem montadas as marmitas, foram doados por um projeto parceiro. De maneira complementar, foi realizada, na faculdade, uma campanha de arrecadação de roupas de todas as faixas etárias, que foram, posteriormente, separadas para que cada grupo recebesse uma parte e, assim, pudesse doar junto às marmitas. Cada grupo ficou responsável por uma compra de supermercado e tal gasto das foi dividido entre os componentes dos próprios grupos. Além disso, um voluntário de cada grupo ficou responsável por ofertar um espaço para preparação da comida, que geralmente era sua própria casa, e outros dois voluntários por disponibilizar dois carros para distribuição das marmitas em bairros próximos. Após o preparo das marmitas, que eram decoradas com desenhos e frases motivacionais, os voluntários se reuniam para realizar a entrega das refeições e das vestimentas. Durante o percurso, os alimentos eram oferecidos e entregues a pessoas que os acadêmicos identificavam como em situação de vulnerabilidade, incluindo pessoas em situação de rua e “flanelinhas”. O percurso só findava quando se esgotassem o número de marmitas disponíveis. Os voluntários também tinham a oportunidade, ao conversarem com cada indivíduo que se deparavam, de entender mais sobre as suas angústias e necessidades que inflingiam cada um deles. Cada encontro e cada conversa detinha, em seu interior, anseios e dificuldades que os estudantes, muitas vezes, podiam ajudar, seja com uma mensagem de esperança, seja com orientações práticas ou com educação em saúde. Ao final, os voluntários eram encorajados a expor suas próprias experiências e tecer uma análise de como a ação impactou na sua formação, de modo a compartilhar, com os outros acadêmicos e voluntários, os ganhos para a vida pessoal e profissional. Esses momentos eram importantes para inspirar os demais e também trazer à luz as dificuldades enfrentadas pelo grupo na execução da ação. Resultados: essa ação, para além do fornecimento da comida, trouxe visibilidade a uma população que, em meio a rotina do dia-a-dia, passa como invisível aos olhos que enxergam, mas não veem. Assim, o projeto trouxe à tona e expôs aos olhos a cruel realidade vivenciada por pessoas em situação de sua, a qual é bem diferente daquela vivenciada por alunos de medicina de uma faculdade privada. Para os alunos que compõem o corpo gestor do grupo de voluntários, é nítido a evolução do olhar antes e depois dessa ação. Toda a experiência começou na montagem do grupo de ação, em que foi encorajado a formação de grupos de alunos sem afinidade pessoal, para trabalhar a noção de trabalho em equipe. Isso foi muito proveitoso, já que permitiu a criação de conexões antes inexistentes. Essa experiência proporcionou, ainda, o desenvolvimento de habilidades, como divisão de tarefas, delegação de atividades, comunicação interpessoal e empatia. Durante o processo, além da distribuição dos itens, houve a chance dos voluntários interagirem com os beneficiários. Essas interações proporcionaram uma oportunidade única para os voluntários entenderem mais profundamente a realidade vivenciada por essa população. Ao se depararem com muitos indivíduos emocionalmente vulneráveis, os voluntários estabeleceram conversas sinceras, profundas e, ao mesmo tempo, acolhedoras, transmitindo palavras de conforto e motivação. Assim, essa ação enriqueceu não apenas a vida daqueles que foram ajudados, mas também teve um efeito transformador na percepção dos voluntários, permitindo que eles pudessem exercitar competências que não são valorizadas no cotidiano acadêmico e reforçando a importância de ações de cunho social. Ademais, esse projeto pôde agregar na visão holística e individualizada de cada voluntário que passou pela experiência, contribuindo para que os futuros médicos, que estarão trabalhando, em sua maioria, após a sua formação, em unidades básicas de saúde ou unidades de pronto-atendimento, e que irão se deparar por vezes com situações que requerem um olhar empático e acolhedor, possam ter um olhar profissional que não busque somente curar com fármacos, mas também curar por meio de um diálogo humanizado. Considerações finais: a ação voluntária realizada pelos estudantes teve como foco não só ajudar parte da população vulnerável de Vitória, mas também exercitar, nos estudantes de medicina, a habilidades de trabalho em grupo, além de competências essenciais para a profissão, como empatia, solidariedade, caridade e generosidade. Todas essas qualificações são importantes para que o médico possa exercer sua profissão de maneira ética e humanizar a relação médico-paciente. Conclui-se, portanto, que essa ação foi de suma importância tanto para os alunos quanto para a comunidade, tendo impactos positivos na formação do médico. É gratificante como o ato voluntário de fornecer comida e roupas para quem mais precisa pode ter um impacto tão significativo, não apenas suprindo necessidades básicas, mas também criando conexões humanas profundas e fortalecendo laços coletivos.