Um “sorriso perfeito” como reflexo da estética generalista, eurocêntrica e racista perpetuada pela odontologia: uma revisão integrativa.

  • Author
  • Myrian Giovanna Viana Lourenço
  • Co-authors
  • Cristiane Ribeiro da Silva Castro , Jamerson da Silva Santos
  • Abstract
  • A odontologia, historicamente, apresenta-se pouco sensível às demandas sociais e os tratamentos motivados por questões estéticas têm protagonismo. Atualmente, são muito valorizadas as técnicas minimamente invasivas e de baixo risco, mas isso não é levado em consideração quando há modificação do periodonto de proteção para eliminar a pigmentação melânica racial. Esse tipo de procedimento mutilador objetiva uma gengiva monocromática, rósea, sem melanina e melanócitos e, portanto, branca, eurocentrada, com o argumento de que, assim, o sorriso ficaria mais harmônico e saudável. Mas, o que acontece é um malicioso processo de embranquecimento estético, o qual obedece lógicas coloniais e racistas que demonizam a estética negra. Dessa forma, este estudo tem como objetivo evidenciar práticas mutiladoras voltadas para o embranquecimento do sorriso negro. Para isso, realizou-se uma revisão de literatura integrativa, elaborada a partir de estudos publicados nos últimos dez anos nas bases de dados Scielo, Google Acadêmico, LILACS e Medline - Pubmed. Foram encontrados 118 (cento e dezoito) estudos utilizando os seguintes descritores: odontologia, etnocentrismo, estética e pigmentação. Depois, foram incluídos nesta revisão 11 (onze) artigos, a partir da aplicação dos seguintes critérios de inclusão: estudos nos idiomas português, inglês e espanhol, publicados nos últimos dez anos de forma integral e com acesso gratuito, que analisem as técnicas de clareamento gengival na odontologia, bem como o viés racista dessa prática. Foram excluídos os estudos realizados fora do período de tempo supracitado, bem como em outros idiomas, indisponíveis de forma integral nas bases de dados analisadas e cujas análises não contemplam esta pesquisa. A partir das informações obtidas, viu-se que a prática de clareamento gengival, também chamada de melanoplastia ou peeling gengival, é comumente realizada por dentistas, principalmente no serviço privado. Nesse cenário, a pigmentação fisiológica e não patológica da gengiva é encarada como lesão, ou seja, algo a ser tratado e, também, como um obstáculo para um sorriso perfeito e harmônico. Deste modo, para realizar esse possível tratamento, são utilizadas técnicas variadas, a exemplo de gengivectomia, gengivoplastia, dermoabrasão dos tecidos por instrumentos manuais, crioterapia, uso de laser para despigmentação através de fototermólise seletiva e despigmentação com fresa cerâmica. Nos estudos observados, todos os métodos apresentam-se como indicados e eficientes para esse procedimento e os tratamentos são realizados com sucesso, pois promovem despigmentação melânica e bons resultados estéticos. Observa-se, com isso, um estado contínuo de normalização do racismo, com a adoção de métodos eugenistas que buscam excluir as características fenotípicas periodontais do povo negro a partir de uma estética universalista submetida a uma epistemologia eurocêntrica, a qual busca patologizar ou inferiorizar a pigmentação melânica, ante a hegemonia dos padrões de branquitude. Ante o exposto, vê-se a urgência de discutir saúde e estética sob perspectivas étnicas, de modo a reconfigurar o entendimento de beleza e do que é saudável no âmbito da odontologia, do ensino à prática clínica, para cessar a prática discriminatória e criminosa de mutilação dos sorrisos negros.

  • Keywords
  • Odontologia, Etnocentrismo, Estética, Pigmentação.
  • Subject Area
  • EIXO 6 – Direito à Saúde e Relações Étnico-Raciais, de Classe, Gênero e Sexualidade
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