Contribuições de um Método de Problematização Clínica para o desenvolvimento de competências em estudantes de Medicina
Apresentação:
O processo de ensino nas escolas de medicina se encontra em amplo processo de atualização para atender às demandas da população, esse desafio se soma ao contexto criado pós-pandemia de COVID-19, no qual diversas faculdades sofrem com turmas acumuladas e redução da disponibilidade de cenários práticos reais para a formação dos alunos. Dessa maneira, busca-se métodos de ensino ativos que possam ser introduzidos para esses estudantes para complementar a formação profissional. Com isso, o método de Problematização por Fases (PPF) foi desenvolvido na Universidade Federal de Viçosa (UFV) e aplicado em alunos do segundo ano de faculdade. Esse trabalho se trata da avaliação desse método de ensino, de maneira quantitativa e qualitativa, com base em um questionário autoaplicável. Dessa forma, permitindo avaliar a eficácia desse modelo e buscar melhorias.
Desenvolvimento do Trabalho:
Apresentação do método:
Os estudantes foram divididos em pequenos grupos (entre três e cinco integrantes) – mantidos ao longo do semestre – e em funções (coordenação e relatoria), as quais rodiziavam entre os participantes a cada dia de atividade. Cabe ao estudante responsável pela coordenação da atividade organizar a discussão, estimular a participação dos colegas e gerenciar o tempo de atividade. Por sua vez, o relator é responsável por registrar a atividade e ser “porta-voz” do grupo, apresentando para o professor e para o grande grupo o trabalho produzido por sua equipe.
Após divididas as funções, cada grupo recebe uma fase inicial de um caso clínico no qual são estimulados a responderem perguntas direcionadas. Ao finalizar uma fase, o grupo solicita a presença do professor que verifica se os objetivos de aprendizagem foram atingidos; em caso de não terem sido, o professor irá orientar o grupo, o qual voltará a discutir sobre aquela mesma fase; no caso de os objetivos terem sido atingidos, esse grupo passará para uma nova fase e assim, sucessivamente, até a fase final. Cada atividade tem três ou quatro fases, sendo destinados 30 minutos para discussão de cada uma delas. Ao final, os pequenos grupos se reúnem em um único grupo no qual essas fases são novamente discutidas e contribuições são acrescentadas, tanto pelos estudantes, por intermédio dos relatores, quanto pelo professor.
Ressalta-se que, embora existam objetivos de aprendizagem a serem atingidos, as perguntas direcionadas não apresentam uma única resposta, o que torna de grande importância o momento final com o grande grupo.
A atividade é avaliada individualmente e durante todo o processo, sendo critérios de avaliação: o rodízio e desempenho das funções, a gestão do tempo, a atenção às comandas e orientações, a contribuição para discussão, o trabalho em equipe e a qualidade das fontes pesquisadas.
Metodologia:
O estudo contou com a participação de 77 alunos matriculados na disciplina de Prática Profissional e Saúde IV, no quarto período do curso de Medicina, que participaram da aplicação do método durante dois semestres letivos. Todos os alunos foram convidados a participar e aqueles que aceitaram, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
O instrumento de avaliação era composto por 8 perguntas quantitativas sobre a contribuição do método para desenvolver habilidades como entrevista médica, raciocínio clínico, registro médico, trabalho em equipe, liderança, falar em público, e na formação em geral utilizando a escala de Likert (Discordo totalmente - Discordo - Não discordo nem concordo - Concordo - Concordo totalmente) e 1 pergunta aberta (Como você resumiria sua experiência com a PPF?).
As perguntas quantitativas foram tabuladas no programa Excel e calculado as frequências absolutas. As respostas da pergunta aberta foram analisadas utilizando o software IRAMuteq de análise qualitativa, através de análise lexical, com a criação de um árvore de similitude.
O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética da UFV.
Resultados:
Resultados Quantitativos:
Dos 77 alunos participantes, 49,35% concordaram totalmente que a PPF contribui para o desenvolvimento das habilidades de entrevista clínica, e 75,32% concordaram integralmente com o fortalecimento do raciocínio clínico proporcionado pela PPF.
Sobre a contribuição para habilidades de registro clínico, 29,87% concordaram totalmente. A maioria (64,94%) concordou plenamente com a contribuição para habilidades de trabalho em equipe.
Em relação à liderança, 35,06% concordaram totalmente que houve o estímulo pela PPF. Quanto ao estímulo para habilidades de registro e falar em público, 45,45% concordaram totalmente com a afirmação. A maioria dos participantes (66,23%) concordou plenamente que a PPF contribuiu para sua formação.
Ao analisarem o método de ensino em uma escala de 0 a 10, a média das notas recebidas foi 9,83. A nota mais alta, 10, foi atribuída por 25,97% dos participantes, enquanto a nota mais baixa, 6, foi atribuída por 1,3%.
Resultados Qualitativos:
Foram evocadas 169 palavras diferentes nas 77 entrevistas. Com a exclusão de palavras com menos de 10 citações, pôde-se observar, na análise da árvore de similitude, que a cognição que mais estabeleceu conexões foi prático, seguida por clínico, raciocínio e experiência. Essas palavras chaves foram divididas em três nuvens de significado. Com outras duas nuvens periféricas, somando o total de cinco.
Observa-se na análise com tema central prático uma gama de palavras associadas: aprender, positivo, muito, conhecimento, bom, cenário, importante, habilidade, desenvolver. Esses léxicos trazem um aspecto positivo à nuvem. Destaca-se também a prevalência de 18 relações entre prático e não, que nessa estrutura se relaciona com os léxicos substituir e UBS (Unidade Básica de Saúde) os quais têm valor negativo pelo contexto utilizado. Entretanto, as relações com as palavras positivas tiveram um número absoluto superior ao número somado das palavras negativas (61x39).
Sobre a nuvem das palavras raciocínio e clínico, destacam-se os seguintes elementos: estimular, médico, contribuir, acreditar, registro, diagnóstico. Todos esses léxicos têm atitude positiva. Além disso, a maior conexão de palavras foi vista entre raciocínio e clínico, com 37 associações, além da centralidade na estrutura da árvore. Da mesma maneira, a nuvem com foco na palavra experiência, também apresentou todos os léxicos de maneira positiva.
Ademais, em uma análise da construção das cinco nuvens do modelo, observa-se que em todos os grupos, exceto o que traz o nome do método, o padrão das palavras chaves cercadas por palavras de caráter positivo.
Considerações Finais:
No contexto pós-pandemia, em que o desafio de inovações no ensino se fez necessário, o método PPF emergiu como uma estratégia eficaz, como indicado pela experiência pessoal dos alunos. No presente estudo, destaca-se a forte concordância quanto à contribuição do método para o desenvolvimento das habilidades de raciocínio clínico e trabalho em equipe tanto na análise quantitativa quanto qualitativa, sendo competências de suma importância para a profissão futura e, frequentemente, desafiadoras de serem ensinadas. Estes achados corroboram com evidências encontradas na literatura contemporânea. A alta satisfação dos alunos com o método, evidenciada pela média de avaliação de 9,83, e sua percepção positiva sobre a contribuição para sua formação, destacam a relevância da PPF para o enriquecimento da formação acadêmica e ressaltam sua importância para futuras implementações pedagógicas.
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