TRAGÉDIA AMBIENTAL CLIMÁTICA NO RIO GRANDE DO SUL: RELATO SOBRE ACOLHIMENTO ONLINE AOS ESTUDANTES DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS

  • Author
  • Ester Sias
  • Co-authors
  • Milena Oliveira Costa , Marcia Leão de Lima , Mônica da Silva Wrague , Isadora Oliveira Neutzling , Josiane da Costa Moreira , Larissa Dall’ Agnol da Silva , Taís Rodrigues dos Santos , Gleberson de Santana dos Santos , Valéria Cristina Christello Coimbra , Luciane Prado Kantorski
  • Abstract
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    Apresentação:

    No período entre abril e maio de 2024, o estado do Rio Grande do Sul enfrentou a maior tragédia climática de sua história. Desde 1941, não havia ocorrido um evento de tamanha proporção. Esse desastre resultou em mais de uma centena de mortos e afetou mais de 2 milhões de pessoas, superando em gravidade e extensão o evento ocorrido em 1941. As enchentes desse período configuraram uma catástrofe sem precedentes em todo o estado, atingindo 85% da população.

    Diante deste desastre ambiental, muitas pessoas foram afetadas direta e indiretamente, sofrendo perdas incomensuráveis de vidas, moradias, meios de subsistência e infraestrutura, o que deixou um enorme trauma na população. As pessoas que não foram diretamente afetadas sentiram o impacto da crise ambiental em suas vidas, assolados pelo sentimento de tristeza pelas perdas e pelo sofrimento alheios. Todos vivenciam a tragédia que é coletiva e gera um misto de sentimentos.

    A solidariedade ganhou destaque nacional e internacional diante desse cenário, com a população se unindo para apoiar de diversas maneiras: algumas pessoas atuaram diretamente nos territórios e no campo prático, realizando resgates e prestando assistência, outras atuaram como voluntários nos abrigos onde as vítimas da enchente foram alojadas. Além disso, muitos contribuíram promovendo arrecadações de alimentos, produtos de higiene pessoal, roupas e com arrecadação financeira confiável, através de parcerias entre instituições, entidades e movimentos sociais. No entanto, a situação de caos e a exaustão física e mental tornaram-se evidentes, tanto pela sobrecarga do trabalho das equipes constituídas, quanto pela propagação constante de notícias nos meios de comunicação e redes sociais, além das notícias falsas que gradativamente romperam a rotina e a vida cotidiana de todos nós.

    Alguns estudantes tiveram suas vidas devastadas e suas rotinas drasticamente abaladas; alguns perderam suas casas, enquanto outros tiveram que deixar suas residências devido ao risco iminente de alagamento. A saúde mental daqueles que já passavam por algum sofrimento psíquico foi agravada, e alguns daqueles que não apresentavam condições pré-existentes começaram a manifestar sintomas depressivos, além de medo, desespero, angústia, tristeza, ansiedade, entre outros.

    Diante deste cenário, o acesso à internet mostrou-se um grande aliado para prestar apoio e suporte mútuo às pessoas, independentemente de sua localização ou espaço geográfico. Assim, este trabalho tem como objetivo relatar a experiência de participação em um grupo de acolhimento online para estudantes da Universidade Federal de Pelotas, criado em resposta à tragédia climática que afetou o Rio Grande do Sul.

    Desenvolvimento/Resultados:

    Trata-se de um relato de experiência que descreve a participação no grupo de acolhimento online para estudantes da Universidade Federal de Pelotas. O grupo está vinculado ao Grupo de Pesquisa em Enfermagem, Saúde Mental e Saúde Coletiva e ao Projeto de Extensão Canal Conta Comigo – O Cuidado que nos aproxima, ambos da Faculdade de Enfermagem da UFPel.

    O grupo "Acolhimento e Promoção de Saúde Mental dos Estudantes da UFPEL" teve início em maio de 2024, tornando-se um aliado em resposta à tragédia climática já anunciada por pesquisadores há décadas. Os encontros ocorrem semanalmente, às quintas-feiras, às 20 horas, através da plataforma Google Meet, com duração de uma hora e participação média de 35 estudantes.

    A equipe é composta por professoras dos cursos de Enfermagem e Terapia Ocupacional, além de mestrandas e doutorandas do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFPel, com formação nas áreas de Enfermagem, Psicologia e Terapia Ocupacional. O grupo de apoio remoto busca proporcionar um espaço de silêncio, escuta, acolhimento e fala para os estudantes, oferecendo uma escuta sensível que respeita as dores, singularidades e diferentes formas de sentir e expressar o sofrimento.

    O grupo teve adesão de estudantes de diversos cursos e regiões do estado, que trouxeram suas contribuições e experiências de forma autêntica, considerando os fatos vividos. Os relatos incluem histórias de dor frente ao sofrimento psíquico e pessoal daqueles que perderam vidas, memórias, além de conquistas pessoais e familiares construídas ao longo de uma vida inteira e de geração em geração. São histórias singulares, familiares e de comunidades inteiras.

    Sentimentos iniciais de impotência, medo, ansiedade, insegurança, culpa, dor, raiva, frustração, desapego, desamparo, tristeza e luto foram, ao longo do tempo, substituídos por solidariedade, esperança, auxílio, apoio, amor, vida, humanidade, reconstrução e elaboração do luto. "Há vida e, se há pulso, seguimos em frente", disse um dos participantes.

    Refletir sobre emergências humanitárias e grandes desastres climáticos é fundamental para a construção de estratégias de enfrentamento e para lidar com os inúmeros desafios na mediação de um grupo de apoio em circunstâncias como essa.

    Ao longo dos encontros semanais, somaram-se esforços em prol da ajuda e do suporte mútuo como abordagem em saúde mental. Os participantes relatam a sensação de alívio, conforto e acolhimento proporcionada pela equipe do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem e pelos demais participantes.

    Considerações finais:

    A criação do grupo "Acolhimento e Promoção de Saúde Mental dos Estudantes da UFPEL" destaca-se como uma resposta eficaz e sensível diante da tragédia climática que atingiu o Rio Grande do Sul. Através de encontros semanais, o grupo não apenas proporcionou um espaço seguro para a expressão e acolhimento dos estudantes, mas também facilitou a construção de uma rede de apoio mútua e solidária. A iniciativa, liderada por uma equipe multidisciplinar, conseguiu transformar sentimentos de dor e sofrimento em oportunidades de reconstrução emocional e fortalecimento coletivo, proporcionando conforto e esperança aos participantes, servindo como um modelo valioso de intervenção em situações de crise.

    Diante desta grande tragédia, devemos pensar e repensar nossas teorias e práticas na formação acadêmica e construir, junto aos projetos políticos pedagógicos, disciplinas no campo da saúde mental coletiva, com metodologias que dialoguem com os temas ambientais e climáticos. Essas disciplinas devem refletir sobre as abordagens necessárias em situações de grandes tragédias humanitárias, com a finalidade de qualificar futuros trabalhadores no campo da saúde. Por fim, a consolidação dessas práticas pode contribuir para emergências, como as vivenciadas no Rio Grande do Sul, e auxiliar milhares de pessoas que passaram pela enchente e tiveram suas vidas devastadas, assim como cidades inteiras que praticamente desapareceram em meio a essa tragédia ambiental jamais vista na história do Brasil.

  • Keywords
  • Tragédia climática; Emergência humanitária; Saúde mental; Enchentes; Rio Grande do Sul.
  • Subject Area
  • EIXO 1 – Educação
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