Apresentação: O cuidado em saúde mental no Brasil enfrenta desafios significativos, particularmente no que tange à integração entre a Unidade Básica de Saúde (UBS) e a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS). O fortalecimento dessa integração é essencial para assegurar que os serviços oferecidos sejam holísticos, coordenados e acessíveis a todos os usuários. As UBS atuam como a porta de entrada para o sistema de saúde, proporcionando cuidados primários e promovendo a saúde comunitária. No entanto, os desafios em saúde mental exigem uma abordagem mais especializada, muitas vezes disponível nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). A articulação entre esses níveis de cuidado torna-se determinante para a continuidade e a integralidade do atendimento, prevenindo a fragmentação do cuidado e garantindo que os pacientes recebam o suporte necessário em todas as fases do tratamento. A RAPS foi concebida para oferecer uma rede diversificada e abrangente de serviços que atendam às necessidades de saúde mental da população. Ela inclui não apenas os CAPS, mas também hospitais gerais com leitos psiquiátricos, unidades de acolhimento e outros dispositivos comunitários. A integração eficaz entre a UBS e a RAPS pode facilitar o acesso a cuidados especializados, reduzir a sobrecarga dos serviços de saúde mental e promover uma abordagem mais preventiva e menos centrada na medicalização. Assim, o presente estudo tem como objetivo compreender o cuidado em saúde mental na atenção básica articulado à rede de atenção psicossocial. Desenvolvimento do trabalho: Em agosto de 2023, foi realizada uma revisão integrativa das produções científicas dos últimos cinco anos disponíveis nos bancos de dados Portal de Periódicos Capes e Biblioteca Virtual em Saúde. Os descritores utilizados foram "Primary Health Care", "Mental Health Services", "Mental Health" e a palavra-chave "Psychosocial Care Network", combinados com o operador booleano AND. Foram encontrados 567 artigos, dos quais 25 foram selecionados para discussão. As publicações ocorreram no período de 2018 a 2023, com maior concentração no ano de 2020. A coleta de dados das pesquisas ocorreu na Região Sul, Nordeste e Sudeste majoritariamente. Em relação ao idioma, foram disponibilizados majoritariamente em português e inglês e português. Resultados: A RAPS integra diversos serviços de saúde mental, promovendo estudos de caso conjuntos, reuniões intersetoriais sistemáticas, atendimentos compartilhados e ações de matriciamento. O cuidado em saúde mental exige diretrizes terapêuticas contínuas e coordenadas, em constante articulação com os demais serviços da rede. O acolhimento de qualidade enfrenta desafios devido à fragilidade na referência e contrarreferência entre a UBS e os serviços especializados, o que resulta na perda do vínculo dos usuários com a UBS. A burocratização dos protocolos em saúde mental e a alta demanda por consultas enfraquecem o atendimento ao público, sobrecarregando os serviços especializados e atrasando diagnósticos e tratamentos. Para romper com o modelo de encaminhamento e evitar o aprisionamento dos usuários no fluxo de serviços, são necessários esforços coordenados da rede. Esse desafio é evidente entre a UBS e o CAPS, que devem se integrar e trabalhar no território, acolhendo adequadamente as demandas em saúde mental. A articulação da RAPS requer decisões compartilhadas, promovidas por meio de encontros, troca de conhecimentos e construção de possibilidades para um cuidado singular e integral. O matriciamento é uma potencialidade da Atenção Primária à Saúde, permitindo a interlocução entre serviços especializados e as equipes da Estratégia de Saúde da Família (ESF). No entanto, sua implementação enfrenta fragilidades, representando uma barreira nas novas práticas de saúde mental. A falta da incorporação de dispositivos de apoio resulta no processo de trabalho irregular dentro do serviço, o qual as informações são compartilhadas de maneira informal e as ações, incluindo visitas domiciliares, tornam-se pontuais em serviços de base territorial. Profissionais de saúde da atenção básica consideram prejudicial a falta de articulação com os serviços especializados, pois a integração qualifica o atendimento no território, proporcionando um cuidado mais próximo da família, da cultura e da sociedade. O cuidado em saúde mental torna-se limitante neste nível de atenção, pois as ações ainda são voltadas para a medicalização, criando barreiras para a qualidade e integralidade do cuidado, bem como para ações de promoção e prevenção. O serviço oferece cuidados individuais, predominantemente consultas médicas e cuidados clínicos, além de orientações e ações no território. A visita domiciliar é uma ferramenta importante para a ESF, permitindo que a equipe realize ações de cuidado psicossocial, visando a construção coletiva da autonomia, subjetividade e novas abordagens de cuidado em saúde mental. O cuidado em rede é realizado através do compartilhamento de casos, mas a burocratização impõe estratégias de comunicação informal, como contato telefônico, troca de mensagens informais e debates pontuais. O cuidado de base territorial mostra-se uma potencialidade na atenção básica, mas ainda prevalece o modelo individualizado e biomédico. Estudos de 2018 a 2020 demonstram a importância da articulação entre clínica, cultura e contexto social. No entanto, o serviço enfrenta dificuldades, destacando-se a necessidade de investimento em promoção, prevenção e tratamento em saúde mental para qualificar dispositivos de cuidado, acolhimento, avaliação, sensibilização e educação permanente dos profissionais de saúde. Há dificuldades na realização de apoio matricial, corresponsabilização e falta de profissionais. É necessário investir em recursos humanos especializados, infraestrutura e qualificação dos profissionais para romper as barreiras da burocratização, medo e estigma, fortalecendo os cuidados em saúde mental na atenção básica. Encaminhamentos errôneos para serviços especializados resultam em sobrecarga e alta demanda, impedindo o suporte de matriciamento à atenção básica e ações no território. A diversidade de modelos de gestão dificulta a padronização de encaminhamentos e o sistema de referência e contrarreferência, causando desarticulação dos serviços e sobrecarga de um em detrimento de outro. A fragmentação do trabalho entre médicos, enfermeiros e farmacêuticos compromete a comunicação e a multidisciplinaridade, fragilizando a integralidade do cuidado. O modelo médico centrado ao cuidado em saúde mental limita a ação da equipe da atenção básica, que precisa ser empoderada para atendimento, discussão e ações no serviço. A atenção aos transtornos mentais é fragilizada pela falta de conhecimento clínico, dispositivos de apoio e invisibilidade dessa população nas demandas em saúde do território. Profissionais da ESF realizam prescrições continuadas sem vigilância dos efeitos e riscos, pois não se sentem capacitados para propor novas estratégias de cuidado. O reconhecimento das demandas permite qualificar o acolhimento, visando excluir o modelo hospitalocêntrico e ampliar o acesso aos usuários no território. É necessário extinguir fragilidades, como a ausência de grupos terapêuticos na UBS, ampliando o cuidado além da renovação de receitas e prescrição de medicamentos, e assegurando vínculo, diagnóstico adequado e evolução do tratamento. Profissionais da atenção básica relatam dificuldades de articulação com a RAPS, especialmente no manejo inadequado, falta de comunicação, falta de leitos em hospitais gerais e sobrecarga dos CAPS. Considerações finais: Faz-se essencial quebrar paradigmas no cuidado em saúde mental para romper práticas cristalizadas e superar o modelo biomédico, promovendo uma articulação eficaz com a rede e melhorando a qualidade de vida dos usuários. A análise revelou que a RAPS possui um grande potencial para o cuidado, especialmente quando articulada com os demais serviços da rede. No entanto, as ações de saúde mental na atenção básica ainda são predominantemente biomédicas e individuais, com poucas iniciativas de cuidado territorial. Os desafios incluem a qualificação profissional, a infraestrutura, a superação do estigma, e falhas na comunicação e na estrutura do fluxo assistencial, que comprometem o cuidado integral e articulado.